Por um cuidado em liberdade
A luta contra a internação compulsória continua necessária mesmo entre setores de esquerda
Na recente histórica da democracia brasileira, a luta antimanicomial emerge como uma bandeira fundamental, que agrega diversas lutas por liberdade e vida. É impossível falar da luta antimanicomial sem um recorte racial e, neste sentido, é preciso dizer antimanicolonial, especialmente quando sabemos qual pessoa tida louca que foi e é encarcerada? Quem ocupa os presídios e manicômios? O que observa-se é que os manicômios e presídios são equipamento de Estado como recurso de exclusão e violação da população negra majoritariamente.
As ações das forças de segurança agem sobretudo em territórios de periferia, com o discurso de guerra as drogas mas que é plano de fundo para o genocídio da juventude negra. Em que se destaque ainda as mesmas drogas que justificam as operação não são produzidas nesses territórios no entanto chegam até ele, e por que rotas? De onde? Quem se enriquece com a guerra as drogas? Certamente não é a população periférica.
Todo esse prelúdio tem um objetivo de dizer que não é possível tratar como natural constituir uma política sobre drogas pautada na abstinência e no aprisionamento. A abordagem antimanicolonial propõe uma revolução no olhar sobre a saúde mental, desvinculando-a de estigmas e concepções preconceituosas. Pressupõe um cuidado em liberdade, não a qualquer pessoa que faça uso de alguma substância psicoativa (SPA), mas para qualquer pessoa que precise de cuidado.
Quando se fala de qualquer tratamento de saúde, de qualquer causa orgânica, ninguém é obrigado a tratar-se de câncer, diabetes, ou quaisquer outros adoecimentos. Ainda que discordemos da quem não quer se tratar, seria um absurdo imaginar alguém entrar na justiça para uma decisão judicial obrigando alguém a tomar insulina quando o diabético não quer.
Nesse sentido, falar em internação compulsória é na mesma incoerência obrigar alguém a fazer tratamento de saúde por uso de SPA. Ao contrário, a compulsoriedade da internação para este tratamento revela o caráter racista e manicomial de quem defende tal prática. Na contramão de toda prática manicolonial é preciso fortalecer e construir uma política/prática em saúde mental libertária que derrubem as práticas manicomiais, as comunidades terapêuticas e quaisquer instituições asilares de saúde mental. Ao priorizar o cuidado libertador e o respeito à autonomia das pessoas já foram criadas práticas e serviços como os Centro de Atenção Psicossocial – álcool e outras drogas, unidades de acolhimento, consultórios na rua e equipes de redução de danos.
Por tudo isso não são aceitáveis falas/práticas como a de Boulos, especialmente no lugar de candidato do PSOL, em que em nota a CNN não descartou a prática da internação compulsória, política defendida pelo atual prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB).
Essas defesas se alinham ainda à política de Eduardo Paes no Rio de Janeiro ou mesmo da Rede Abraço no Espírito Santo que perpetuam tais práticas que entendem-se encarceradoras e violadoras. Tais apontamentos estão em consonância também ao governo do Partido dos Trabalhadores quando cria o Departamento de Comunidades Terapêuticas (na estrutura do MDS), que se atualizam como manicômios modernos, modernos inclusive em suas práticas de tortura e violação.
É preciso que o PSOL componha a luta antimanicolonial e com outros movimentos sociais de juventude, mulheres, LGBTQIA+, e outros no enfrentamento a todas as formas de opressão, não em seu referendamento como nos casos acima. É preciso que a luta socialista seja de fato revolucionária e portanto libertária.