Bolsonaro no banco dos réus
O destino de Bolsonaro embaralha os planos eleitorais da extrema-direita e coloca disputas em aberto
Iniciou-se enfim o julgamento de Jair Bolsonaro e da cúpula militar e civil organizada ao seu redor na tentativa frustrada de golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023. Trata-se de um acontecimento inédito na história brasileira: um ex-presidente, generais de quatro estrelas, almirante de esquadra e tenente-coronel no banco dos réus de um tribunal civil julgados por tentativa de golpe de Estado.
Esta vitória democrática soa como um alívio para os milhões de brasileiros que resistiram confiando nas próprias forças aos mais duros anos de governo Bolsonaro. Não faltou, portanto, comemoração com o começo do julgamento, cujo desfecho deve terminar com a prisão de Bolsonaro e dos artífices da tentativa de golpe.
Nos últimos meses, às vésperas do julgamento e da inescapável condenação, Bolsonaro e seu clã buscaram sair da defensiva apelando para iniciativas de toda sorte contra o regime. No último mês, desafiou Moraes e o STF quando decidiu “dobrar a aposta” ao lado de Trump e seu tarifaço, o que lhe custou a prisão domiciliar.
Mas, afinal, o que se abre a partir de agora? É preciso ir além de assistir as divisões e crises no andar de cima, intervindo desde baixo a partir de um calendário de lutas que sejam capazes de posicionar os interesses da classe trabalhadora na dianteira das disputas abertas.
Bolsonaro e depois
O destino de Bolsonaro – já inelegível e possivelmente preso – embaralha os planos eleitorais da burguesia brasileira, que encontra dificuldades para uma linha unitária frente ao tarifaço de Trump e não tem ainda um candidato à altura para disputar 2026.
Com o cerco a Bolsonaro e as dificuldades de uma linha comum diante dos ataques de Trump ao Brasil, a burguesia brasileira busca a “Via Milei” como modelo para agitação de sua próxima candidatura, como já indicou Tarcísio ao defender o ultraliberalismo do país vizinho como saída [como debatemos neste texto]. Acontece que também aí encontra dificuldades porque Javier Milei enfrenta sua pior crise política desde que provas demonstraram o envolvimento de sua irmã, Karina Milei, em escândalos de corrupção.
Ao mesmo tempo, na disputa por hegemonia global, os Estados Unidos de Trump se apresentam em uma linha mais direta de ingerência sobre os países da América Sul, tratando de combater a influência econômica e política da China na região. As próximas eleições em países como Bolívia (que está no segundo turno), as eleições de meio período na Argentina, no final do ano no Chile e ano que vem no Peru e Brasil serão – cada qual com sua particularidade – termômetros importantes.
No parlamento, a bancada bolsonarista acossa a mesa diretora para impor a aprovação da anistia ampla, geral e irrestrita. Ontem (4), em Minas Gerais, Lula alertou para esta hipótese e, sem aludir para as manifestações do 7 de setembro, reforçou que a mobilização popular é um freio importante contra a ação parlamentar da extrema-direita. Para além de uma agitação, a ação parlamentar de bloqueio da extrema-direita se choca com a chamada “pauta positiva” do governo, como a importante medida de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais – enviada pelo governo para o congresso desde março.
Nesse turbulento cenário, a Operação Carbono Oculto, ao revelar as relações entre o PCC e a Faria Lima, onde estavam 42 alvos da operação entre fintechs, corretoras e fundos de investimento, descortina a colaboração entre o crime organizado e o mercado financeiro. Abre-se aí também uma oportunidade para demonstrar a incompatibilidade entre os interesses do povo e do chamado mercado financeiro, convocado como um ente onisciente para retirar direitos sociais e ditar os rumos da agenda econômica dos governos de turno.
A nossa pauta e a deles
O centro da nossa agitação nas próximas semanas deve ser “Sem Anistia!” e Bolsonaro na prisão, polarizando com a linha que hoje unifica a extrema-direita no Brasil. Nesse sentido, diante das disputas abertas, será fundamental a mobilização do 7 de setembro por todo Brasil, cuja convocação também incorpora o programa do Plebiscito Popular pelo fim da escala 6×1 e pela taxação das grandes fortunas.
Todas as demais lutas devem se desenvolver neste terreno da vitória democrática da prisão de Bolsonaro e todos os golpistas do 8 de janeiro, como a luta já em curso contra a Reforma Administrativa. Esse ataque sem precedentes ao funcionalismo público, com o fim da estabilidade, retrocesso nas carreiras e precarização das relações de trabalho e serviços públicos, exigirá de nós a mais ampla unidade e independência.
A solidariedade internacional ativa a Gaza, por fim, para onde estão os olhos do mundo, deve também ser nossa força motora. A campanha humanitária liderada pela Global Sumud Flotilha, da qual somos parte da delegação brasileira, é um exemplo de ação direta e internacionalismo. Desde o Brasil, a partir do dia 13, serão realizados atos e atividades em apoio à iniciativa global de solidariedade, como expressão das lutas anticoloniais e anti-imperialistas do nosso tempo.