Nova-iorquinos manifestam-se em solidariedade a Gaza
Cerca de cinco mil nova-iorquinos reuniram-se em marcha, que caminhou da Times Square até as proximidades da sede da ONU
Estados Unidos da Fundação Lauro Campos e Marielle Franco
Na sexta-feira (26), o discurso abjeto de Benjamin Netanyahu na Assembleia Geral da ONU não ficou sem resposta. No plenário, dezenas de delegações retiraram-se de seus assentos, obrigando o primeiro-ministro israelense a falar para um auditório esvaziado. Do lado de fora, cerca de cinco mil nova-iorquinos reuniram-se em marcha, que caminhou da Times Square até as proximidades da sede da ONU.
O protesto foi organizado por um conjunto de entidades e coletivos, entre eles o Palestinian Youth Movement. O mote principal era a exigência de prisão para Netanyahu, em obediência ao mandado do Tribunal Penal Internacional, emitido em novembro de 2024. O genocídio em Gaza atualmente é reconhecido até mesmo por relatório do Conselho de Direitos Humanos da ONU, além de dezenas de Estados e por multidões mobilizadas no mundo.
O perfil da manifestação em Nova York foi diverso. Havia diferentes blocos organizados, abrangendo regiões da cidade e área metropolitana, sindicatos, profissões, nacionalidades e religiões. Os cartazes exigiam, além da prisão de Netanyahu, o cessar-fogo imediato em Gaza, o fim do genocídio, o embargo comercial e de armas para Israel, e o desinvestimento de universidades e outras instituições no regime sionista. Alguns dos blocos mais simbólicos eram os dos trabalhadores da imprensa, que homenagearam colegas assassinados pelo Estado de Israel, o bloco dos judeus antissionistas e o bloco estudantil.
A manifestação deve ser colocada em contexto. Se comparado com os movimentos que têm acontecido, por exemplo, na Europa, o contingente reunido nas ruas de Nova York foi pequeno. A Itália recém deu ao mundo o exemplo inspirador de uma greve geral em apoio a Gaza. Na Alemanha, 150 mil pessoas marcharam no último sábado. A Espanha e o Reino Unido têm reunido multidões.
Entretanto, nos Estados Unidos, há uma situação específica. Após o ascenso das ocupações universitárias no primeiro semestre de 2024, o movimento pró-Palestina sofreu um refluxo. Esse recuo aconteceu, em um primeiro nível, pelo desânimo do ativismo diante do fato de não ter alcançado vitórias concretas. Mas, principalmente, ocorreu por causa da repressão, iniciada durante o governo Biden e galgada ao paroxismo com Trump.
Nesse quadro, a presença de uma vanguarda corajosa nas ruas, na última sexta-feira, é digna de nota. Principalmente ao considerar que, embora haja um refluxo nas mobilizações, o apoio à causa palestina cresce permanentemente. Esse, aliás, é o legado da mobilização estudantil de 2024: a inversão completa na correlação de forças na opinião pública estadunidense quanto à situação em Gaza. Isso é verdadeiro inclusive para a cidade de Nova York, onde está a maior comunidade judaica do mundo fora de Israel (quase 1 milhão de judeus) e onde, ao mesmo tempo, um muçulmano socialista e pró-Palestina, Zohran Mamdani, deve ser eleito prefeito.
A repressão crescente do governo Trump busca sufocar a expressão da maioria social pró-Palestina nos Estados Unidos. Mas os exemplos internacionais e a coragem de uma vanguarda combativa local, liderada inclusive por imigrantes muçulmanos, mantêm acesa a chama da revolta. Ainda existem aqueles que vão às ruas e dão o exemplo. E mesmo para os que ficam em casa, as imagens da Global Sumud Flotilla e dos protestos mundiais não deixam de ressonar, gerando um estado de latência.
Chegando à sede da ONU, a manifestação em Nova York encontrou-se com o músico Roger Waters e com o presidente da Colômbia, Gustavo Petro. Petro, dias antes, havia feito no plenário um dos discursos mais contundentes em solidariedade à Gaza. Em decorrência da postura militante, teve seu visto estadunidense cassado. Ele e Mamdani reuniram-se na ONU, enquanto o atual prefeito da cidade, Eric Adams, vexatoriamente encontrou-se com Netanyahu.
O momento em Gaza nunca foi tão grave e o povo palestino nunca esteve tão fragilizado. Ao mesmo tempo, como recentemente destacou o jornalista brasileiro Mario Sergio Conti, nunca a repulsa a Israel foi tão profunda. “A Palestina está destroçada, mas vive”, ele afirmou. Vive inclusive nos corações e mentes do povo estadunidense, que condena o papel imperialista do seu próprio país no maior crime em curso contra a humanidade.