NY escolhe a mudança: Zohran Mamdani assume prefeitura prometendo aliança contra o elitismo
Democrata-socialista de 34 anos, muçulmano e voz contundente contra o apartheid israelense, Mamdani derrota máquinas políticas e promete “uma cidade que a gente pode pagar”
Foto: Reprodução
Nova York vira a página: Zohran Mamdani vence e inaugura era de governo popular e antielitista
Democrata-socialista de 34 anos, muçulmano e voz contundente contra o apartheid israelense, Mamdani derrota máquinas políticas e promete “uma cidade que a gente pode pagar”
A eleição de Zohran Mamdani para a prefeitura de Nova York marca um dos acontecimentos políticos mais surpreendentes e simbólicos dos últimos anos nos Estados Unidos. Aos 34 anos, o democrata-socialista – primeiro muçulmano e primeiro prefeito sul-asiático da cidade, além do mais jovem em mais de um século – derrotou o ex-governador Andrew Cuomo e o republicano Curtis Sliwa, conquistando mais de 50% dos votos e reivindicando para si um mandato de ruptura.
Num pleito que parecia improvável meses atrás, quando ainda surgia como azarão nas primeiras pesquisas, Mamdani virou o jogo apoiado por uma campanha construída “de baixo para cima”, baseada em pequenas doações, mobilização voluntária e presença intensa nas redes. Seus vídeos em estilo TikTok, sua forma leve de interagir com eleitores e até sua história como rapper – sob o nome artístico Mr. Cardamom – ajudaram a projetar uma imagem fresca, confiante e sagaz. Como resumiu o cientista político Michael Cornfield: “Um verdadeiro superstar”.
Em seu discurso de vitória, Mamdani não suavizou o tom:
“Nova York, esta noite você entregou um mandato para a mudança, um mandato por um novo tipo de política, um mandato por uma cidade que a gente pode pagar e um mandato para um governo que entrega exatamente isso.”
E foi além, afirmando que sua vitória representa um abalo às estruturas tradicionais de poder:
“Nós derrubamos uma dinastia política.”
A provocação também alcançou Donald Trump, que vinha atacando o candidato:
“Então, Donald Trump – já que eu sei que você está assistindo – eu tenho quatro palavras para você: aumente o volume.”
Uma vitória que desafia a lógica política de Nova York
A cidade mais judaica dos EUA – com quase 1 milhão de judeus – escolheu como prefeito um político abertamente crítico do governo israelense, alguém que já chamou as ações em Gaza de “genocídio” e o sistema imposto aos palestinos de “apartheid”. A metrópole mais rica do mundo, repleta de milionários por quilômetro quadrado, optou por um socialista que defende moradia acessível, congelamento de aluguéis, transporte gratuito e até supermercados públicos.
Seu triunfo coincide com a crise de representatividade do Partido Democrata diante do avanço da extrema direita estadunidense. Como destacou o The Guardian:
“A vitória de Mamdani é uma repreensão às estratégias fracassadas do Partido Democrata.”
Para a esquerda norte-americana, Mamdani é também um líder geracional – como observa Thomas Whalen, da Universidade de Boston – com forte apelo entre jovens que rejeitaram a moderação do partido em eleições recentes. Seus discursos, suas causas e até seu estilo de vida se conectam com essa geração: ele conheceu a esposa em aplicativo de encontros, admitiu o uso de maconha legal e participou de uma greve de fome, em Washington, em 2023, para pressionar Joe Biden por um cessar-fogo em Gaza.
A eleição provocou impacto imediato, dentro e fora dos EUA. Comunidades muçulmanas e sul-asiáticas celebraram o simbolismo histórico; progressistas viram um marco para o municipalismo de esquerda; conservadores e parte do empresariado reagiram com preocupação às propostas econômicas do novo prefeito.
Em sua fala, Mamdani buscou equilibrar ousadia e esperança:
“O futuro está em nossas mãos.”
Ele agora assume a gestão de um orçamento de US$ 112 bilhões e uma máquina com 300 mil servidores – desafio monumental mesmo para políticos experientes. Entre as prioridades, promete cumprir o que o levou à vitória: enfrentar o elitismo urbano, devolver dignidade à população trabalhadora e provar que uma grande cidade pode ser governada para a maioria, e não para os interesses financeiros que há décadas moldam Nova York.
O que vem pela frente
A expectativa é alta – especialmente entre jovens, imigrantes, trabalhadores precarizados e movimentos progressistas. Transformar promessas como congelamento de aluguéis, transporte gratuito e políticas de redistribuição em programas executáveis será a prova de fogo. O embate com setores conservadores e bilionários da cidade será inevitável.
Ainda assim, a chegada de Mamdani à prefeitura marca uma guinada histórica: é um recado claro de que Nova York está disposta a romper com velhas estruturas e experimentar um governo ancorado em participação popular, justiça social e enfrentamento ao poder econômico.
A vitória é apenas o início – e talvez justamente por isso seja tão poderosa.