Organizar a resistência e avançar por uma nova esquerda combativa e anticapitalista
Sobre os desafios da esquerda uma vez aberto o processo de impeachment contra Dilma Rousseff.
A crise do regime político brasileiro conheceu novos capítulos. A votação na Câmara pela admissibilidade do processo de impeachment abriu uma nova etapa na situação nacional. Dilma já não governa. Dentro de alguns dias, o Senado deve resolver pelo seu afastamento da cadeira presidencial.
A última operação trágica dramática foi o vaivém de Waldir Maranhão, que deu contornos tragicômicos para a queda do governo. Não durou 12 horas sua “última cartada”.
Esta medida daria fim, na prática, ao governo de Dilma Rousseff.
Quando concluíamos a primeira redação desse documento, numa decisão inédita por 11 votos a 0, o Supremo Tribunal Federal suspendia Eduardo Cunha da presidência da Câmara e do seu mandato como deputado.
O sentimento quase imediato de milhões de pessoas foi de celebração, sobretudo dos setores que estiveram em luta desde a primeira hora contra o “gangster” geral da república no comando do parlamento, as mulheres, as LGBT, os movimentos negro, indígena e quilombola. Cunha era uma figura odiada nas ruas, sua rejeição era altíssima. Como representação do regime das castas, arquiteto de inúmeros retrocessos e manobras institucionais, como a “lei da mordaça”, a contra-reforma política que foi feita para limitar o crescimento de partidos alternativos como o PSOL.
A queda de Cunha é, contudo, uma faca de dois gumes. Também representa uma manobra por parte da burguesia, dando poderes extraordinários para o Judiciário, como medida de “limpar a barra” do Regime, deixando o campo livre para Temer governar.
A saída de Cunha deveria ter sido anterior à sua condução do Impeachment, o que confere uma parcialidade na decisão tardia.
A presença de Cunha, repudiado e odiado, era estranha à normalização pretendida pelos atores centrais da burguesia no país. Portanto, foi funcional ao regime que Cunha saísse de cena. E mostra que existe um ambiente e um padrão democrático, que coloca que os donos do poder não possam sustentar Cunha, mesmo tendo sido chave para derrubar o governo Dilma. A direita utilizou Cunha para tirar Dilma e agora o tiram de cena.
Porém é uma manobra perigosa. Cunha, apesar de seu um homem de confiança de setores chave da burguesia, pode criar um curto-circuito caso não consiga chegar a um acordo com a direção do PMDB. Uma suposta delação premiada de um sujeito como Cunha seria uma bomba de hidrogênio sobre toda a república. Seus 267 votos para presidente da câmara, ou seja, sua base mais fiel, são um espectro que assusta Temer, o PMDB e o PSDB.
Um setor burocrático vinculado ao governo agora tem mais dificuldades de sustentar a sua tese de “golpe”.
O aplauso massivo de milhões aos deputados do PSOL e da Rede, com destaque para Erundina que “ocupou” a cadeira de Cunha mostra o sentimento da ampla maioria da população. A vergonhosa posição de setores governistas como o blogueiro Renato Rovai, de sustentar que a queda de Cunha é parte do golpe, acaba flertando com a defesa do “fica Cunha”.
O PSOL se fortaleceu porque foi o Partido que combateu Cunha desde o seu primeiro momento, no terreno parlamentar e com sua militância nos movimentos sociais como no movimento juvenil, feminista e LGBT.
A crise política combina-se com uma profunda crise econômica, que penaliza a maioria do povo brasileiro: milhões de famílias já não conseguem fechar suas contas ao final do mês. Isto traz profunda aflição à classe trabalhadora. O cenário é de poucas esperanças.
Entre 2015 e 2016 o PIB talvez caia quase 10%. As receitas do Estado caem e as despesas sobem, especialmente com suas altas taxas de juros para sustentar o rentismo. Assim, apesar dos efeitos terríveis já sentidos pelo povo, a perspectiva será de ataque ao povo que tende a aumentar a crise social e os conflitos. Este marco geral é um fato, mas temos que aqui fazer um esforço de caracterização de conjuntura para não diluir a conjuntura nas tendências gerais ainda que sem as tendências se corre o risco de uma apreciação estática.
A conjuntura será de um governo Temer com medidas reacionárias, numa luta para se estabilizar e impor seu programa de ajuste antipovo.
Enquanto isso a esquerda vinculada com o petismo não tem resposta. A velha esquerda burocrática acaba de falir e sua falência provoca desesperança e desorientação. Uma parte da nova esquerda ficou tensionada com a falsa narrativa do PT, e os setores anticapitalistas ainda não tem força para construir um terceiro polo nacional. Sequer a esquerda anticapitalista se unificou para defender medidas democráticas.
Apesar de quase dois terços da população, conforme recente pesquisa do Ibope, defenderem novas eleições para que não fiquem nem Dilma nem Temer, não existe um polo no cenário nacional com peso de massas para defender e agitar uma saída independente em meio ao impasse que está colocado. Por conta disso, a tendência é que a força majoritária eleitoral do terceiro campo tende a não ser da esquerda anticapitalista.
Nós do MES, através de Luciana Genro, nossa figura pública, fomos pioneiros na defesa de uma saída por meio da radicalização da democracia, com eleições gerais e tivemos a orientação – comum ao PSOL – pelo voto contrário ao impeachment numa Câmara dos Deputados conduzida pelo réu Eduardo Cunha.
Essa palavra-de-ordem era a única que poderia ter unido uma ampla camada do povo contra o impeachment e o governo reacionário que está nascendo.
Temos discutido a situação brasileira a partir da dinâmica internacional. Marcamos que desde 2013 temos discutido o conceito de “fim de ciclo” na América Latina, onde o Brasil tem um contexto particular, de esgotamento do modelo operado com base nas exportações, em governos de concertação, com financiamento público das grandes empresas de logística, obras e construção pesada e civil; o processo do bolivarianismo, o mais agudo e avançado, pois combinou insurreições populares com eleições de governos independentes foi parte desse fenômeno mais geral. Ao contrário dos governos de cunho social-liberal como Lula/Dilma, os K na Argentina, ou Ollanta Humalla no Peru, esses governos- sob o comando de Chávez, mas também Morales na Bolívia e Correa no Equador cumpriram um papel progressivo ao proclamarem novas constituições, o alargamento da democracia direta e participativa e também por uma agenda de direitos e conquistas para classe trabalhadora.
Diante da falência do modelo hegemonizado pelo Fórum de São Paulo, a direita continental se orientou para uma linha restauracionista, com suposto caráter modernizante, com o exemplo oriundo da Argentina de Macri.
No âmbitos mais geral, o mundo está marcado ainda pela crise econômica e pelas crises dos regimes políticos- tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. A profunda crise imigratória aponta os contornos mais dramáticos para a face social dessa combinação de crises. Não queremos tratar do tema internacional nesse documento, apenas assinalamos os traços mais gerais. A crise expõe a natureza dos regimes políticos- que tem o programa da austeridade na economia e funcionam com base em grandes esquemas de corrupção, como foi revelado numa pequena amostra com os Panamá Papers. Tais contradições geram movimentos de indignação que buscam contestar a falta de democracia e por novos rumos econômicos, que nutrem as bases para a construção de ferramentas intermediárias, à esquerda das formações tradicionais que foram majoritárias entre a classe trabalhadora e a juventude no século XX. A principal expressão desse processo é o surgimento de Podemos na Espanha, mas também se nota nas votações do Bloco de Esquerda português, da esquerda na Irlanda, na vitória de Corbyn na disputa da liderança do trabalhismo inglês. Nos Estados Unidos, a campanha de Bernie Sanders, surpreendendo pela ampla mobilização e por vitórias em vários estados nas prévias dos Democratas contra Clinton revalida a tese dos novos fenômenos que se transladam do social ao político, gerando formações inovadoras, com base na juventude e nos movimentos sociais que foram parte do ciclo de lutas aberto com Ocuppy e a campanha Black Lives Matter. Vale dizer que depois de período de refluxo do movimento operário e da comoção em torno da unidade nacional após os atentados terroristas do Bataclã em 2015, a juventude francesa volta ao centro da cena e protagoniza uma retomada do ascenso com a luta contra o novo código laboral, organizada através de praças e assembleias, num movimento conhecido como “Nuit debout”, ou em tradução simples, Noite em pé. Há que notar que o mundo está se movendo, com todas contradições. A vitória dos trabalhistas em Londres, contra a campanha islamofóbica da direita e a sabotagem da ala Blair dos trabalhistas ganha importância. Ainda que Sadiq Kanh, o novo prefeito da capital britânica, não seja diretamente alinhado com Corbyn, a eleição de um muçulmano na principal cidade Europeia em um período de crise e turbulência é um sinal da procura de alternativa de esquerda por parte das massas. O oxigênio no mundo também é buscado no levante democrático dos iraquianos, na retomada com força da luta estudantil na América do Sul- as marchas secundaristas voltam à tona no Chile, o movimento de ocupações no Paraguai derrubou a ministra da educação e os cortes no orçamento universitário podem mover o movimento estudantil argentino, há muito sem protagonismo na cena nacional.
Vínhamos afirmando em nossos documentos e resoluções que o cenário a partir de 2015 estaria marcado pela imprevisibilidade, o que vem se confirmando. Apenas agora, a burguesia começa a definir uma saída como sua para estabilizar o regime e a crise.
Queremos nesse documento armar nossa orientação, numa conjuntura de transição entre o novo governo ilegítimo de Michel Temer, suas perspectivas, e a disputa eleitoral municipal que pode ser uma expressão da indignação popular.
17 de abril como ato da crise geral do regime
A votação do domingo, 17 de Abril, na Câmara dos Deputados selou o destino de Dilma. A chamada admissibilidade do processo de impedimento da presidente foi aprovada por 367 votos contra 137, com 7 abstenções. Este foi mais um capítulo decisivo na crise política do regime agonizante da Nova República. Uma condição degradante de representantes degradados da casta política-empresarial, para usar os termos de Karl Marx, quando examinou a atitude do parlamento francês em sua obra “O 18 Brumário de Luís Bonaparte”.
Milhões assistiram ao verdadeiro circo de horrores, em que o parlamento deu um salto em sua desmoralização, por conta da despolitização e grosseria dos representantes ali presentes. Parte expressiva dos deputados, na sua exposição de motivos, abusou de argumentos rasteiros, moralistas, referindo-se a suas famílias e bases eleitorais, do fundamentalismo religioso e alusões despropositadas a deus. Os setores mais diretamente reacionários agitaram bandeiras homofóbicas e claramente contra a esquerda, além da nojenta e indignante apologia da ditadura militar realizada pelos Bolsonaros pai e filho. Uma amostragem de como a “pequena política”, nos termos de Gramsci, domina o parlamento nacional, ganhando terreno em siglas que foram fundamentais para a estratégia de governo do PT, tais como PR, PRB, PSD, PP, PTB e PMDB. Destas siglas brotou o festival de barbaridades assistido em 17 de abril. Como símbolos do zoológico político do parlamento, podem-se destacar a já mencionada fala fascista de Bolsonaro celebrando torturadores como Ustra ou a fala de Raquel Muniz, homenageando seu marido, prefeito de Montes Claros (MG), que acabaria preso menos de 24 horas mais tarde. Como bem afirmou Luciana Genro,
“O retrato da crise do Brasil é termos tido uma sessão histórica do Congresso Nacional presidida por um bandido de colarinho branco, um gângster, como se referiu a ele durante a votação o nosso combativo deputado Glauber Braga. Isso diz tudo sobre este Congresso.”
O governo perdeu com os votos de todos os seus aliados de ontem, agora unidos pelo impeachment. Assim fizeram o PP, partido recordista na Lava Jato, o PSB, além, é claro, o PMDB, que articulou tudo sob o comando de Michel Temer, vice de Dilma durante 6 anos. A verdade crua é que o PT e Dilma criaram os “corvos” que mais tarde arrancariam seus olhos.
Para compreender a totalidade e o alcance da crise do regime, devemos retomar o significado das manifestações e acontecimentos do país nos últimos 3 anos. As Jornadas de Junho de 2013 fraturaram o regime, abrindo uma nova etapa política na vida nacional. Como um exercício recorrente de debate, voltamos ao documento que apresentamos na revista especial Esquerda Socialista para o V Congresso do PSOL, apontando sentido para Junho como
“um movimento de massas de contestação ao regime burguês, uma irrupção de centenas de milhares de jovens no domínio da política que marcou uma mudança qualitativa na relação de forças entre as classes a favor da mobilização social do povo. Para os que diziam que o povo brasileiro não tinha mais vontade e capacidade de mobilização, o levante de junho foi um desmentido. Junho de 2013 fraturou o regime. Por isso nós vamos ter que voltar a debater Junho, porque foi o momento que fraturou o regime, que se provou o esgotamento do regime surgido do fim da ditadura militar e que só não se desenvolveu mais à esquerda pela ausência de uma alternativa de esquerda de massas.”
Dilma e seu marqueteiro agora preso construíram um perfil de campanha onde se evocou o “espírito de Junho” de forma casuística e demagógica para superar Marina no primeiro turno e vencer o segundo contra Aécio. Prometeu não retirar direitos e aprofundar conquistas. Prometeu e não entregou. O plano Dilma/Levy aprofundou o ajuste recessivo e condenou milhões a uma rápida piora em suas condições de vida. Esse estelionato flagrante foi um ponto fundamental para a ruptura de massas com o governo nos setores mais expressivos de sua própria base social e eleitoral.
O questionamento ao regime ganhou diferentes formas e vetores. A manifestação multitudinária do dia 15 de março de 2015 foi um deles. Para galvanizar o descontentamento popular, setores da classe média ocuparam a Avenida Paulista pedindo a saída de Dilma, dirigidos por uma convocatória que foi turbinada pela “nova direita” nas redes sociais, apoiada por atores fundamentais da direita, estimulada incessantemente pela Rede Globo. Definimos como um “simulacro” do que tinha sido Junho. Tal manifestação atraiu a simpatia de milhões, alguns deles entre a juventude e a classe trabalhadora, construindo uma série de atos domingueiros como pioneiros na campanha pelo Impeachment. A noção de simulacro se comprova pelas relações dessas manifestações com as instituições fundamentais do regime como os aparelhos ideológicos- apoio franco e aberto da Rede Globo, das revistas e jornais mais conservadores como Estadão, Veja e outras mídias- e dos aparelhos repressivos como a polícia militar, confraternizando com alguns manifestantes. Cresceram nesse ambiente, como fruto da falência das respostas do PT e da maioria da velha esquerda, setores da extrema-direita, minoritários mas estridentes. Após anos de dispersão, a direita mais dura se coesionou num porta-voz, defensor da ditadura, contra os direitos humanos, as mulheres, os negros e a comunidade LGBT, na figura de Jair Bolsonaro. Como linha auxiliar dessa direita, também cresceu o discurso de alguns setores fundamentalistas de dentro da bancada evangélica, no caso oriunda de partidos que até ontem eram parte da base governista.
Essa foi a base social para dar o passo seguinte: uma reação para colocar nas ruas, setores de massa a favor de uma saída mais burguesa. Com base de massas, garantida pela rejeição à corrupção do PT, foi o alicerce social para a defesa do impeachment.
A Operação Lava Jato, como também a definimos em documento de abril de 2015, trouxe novos ingredientes para dar vazão à indignação popular, desnudando os negócios que a casta político-empresarial vinha fazendo às sombras nas estatais nos últimos anos.
Esse ambiente proporcionou a mudança fundamental nos planos de importantes setores da burguesia, após o final do ano: da pressão pelo ajuste, utilizando a fórmula de cerco ao governo, para a linha de derrubada parlamentar. A decisão de dezembro do STF colocou em suspenso a hipótese do impeachment. No entanto, a dinâmica do imprevisível se impôs: a delação bombástica de Delcidio do Amaral, nada menos que o líder do governo no Senado e ex-dirigente tucano, precipitou o descontrole político, levando a maioria da burguesia e da mídia a lançar mão da “solução definitiva”.
A burguesia já não apostava em Dilma como capaz de gerir o país, esgotado o pacto de classes e o modelo econômico adotado na última década. Foi o fim da coalizão com vistas a um “capitalismo gerencial de estado”, em que o BNDES financiava a expansão da presença de megaempresas privadas de logística e construção – o cartel das empreiteiras, base fundamental da aliança entre PT e PMDB, com alguns partidos menores, cuja engrenagem era garantida pelos esquemas ilegais de financiamento.
O 17 de abril mostrou também a pouca capacidade de resistência do PT. Foi uma derrota acachapante de sua estratégia. Não convocou mobilizações para a sexta anterior, confiou todo o tempo na recomposição da base parlamentar com propostas de cooptação material para os partidos mais fisiológicos. Lula comandou esta operação diretamente de um hotel de luxo em Brasília. Quem vocalizou essa estratégia foi o histriônico Sílvio Costa (PT do B-PE). Ou seja, a falta de altivez dos deputados petistas se explica pelo tamanho da derrota do governo, apunhalado por seus parceiros prioritários nos últimos quinze anos.
O impeachment foi uma mudança reacionária
Definimos o impeachment como uma medida reacionária para dar posse a Temer e impor um governo de transição para construir um novo “padrão” de normalidade nas relações políticas e sociais. Por isso, votamos a favor da resolução no V Congresso do PSOL (dezembro de 2015) que orientava a votação contrária ao impeachment e já fazia ressalvas a participar de atos em defesa do governo.
Não definimos golpe como uma medida semântica. Estamos contra fazer comparações com 1964, como diversas vezes o fizeram os veículos de comunicação e mídias governistas. A construção desse relato foi instrumental para a defesa do governo, confundindo-o com a defesa genérica de “democracia”. Retomamos a polêmica que estabelecemos à época com setores como a revista Carta Capital, que chegou a estampar em sua capa manchete que afirmava estarmos vivendo um novo 1964, abusando do conceito de “golpe” e distorcendo a historiografia num perigoso gesto de desespero. Como escreveu Charles Rosa,
“As movimentações da oposição de direita para derrubar Dilma Rousseff são absurdamente oportunistas e sem legitimidade, em grande parcela por já conhecermos o caráter dos seus porta-vozes e articuladores. São sujos querendo destituir mal lavados. Mas tais movimentação até agora não configuram um “golpe” em sentido estrito e não alteram qualitativamente as “regras” da luta de classes que vem sendo “disputada” nos últimos anos no país (Como já observaria um sagaz comentarista de internet, “Fla x Flu” verdadeiro é “ricos x pobres”; “PT x Globo” é mais um jogo-treino entre titulares e juniores de um mesmo clube de futebol). Ter consciência disso implica em não adotar posturas passíveis de serem instrumentalizadas “em nome de uma democracia abstrata” pelo “setor político pró-burguesia” prestes a ser removido do governo, ainda que ninguém em sã consciência tenha coragem hoje em dia de se dizer um governista incondicional.”
Não foi sequer uma golpe “a la Honduras”, como alguns também sustentaram. No caso da deposição de Zelaya, houve uma luta encarniçada em que os militares renderam e depuseram o presidente em sua residência e Zelaya ficou por meses na embaixada do Brasil, como gesto exemplar de não legitimidade ao governo golpista.
O que existiu foi uma manobra reacionária, encabeçada por um setor corrupto, como Cunha e Temer, apoiada na antiga base parlamentar governista, que, mudando de lado, consolidou a manobra de Temer, do PMDB e dos setores majoritários da burguesia. Não houve mudança de qualidade no regime. Não houve um “golpe de Estado”. Podemos definir como um “golpe palaciano”, no qual o vice-presidente eleito depõe a presidente através de um processo sem qualquer vínculo com crimes de responsabilidade, no caso das pedaladas fiscais, aproveitando-se do derretimento da base parlamentar e do apoio público à Dilma.
O que existe é uma nova normalidade no regime: agora será mais fácil tirar governantes quando a burguesia local quer e quando o governante não tiver base parlamentar. O argumento patético das Pedaladas, que não impõe nenhum crime de responsabilidade vai servir como uma jaula de ferro para qualquer governo que queira romper os limites da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Nós denunciaremos Temer e os que fizeram a manobra do impeachment para aumentar os ataques ao povo, mas também denunciaremos o PT que se aliou com eles, se corrompeu, manchou a bandeira da esquerda, deixando de ser de esquerda há muito tempo (embora o povo não vá pensar assim, razão pela qual a esquerda de conjunto sai questionada). O PT ensinou a confiar no regime burguês como se este regime fosse respeitador do voto e como se em seu marco fosse possível conquistar mudanças de verdade. O PT foi traído e tragado pelo regime que depositou todas as suas forças, recusando-se a construir qualquer alternativa de participação de verdade.
No auge das Jornadas de Junho, Dilma cogitou a ideia de uma assembleia nacional constituinte como forma de realizar uma reforma política e dar “voz às ruas”; tal retórica não se sustentou por 24 horas: a pedido de Temer, Dilma engavetou a ideia de dar poderes a uma assembleia nacional constituinte para seguir seu rito de “governabilidade” com a aliança com o PMDB, PP, demais partidos fisiológicos a serviço do grande empresariado. Com o povo nas ruas, Dilma ofereceu um pacto em rede nacional, antecipando parte de seu estelionato eleitoral, antes mesmo da campanha de 2014.
Somente por se adaptar que o PT foi aceito como parte do regime e vencedor das eleições de 2002. A Carta ao Povo Brasileiro, redigida por Lula, não foi apenas simbólica, senão foi o atestado de confiança do PT nas instituições que agora ele acusa de darem um “golpe”; o PT se integrou e segue integrado ao regime.
Desde o auge da crise, não assistimos de forma passiva. Estamos entre aqueles que levantaram a necessidade de um terceiro campo, como tarefa mais urgente, evitar a polarização e a derrota anunciada entre aqueles que trocam afagos e pancadas no pântano do congresso nacional.
Alertamos para a necessidade de construir um terceiro campo e que não se deve entrincheirar com o governo sob a bandeira da defesa da “democracia”, apesar da qual os setores majoritários do campo da defesa do governo não apostaram na mobilização para derrotar o impeachment.
Também diz muito o fato de Dilma e o PT terem escalado Cardozo como porta-voz na defesa do governo. O mesmo Cardozo que atuou para desmontar junho e a luta durante a Copa, articulador da aprovação da lei antiterrorista. Como gesto de rendição, há que assinalar como o discurso de Dilma na ONU foi revelador. Dilma perdeu a oportunidade maior de denunciar o “golpe”, recuando não apenas por um problema tático, mas sobretudo, porque é parte da democracia burguesa e não a questiona para além do discurso. Dilma foi categórica ao afirmar para o mundo que vivemos uma plena democracia, diretamente em suas palavras, uma “pujante democracia”.
A luta por eleições gerais era a única saída com amplitude de massas. Uma oportunidade de disputar a consciência dos mais de dois terços que apontavam de forma difusa para essa saída como a mais razoável para a crise do país. Isso responderia às necessidades concretas do movimento de massas e não para a confusão da vanguarda atraída pela narrativa do PT e seus aparelhos.
A maior limitação para o PT e seus satélites é ser parte do regime. Mesmo na oposição e com algumas bravatas, não estamos de acordo com a hipótese que o PT possa radicalizar de fato seu enfrentamento ao futuro governo, sendo inclusive parte de sua estratégia garantir que Lula seja uma carta forte para 2018. O centro do PT é construir um Frente social e política- aos moldes da Frente Ampla uruguaia- para reduzir danos causados a imagem do Partido, com Lula a cabeça, enunciando “feliz 2018”. As declarações de Janot complicam essa estratégia, pois Lula cada vez mais fica exposto às denúncias de corrupção.
Temer como proposta de restauração: perspectivas do novo governo
Existe um esforço por parte da maioria da burguesia para garantir que Temer conclua o mandato de Dilma – apoio da burguesia e redução relativa da crise política e, portanto, das incertezas. Isso levará a uma melhora da economia para os capitalistas, não para os pobres. Ou seja, sob a bandeira da estabilização, Temer precisa operar com habilidade as mudanças estruturais que necessita impor. Já tem a aceitação por parte da burguesia para recuperar investimentos e abrir novos mercados para novos setores que vejam no Brasil novas oportunidades.
Os ataques ao funcionalismo público vão se intensificar. Numa escala muito maior do que o governo do PT. Essa deve ser uma das marcas do novo governo do PMDB e aliados.
O ataque à “economia da meia-entrada”, como caricaturizam alguns comentaristas econômicos burgueses, irá começar pelas beiradas, preparando os ataques mais duros para depois. Além disso, existe uma pressão para acelerar a reforma da previdência.
A reforma da previdência é uma medida que tinha sido anunciada por Dilma, através de seu ministro Rosseto. Ela é apontada por relatórios do Banco Mundial como “principal reforma” para garantir o fechamento das contas públicas, penalizando ainda mais trabalhadoras e trabalhadores. A reforma previdenciária de Lula em 2003 foi um dos primeiros sintomas de quanto que o PT e a burguesia estavam dispostos a atacar direitos e conquistas históricas da classe trabalhadora brasileira. Com a mesma sanha, Dilma aprovou com votos petistas no parlamento, ainda em 2015, restrições ao seguro-desemprego, a pensão por morte e ao auxílio-doença. Temer vem sugerindo ir até o fim com a reforma previdenciária com a idade mínima de 65 anos para homens e mulheres.
O programa de Temer surge a partir de duas elaborações anteriores: os documentos conhecidos como “Agenda Brasil” e depois, em versão mais definitiva, “Ponte para o futuro”, votado como documento orientador da ação do PMDB pós Dilma.
Sua principal proposta é construir um liberalismo orçamentário, de ocasião, desvinculando as receitas de suas contrapartidas constitucionais. Ou seja, retroceder quanto ao investimento em áreas essenciais com a saúde, a educação e a segurança. O congelamento quanto ao funcionalismo público, já ensaiado por Dilma também deve assumir formas mais agressivas. E o corte de verbas para a pesquisa, ensino e extensão, fazendo das universidades públicas um dos setores mais atacados da chamada “ponte”.
Temer já deixou claro suas intenções. Há dias deu uma declaração emblemática, sem meias palavras: “O Estado deve transferir para o setor privado tudo o que for possível em matéria de infraestrutura”. Sua proposta inicial de “governo de notáveis” foi redimensionada para atender ao condomínio de negócios de sua base parlamentar. Isso se verificou na mudança de composição dos ministérios, onde o primeiro ensaio era um corte drástico e agora já tem uma proposta mais suave de manutenção dos ministérios.
A questão das privatizações, a partir do rombo das estatais, onde a saída para a “crise da Petrobrás”, será a ampliação da abertura ao capital privado. Seria irônico se não fosse uma tragédia nacional o fato de que o PMDB foi, junto com setores do PT, o partido que mais saqueou e repartiu influência na maior estatal brasileira, agora se oferece como solução privatista da mesma. O ritmo das privatizações será acelerado e estendido com grande bandeira do governo Temer- a normalização do investimento e a recomposição de investidores virá por aí, apostam os principais articulistas do novo governo.
Para dar coesão a seu plano, Temer chamou o homem de confiança da burguesia- e de Lula, sempre bom lembrar- Henrique Meirelles. Seu núcleo político vai contar com seus dois principais assessores, o gaúcho Eliseu Padilha e Moreira Franco. O acordo com o PSDB é a outra chave para a estabilidade. FHC e setores da cúpula do PSDB tem afirmado o óbvio: participar do governo como fiador da ideia de unidade nacional. Não se pode menosprezar a aliança de Temer com a burocracia sindical ligada a Força Sindical e seus satélites. Paulinho, sua sigla de aluguel, o Solidariedade, foram a tropa de choque de Temer na manobra do Impeachment e vão oferecer seus “serviços” para ser parte da “unidade nacional”.
Meirelles deverá levar a cabo um plano para aprofundar as medidas de ajuste e ataques contra os direitos dos trabalhadores, com a necessária unidade por parte da burguesia e da mídia para levar a cabo. Com base a ideia de conter a inflação, ampliar investimento e “equilibrar as contas públicas”, vai retomar propostas como a lei das terceirizações, antigo PL 4330, seguir demonizando o funcionalismo público- que como já dito será o principal alvo dos ataques numa primeira fase de um governo Temer; no terreno do mundo do trabalho, para garantir uma nova relação, onde se aumente a produtividade e diminua o “custo do trabalho”, o novo plano econômico pode retomar a ideia, exposta nas teses da “Ponte para o futuro” de que o negociado prevaleça sobre o legislado, soterrando ainda mais conquistas históricas da CLT.
Como Temer irá responder à sua base parlamentar atrasada em temas de direitos e costumes? A cogitação de Denis Rosenfield como artífice de comunicação poderia indicar um ponto de contato entre a base mais conservadora da sociedade e a política de Temer. É fundamental acompanhar os passos que essa nova articulação de governo vai tomar, pois temos uma dinâmica de luta e protagonismo das mulheres, LGBT’s, Negras e negros, indígenas nos últimos anos que podem se chocar com medidas de caráter conservador que o Temer possa indicar. A presença de um membro da Igreja Universal no ministério da ciência e tecnologia e as negociações com Feliciano e o PSC respondem à essa lógica.
Uma contradição flagrante no comando do processo de impedimento de Dilma, o peso político do réu Eduardo Cunha é um problema real para a burguesia e sua via de governabilidade. Já alertávamos isso antes do seu afastamento, onde prognosticávamos que o mais era “o STF tirar Cunha da presidência – tirando da presidência vão querer passar a ideia de que a corrupção está sendo combatida”. Resolver essa contradição ainda é uma decisiva para garantir o mandato de Temer.
Claro que tal estabilidade não pode ser tomada como absoluta. Para chegar a um respiro em 2017, Temer terá de atravessar diversas turbulências, como mostra o relatório do FMI que previu “tombo de 3,8%” em 2016 e confirmou a “pior recessão do século”, conforme notícia de El País:
“O desempenho desastroso da economia no Brasil em 2015 vai se repetir em 2016, confirmando dois anos seguidos de profunda recessão no país, segundo o relatório Perspectivas Econômicas, divulgado nesta quarta pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). A projeção do Fundo é de uma queda de 3,8% do Produto Interno Bruto em 2016, o mesmo resultado registrado no ano passado, quando pelo menos 1,5 milhão de brasileiros perderam seus empregos. É o terceiro pior resultado da região, atrás da Venezuela (-8%) e do Equador (-4,5%). A Argentina deve ter queda de -1%”.
Em janeiro, a projeção do FMI para o Brasil era de uma queda de 3,5% da atividade econômica. Mas a turbulência política se sobrepôs e manteve a deterioração da economia, que hoje serve de pano de fundo do processo de impeachment. Em seu relatório voltado às Américas, o FMI dedica boa parte do capítulo referente ao Brasil para tratar da dívida pública nacional. Embora o Fundo mostre que o país foi afetado, a exemplo de outros países vizinhos, pela desaceleração da China, a queda dos preços de matérias-primas, e a volatilidade cambial, “o endividamento confirma o descolamento brasileiro por erros cometidos internamente”.
Temer conta a seu favor, para além de amplo arco de apoio da burguesia, com uma alargada base parlamentar, vide o resultado da votação do impeachment, com o serviço da grande mídia que começa a dar “novo enfoque” para os problemas políticos da vida nacional e com o fato de que ele não deve ser candidato a reeleição. Existem, contudo, muitas contradições no cenário do novo governo como parte do plano de ajuste. Podemos citar:
O fato de que o PMDB é o maior partido implicado na Operação Lava-Jato;
A disputa sobre o aumento de impostos como a CPMF, somada à questão fiscal, em particular a crise das dívidas estaduais;
O questionamento à legitimidade do governo Temer; A popularidade de Temer, ao redor de 8% em pesquisa que questiona se os brasileiros acham este governo uma saída para a crise;
A confusão que pode ser causada pela liberação de energias com setores que ainda continham a luta social na oposição
A maior debilidade do novo governo é sua implicação na OLJ, com desdobramentos imprevisíveis. Isso já foi visto no anúncio do ministro Mariz, logo em seguida retificado por seus vínculos com a Operação Lava-Jato. Assim que esta se torna a contradição fundamental para o futuro de Michel Temer.
O novo presidente sabe de todas essas contradições e vai buscar desfazê-las adotando uma política que combina composição/cooptação com a coerção. Seus diálogos com José Rainha para escalar a nova equipe do Incra e as relações com as burocracias sindicais de direita, as patotas de Paulinho da Força, são sinais. Usará para chantagear os outros setores sindicais medidas como a cartada do fim do imposto sindical. De outro lado, não hesitará em utilizar as leis “duras” que Dilma fez votar durante o seu governo, como a Lei Antiterrorismo e medidas de exceção, aproveitando a realização da Olímpiada. Resumindo: a estratégia de Temer é construir a sensação de que estamos numa dinâmica ascendente, que a piora de hoje iria impulsionar a melhora de amanhã.
Há um perigo grave de retrocesso no campo institucional, onde Temer se utilizando da grande mídia e do rechaço ao PT possa impor uma reforma constitucional reacionária, reduzindo o espaço do PSOL e da esquerda com leis eleitorais ainda mais draconianas e reforçando mais os aspectos repressivos da legislação atual. Essa hipótese levantada por Cesar Benjamim, em entrevista para a revista Piauí, depende da correlação de forças e do peso da esquerda para resistir ao governo Temer. Sobre a cláusula de barreira voltaremos a nos referir mais adiante.
Contudo, os problemas do Brasil real vão seguir e se avolumar. A crise social tem no Rio de Janeiro um laboratório: crise na saúde, finanças em frangalhos, serviço público paralisado e as Olimpíadas ainda pela frente. A queda da ciclovia ampliou o ranking de mortes em obras “olímpicas”: foram 13 até agora, 11 deles mortos em acidentes de trabalho. Os problemas crônicos também devem seguir em todo país. Ainda não se respondeu à devastação causada pela tragédia de Mariana, e às epidemias de Zika Virus e Chikungunha, agora a de H1N1 com o frio que começa a chegar no sul e sudeste do Brasil.
A disputa de hegemonia no novo ciclo
A nova realidade política do país vai seguir marcada pela busca de uma alternativa, agora também pelo desembarque do PT na oposição, tentando realinhar seu espaço para recuperar terreno no movimento de massas.
Apesar de crescer por conta do fracasso do PT, há dificuldade de estratégia no PSOL e isso se expressou ao não ter sido parte da construção de um terceiro campo no período “quente” da crise política.
Defendemos a linha de eleições gerais dar sentido a um campo político que escapasse à polarização entre o “fica” e o “fora Dilma”.
Nossa posição ajudou a costurar importantes pontes, como por exempo José Padilha, Marcos Rolim, Flávio Tavares, Vladimir Palmeira, que se posicionaram pela saída de eleições gerais. Isso também nos aproxima da base social que se relaciona com a Rede.
Ao não apostar numa campanha de massas por novas eleições, como o fez Marina, por exemplo, o PSOL acabou num lugar intermediário. Por um lado, a postura combativa da bancada parlamentar, o respeito ganho em inúmeros setores; por outro, o risco de um não descolamento do PT, como o caso de setores do PSOL e da Intersindical que participaram do ato com Dilma no 1° de Maio, ou os atos em que dividiram palanque com Lula.
O mesmo Lula que afirmou a necessidade de um novo pacto, uma nova “carta ao povo brasileiro”, demonstrando que a polaridade contra o suposto golpe era uma peça retórica para pressionar por um rearranjo por cima, que mantivesse o ajuste e deixasse Lula impune para concorrer em 2018.
Pensamos que essa discussão é importante, não apenas para mirarmos no passado, mas para pensarmos a ação do Partido no futuro.
O Partido tem agora uma grande oportunidade diante das eleições municipais. Para ser, de forma objetiva, um terceiro campo, distante da direita e do naufrágio que significou a esquerda relacionada com Dilma e o PT.
O risco fundamental daqueles que abraçaram acriticamente a linha de unidade com setores do governo era de não separar-se do PT e seu projeto; e como consequência defender “genericamente” as instituições fundamentais do Regime. A defesa de nossa precária e injusta democracia sob o argumento de que era a única defesa possível. Renunciando as demandas das ruas, de Junho e depois à demanda por democracia real.
É certo que não vamos renunciar a defesa de uma esquerda renovada, democrática e combativa, para tanto, devemos discutir a estratégia do PT e retirar lições para o desenvolvimento do PSOL.
Relacionar a estratégia do PSOL como uma luta que combine a ação de rua com espaços de poder, vertendo novos instrumentos democráticos e uma nova institucionalidade é fundamental. O Partido deve buscar intervir nesse novo quadro, buscando evitar a identificação com o PT.
Ao encabeçar a luta por novas eleições, se postulando em primeiro lugar nas pesquisas, Marina ganhou pontos, no terreno eleitoral. Ao contrário do que dizem os setores governistas, foi a Rede e não os setores mais reacionários, que cresceu como alternativa diante da sociedade.
A Rede aparece com grandes chances eleitorais de 2018 – ao mesmo tempo fraca organicamente, por não intervir diretamente no movimento de massas. A divisão de sua pequena bancada na votação do impeachment também é um alerta relativo à dificuldades da heterogeneidade de sua composição.
Contudo, logrou também uma boa localização ao lado do PSOL na representação contra Cunha.
Neste cenário contraditório, reiteramos a nossa estratégia. Defendemos o legado da esquerda, mas fazemos de uma forma renovada.
A disputa da herança de Junho como levante popular juvenil, como símbolo da ação política independente do movimento de massas. Apenas com um novo Junho se poderá construir uma nova institucionalidade.
As sondagens de opinião feitas por pesquisadores da USP e de outras universidades sobre a composição social e política dos atos dos dias 13 e 18 de março, concluem que existe peso de massas para medidas progressivas na sociedade, em ambas passeatas, diametralmente opostas por seus significados. A força de ideias como a de que o Estado deve prover saúde e educação como prioridade; a do passe-livre nas grandes cidades; a defesa dos direitos civis; entre várias da agenda progressista; indica o espaço para nossa intervenção.
Seguem as lutas, dispersas, mas radicalizadas
Não existe um ascenso centralizado das lutas capaz de marcar a conjuntura do país. A falta de um polo claro para as lutas sociais impede que a indignação generalizada possa transbordar. Expressão disso foram as demonstrações do dia 1° de Maio; além da festa multitudinária promovida pela Força Sindical, o ato do Anhangabaú, organizado pela Frente Brasil Popular e pela CUT teve a marca do adesismo: a principal estrela foi Dilma. A postura de alguns sindicalistas do PSOL de se postular ao lado de Dilma deve ser repudiada. A própria falta de iniciativa do governo, sem apontar um plano claro de resistência, capitulando na ONU e aceitando a derrota do Senado mostra a desorientação desse campo político.
A manifestação organizada pela CSP Conlutas, por setores da oposição de esquerda e do PSOL na Avenida Paulista foi importante e teve o mérito de existir como um ato independente e classista. Porém, o número de presentes: entre 2 e 3 mil, mostra a insuficiência da política e da inserção da Conlutas.
Tal dificuldade, somada ao fato de que a vanguarda está divida, coloca a impossibilidade de uma ação centralizada e ofensiva do movimento de massas, nessa conjuntura.
O que existe e deve se multiplicar são lutas e conflitos parciais, dispersos, mas radicalizados.
A luta do funcionalismo público contra o parcelamento dos salários e o sucateamento das condições do serviço público se faz presente em vários estados: na greve/ocupação da prefeitura de Contagem por parte dos educadores contra o governo do PCdoB; na greve estadual dos professores do Ceará e na greve unificada dos servidores públicos do estado do Rio de Janeiro. A manifestação que marcou um ano da repressão aos professores do Paraná juntou 25 mil pessoas em Curitiba.
O problema das dívidas dos estados- que no plano da superestrutura ganham a forma de uma queda de braço entre as fazendas estaduais e a União, no tema do cálculo entre o juro simples e o composto- compõe o ataque que os governadores vem impondo aos servidores. Sob a justificativa de que o caixa está quebrado, parcelam salários e atacam mais e mais o funcionalismo público. Essa é a realidade de vários estados da federação.
O Rio de Janeiro é o ponto mais avançado desse desmonte do serviço público. O governador Pezão está afastado por motivos de saúde, uma greve em boa parte das repartições públicas completa o cenário. Precisamos acompanhar não apenas pela situação social latente, também pelo peso objetivo que pode jogar o PSOL; e pela interrogante aberta das olímpiadas.
A juventude também tem dado demonstrações de força, com uma recomposição por fora das direções tradicionais: a entrada dos secundaristas, com o método de ocupação das escolas, fruto da vitória contra Alckmin em dezembro de 2015, herança de Junho. São vários estados em que se registraram movimentos de ocupações de escola. O Rio de Janeiro tem dezenas de escolas ocupadas como bandeira em defesa da educação; São Paulo retoma através das escolas técnicas, com uma nutrida e combativa vanguarda forjada no ano passado. As cenas da desocupação da sede do Centro Paula Souza, uma operação policial de alto porte, foram notícia em todo país, evidenciando a disposição de luta dos secundaristas. Importante destacar a greve dos professores do Ceará, uma greve radicalizada combinada com ocupações de escola – já são quase 30 – protagonizadas pelos estudantes secundaristas, enfrentando o autoritarismo do governador petista Camilo Santana.
O consigna de “ocupar e lutar” é um demonstração de radicalização e se choca contra o regime. É um salto na consciência dos mais jovens e reflete Junho.
Devem seguir também as lutas de mulheres, negras e negros, da comunidade LGBT. E lutas ambientais como a ampla vanguarda que se formou para condenar o desastre de Mariana, ocorrido há seis meses.
Devem seguir também manifestações e conflitos por moradia, reivindicações populares, entre outras.
O movimento operário industrial vem sendo abatido pelo problema das demissões, do fechamento de vagas, em vários polos industriais do país.
Para responder ao cenário de lutas dispersas, os governos vão intensificar a repressão, como já pudemos ter uma mostra no caso do assassinato de dois sem-terra no Paraná. A burguesia vai querer normalizar mais a repressão, instituindo medidas de força como a ampliação de penas para quem quiser protestar. Vai ampliar o cerco às entidades e organizações populares pela via judicial, exemplo de setores mais reacionários como o de parte do Ministério público de SP.
A grande questão é superar a dificuldade de um polo organizativo alternativo com autoridade e capacidade de convocatória.
Devemos impulsionar nas categorias, para além das lutas, composições sindicais e chapas antiburocráticas, para ampliar pontes e sínteses com novos setores de vanguarda sindical que começam a surgir; várias eleições sindicais demonstram isso, com a crise dos aparatos e insuficiência da esquerda combativa. Ainda teremos várias eleições sindicais importantes nesse ano.
A melhor forma de atuar nessa conjuntura é apoiar as lutas concretas e reivindicações do povo, da juventude em todas as suas dimensões; participar das iniciativas que defendam a unidade em torno de problemas concretos, campanhas salariais, defesa da moradia.
Precisamos ficar atentos para a entrada da juventude com mais força e vigor nos próximos eventos políticos do país. E seguir o funcionalismo e as campanhas salariais das categorias mais pesadas, da indústria e do setor de serviços.
É necessário um plano de lutas que possa organizar de forma democrática nos locais de trabalho, estudo e moradia convergindo para um dia de lutas e protestos com a pauta de defesa dos direitos e por uma saída independente para a classe trabalhadora e a juventude.
Defendemos que a investigação da casta deve continuar e uma saída democrática para a crise política
Temos defendido que a Operação Lava Jato (OLJ) deve seguir. Nesse momento, ela não será apoiada por ninguém. E é ela que ainda pode desestabilizar a dominação, além da lógica resistência, que não tem força no momento para impedir a ascensão de um governo Temer, mas pode ajudar a impedir a normalização da dominação. Por isso é tão importante apoiar a Lava Jato e as lutas de resistência ao ajuste.
O marco histórico é que pela primeira vez os donos do poder estavam presos, como explica Roberto Robaina, sobre o lugar da Operação Lava-Jato
“Devemos precisar o que se refere à defesa da Operação Lava-Jato: há um impressionismo em setores de esquerda, que tomam a OLJ como um processo essencialmente a serviço da “direita”; na verdade, a OLJ deve ser pensada a partir do seu conteúdo e da repercussão que tem em amplas massas. A profundidade da OLJ revela as entranhas do poder como nunca o país pode assistir. Os principais capitalistas brasileiros, as megaconstrutoras, foram desnudadas. O fato de os donos e executivos de empresas como OAS, Odebrecht, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão estarem detidos em Curitiba é realmente uma novidade política em toda a vida republicana brasileira. Nunca os corruptores tinham sido tratados da mesma forma que os corruptos. Esse núcleo — das empreiteiras que dominam o oligopólio da “logística” no país – controla grandes fatias do investimento e do orçamento público desde o período dos governos militares. Porém, a OLJ conseguiu também organizar de forma consistente, até aqui, a relação promíscua entre o núcleo financeiro e o núcleo “político”. Desvelou, para milhões, o esquema sórdido das castas que governam num ciclo que começa na liberação dos recursos públicos, via BNDES, estatais e outros, em contratos superfaturados, relacionando-o com o esquema de financiamento de partidos, líderes e de quase uma centena de deputados e senadores eleitos, atingindo em cheio os três mais influentes partidos do país, PT, PMDB e PSDB. A investigação alcançou os presidentes das duas câmaras legislativas do país: Renan Calheiros e Eduardo Cunha.”
Está em curso uma luta entre a continuidade da OLJ e um grande acordão para abafá-la. Tivemos dois fatos novos e importantes nas últimas semanas: a nova entrevista do MPF, se referindo a novas denúncias contra João Santana, Marcelo Odebrecht e outras 16 pessoas. Demonstrando a relação entre o esquema nas estatais, com centro na Petrobras e o mercado da indústria naval.
Deltan Dallagnol, coordenador da força tarefa da Lava Jato, tem levantando o programa de “defesa das 10 medidas emergenciais contra a corrupção”, várias delas propostas que já tinham aparecido nas campanhas da CNBB e da reforma política.
Rodrigo Janot, através da PGR, ofereceu denúncias nessa semana contra Dilma, Aécio, e Lula, como parte do esquema da Lava-Jato; no caso de Lula, Janot confirmou os indícios da delação premiada de Delcídio, reafirmando que Lula utilizou de sua influência para calar Nestor Cerveró, buscando evitar o acordo de delação premiada. Janot afirmou não duvidar das responsabilidades de Lula nesse esquema de corrupção.
É preciso defender a continuidade da Operação Lava-Jato. Por isso sustentamos que a esquerda deve impulsionar amplos comitês suprapartidários e da sociedade civil para que a OLJ não pare.
A defesa da luta contra a corrupção será uma linha divisória chave para a disputa da opinião da sociedade. Como disputamos esse discurso é o que pode nos vincular com o movimento de massas, farto e indignado com as castas. É preciso ter política para não deixar essa bandeira nas mãos da direita hipócrita e moralista.
Vale citar trecho da entrevista de Chico Alencar sobre a Lava-jato para o site Correio da Cidadania:
“E o Brasil é o país das transições intransitivas. O governo é péssimo, fazemos oposição, mas quem quer tirar a Dilma e por o Temer quer aplicar aquele velho princípio de mudar para continuar como está. E inclusive quer obstaculizar a Lava Jato. Acham que já “cumpriu” sua função, de colocar o carimbo de corrupção no PT (não sem razão), tirar a Dilma e dizer “chega”, porque depois o normal seria pegar tucanos, mais gente do PMDB etc.
A investigação não pode parar e tem de ir fundo, mas o pacto de rearranjo do poder implica também na contenção da Operação Lava Jato. Aliás, aquele procurador suspeito de ser contra o PT – Carlos Fernando dos Santos Lima – falou com todas as letras, em evento público em São Paulo, que se deve reconhecer que o PT, tão incriminando nas investigações, permitiu ao Ministério Público e à Polícia Federal agirem com mais autonomia, o que não ocorria há anos – palavras dele. E tem de ser assim, quem errou, quem se lambuzou, tem de pagar.”
Diante disso, é necessário construir uma saída global para a crise, atuar e ter política sobre todo um período. As eleições municipais vão demonstrar a necessidade de combinar a luta por um programa local democrático e radical com a luta por saída geral para o conjunto da crise que se arrasta.
Nossa política deve concentrar a articulação entre as lutas pelas demandas populares e da juventude, com a defesa do prosseguimento da Lava-Jato e tal saída que passa pela defesa de eleições gerais.
Temer já vem polemizando contra a ideia de novas eleições. Safatle o respondeu na sua coluna de 6 de maio:
“Novas eleições é golpe.” Foi assim que o vice-presidente, Michel Temer, e os próceres de seu partido procuraram desqualificar a proposta de eleições gerais como saída para a crise política na qual o país se encontra. A frase tem lá seu lugar na história(…)Sejamos claros: no Brasil, o Congresso se transformou em uma partidocracia corrompida que gerencia eleições eivadas de distorções ligadas à presença do poder econômico, a casuísmos, ao limite brutal do tempo de campanha, à mobilização de uma imprensa recheada de canais de comunicação de posse, direta ou indireta, dos próprios políticos.”
Seguiremos estimulando a linha da campanha sobre novas eleições, no âmbito de todo o Partido para desenvolver a oposição de esquerda a Temer com um chamado democrático. A declaração da bancada do PSOL na ALESP, conformada por Carlos Giannazi e Raul Marcelo; o ato que será organizando em conjunto com a APS e mandato Fernando Carneiro, junto com PPL em Belém, orientam nossas iniciativas, enquanto a linha do petismo é apostar em atuar no “corpo a corpo” com os senadores para reverter sua derrota anunciada.
Junto a essas linha geral, apoiamos as lutas e levantamos algumas consignas e tarefas – com eixo democrático- para o período.
- Fora Temer! Eleições gerais já!
- Prisão para Cunha e todos corruptos! Cassação de todos os políticos envolvidos nos esquemas de corrupção. Punição para corruptores, lobistas e empresas; confisco de bens e devolução do dinheiro público; A Operação Lava-Jato deve seguir. Não pode ser abafada ou interrompida. Como também a questão da máfia da merenda.
- Contra o ajuste e o plano econômico de Temer. Defesa do salário, emprego, moradia; contra os cortes orçamentários na saúde, pesquisa e educação. Abaixo os juros.
- em defesa do serviço público e das lutas do funcionalismo. Contra o desmonte do serviço público pelos governos estaduais e municipais
- Pela auditoria imediata das contas e da dívida pública da União. Auditoria das dívidas estaduais; não ao parcelamento dos servidores; por um novo pacto federativo, um plano de emergência para garantir o pagamento dos salários nos estados.
- Pela taxação das grandes fortunas/dividendos;
- Por mais direitos! Em defesa dos direitos das mulheres, da comunidade do LGBT, Negras e Negros. Etc
Como parte da articulação dessas consignas, para além da conjuntura, defendemos a necessidade de uma república, novas instituições, com uma Assembleia Nacional Constituinte de caráter popular.
Nossa lógica não é simplesmente julgar se a Constituição atual pode ser superada agora ou se teremos um retrocesso democrático. Mas afirmar que o empoderamento popular, a aposta na soberania do povo é o único caminho para evitar o retrocesso inevitável caso o povo não participe.
Ou seja, não se trata de ser passivo, de esperar uma melhora na relação de forças entre as classes, mas de atuar para que as relações de forças melhorem. E isso não se faz apenas defendendo uma constituição que foi produzida noutra etapa da luta de classes, a partir dos conflitos e do protagonismo de outros sujeitos que não estão mais em ação. Se trata de interpelar para que surjam e se organizem os sujeitos sociais ligados ao povo e a juventude, de forma ativa e democrática.
As eleições municipais de 2016 como grande desafio para o PSOL
O PSOL vem atuando e ganhando peso de massas, ocupando o espaço à esquerda, ampliado em junho e agora pelo fim do ciclo do PT. Contudo, apesar da unidade nacional, o PSOL conhece diferentes relações com o movimento de massas, refletindo a desigualdade de suas relações e experiências.
Podemos resumir da seguinte forma: uma primeira experiência pode ser apontada em Belém, onde o PSOL essencialmente substitui o PT, porque Edmilson já era a principal expressão do PT, sendo agora do PSOL. Em segundo lugar, a experiência do Rio, onde o PT se liquidou em 98 e não se levantou mais, ainda que o PSOL, com exceção de alguns líderes como Chico Alencar, seja essencialmente formado por novas lideranças que não eram líderes no PT. Freixo se projetou como líder da luta democrática contra o esquema corrupto das milícias, ganhou destaque na disputa de 2012 e hoje é uma referência para setores de massa da capital carioca. E em terceiro lugar, onde o PT é forte, seja por aparato e a existência de líderes à esquerda, como no RS, ou é forte por aparato e controle de sindicatos, como em SP. Na capital destes estados, apesar disso, o PSOL disputa com força a tentativa de ser a força hegemônica ou pelo menos majoritária na esquerda. Em Porto Alegre com mais força pela liderança de massas de Luciana Genro, que era uma liderança emergente no PT e fundou o PSOL, se destacando ao longo destes anos e construindo um partido de intervenção.
Em São Paulo há um quadro novo; onde o PSOL tem a chance de sair da marginalidade com a candidatura de Erundina. A presença de Erundina na ocupação dos secundaristas, o gesto de ocupação simbólica da cadeira de Cunha deram visibilidade para nossa nova e combativa deputada. A primeira pesquisa onde aparece como candidata, indica quase 7% das intenções para Luiza Erundina. Uma enorme mudança no quadro do PSOL paulista.
Não será fácil porque Haddad, assim como Raul Pont e Luiziane Lins, tentam ocupar um espaço à esquerda, na onda do “não vai ter golpe”, embora Haddad mesmo tenha vergonha de afirmar sem ressalvas esta caracterização falsa.
O PSOL ainda aparece como alternativa em várias cidades como Natal, Florianópolis, Fortaleza, Salvador, Recife, para citar capitais; mas também com chances reais em Niterói, Sorocaba, Nova Friburgo, onde nossos deputados disputam a prefeitura com apoio de setores populares.
Vamos ter um debate sobre a recomposição e as alianças e relações com quem o PSOL e a esquerda deve apostar.
Parte do PT e setores da Frente Brasil Popular vem defendendo uma linha de “abraçar” o PSOL, dando uma roupagem de movimentos sociais para uma direção que é um aparato cuja história recente de colaboração de classe levou a que uma parte da população confundisse o nome da esquerda com corrupção e parceria com empreiteiros.
O PSOL tem uma história forte de contestação ao PT, e uma história destas não se apaga em poucos dias, por mais históricos que sejam estes dias, o PSOL não adentrou definitivamente no campo dirigido pelo petismo. Seria um exagero. Mas há tensões dentro do Partido, onde por exemplo um pelo setor de sindicalistas de SP e sobe no palco com Dilma, fala em “refundação do PSOL” –– e cogita a aliança com o PT já no primeiro turno das eleições municipais.
Vamos dar o combate contra essa perspectiva, pois o próprio êxito eleitoral do PSOL estará condicionado com sua capacidade de se afastar das velhas castas políticas e se apoiar nos novos setores sociais e políticos que estão em dinamismo e com novas formas de fazer política.
Esse é o desafio do PSOL. Buscar pontes e levantar um programa de democracia radical para as cidades, que revolucione as estruturais locais, com um caráter “comunal” para definir as medidas democráticas radicais- com fim dos privilégios das burocracias partidárias, a transparência e participação como regra e método das principais decisões, dialogando com o funcionalismo público e o conjunto do povo. O desafio de apresentar um programa para a crise urbana, de transporte, violência pública, desemprego que seja crível, participativo e radical.
2016 será um grande teste para todo PSOL . O que acontecerá na eleição municipal?
Em Porto Alegre, vamos nos bater por uma campanha fundamental. Pela primeira vez, temos chances reais de vencer a disputa eleitoral e construir um polo de poder local sob nossa direção.
Porto Alegre, como se sabe, é uma cidade referência para o conjunto da vanguarda mundial. Há menos de duas décadas se projetou como exemplo de democracia participativa e como espaço mundial por conta do Fórum Social Mundial. Também foi a capital da resistência em 1961, onde a partir da cadeia de legalidade, encabeçada por Leonel Brizola, se derrotou a tentativa de golpe civil-militar. Portanto, carrega um legado enorme. Na história recente, Porto Alegre antecipou parte do que seriam as Jornadas de Junho, onde uma mobilização multitudinária da juventude derrotou a proposta da prefeitura de aumentar as tarifas do transporte, no mês de Abril, portanto, dois meses antes da explosão de Junho em São Paulo. E naquela ocasião, houve uma combinação particular, da ação do movimento de massas com uma política do PSOL: a bancada de vereadores do Partido na capital ganhou a causa jurídica que determinou o retorno da tarifa ao preço anterior.
O Partido terá candidaturas expressivas em cidades como Pelotas, Manaus, Santarém, São Gonçalo, Viamão, agregar outras.
Uma vitória eleitoral, com a ampliação da votação absoluta do PSOL e de sua representação nas câmaras de vereadores, seria um passo para vencer a lei da mordaça ou uma eventual nova cláusula de barreira.
Em 2018 a lei da mordaça irá pesar pela segunda vez, só que com mais força. Esse passo da burguesia é uma das hipóteses para travar qualquer alternativa de massas que surja por fora do regime.
A lei da Mordaça foi funcional para estabilizar o regime, para marginalizar a esquerda e reduzir a pressão de esquerda institucional sobre o regime. Quem foi o articulador da lei? Eduardo Cunha. O PSOL fez campanha para que a lei não fosse aprovada, articulando com parte da superestrutura política. Coube a Dilma vetar ou sancionar. Apesar dos apelos do PSOL, do golpe contra a democracia que a lei Cunha promovia, Dilma sancionou, e a lei agora pode ser usada contra o direito democrático do debate. Estes são os passos para preparar o aumento da exploração dos trabalhadores em geral e a derrota do funcionalismo público em particular
Uma interrogante a partir de então: será que ao reduzir o espaço institucional, aumentam as possibilidades de explosões, protestos, espaço para o imprevisível da ação extra parlamentar? E também, embora aumente as dificuldades da esquerda, pode ter um efeito positivo ao reduzir o espaço do oportunismo. Temos que embaralhar essas questões.
Preparar as batalhas que virão
Existe debate na sociedade. As dificuldades para se colocar em pé uma alternativa com peso de massas são as dificuldades de trajeto, histórico, do movimento dos trabalhadores, das mulheres e da juventude.
Estamos nos preparando para a conjuntura de resistência ao governo Temer e para apresentar alternativas reais para as eleições municipais. Os sites colaborativos como “Se a cidade fosse nossa” no Rio de Janeiro e “Compartilhe a mudança” em Porto Alegre começam a fazer o debate sobre projeto de cidade com uma ampla vanguarda, para além do próprio PSOL.
Junto a isso não perdemos de vista, duas tarefas, estratégicas: o apoio constante às lutas em curso e a necessidade de reorganização das forças anticapitalistas e revolucionárias.
A juventude é chave para o triunfo de qualquer projeto anticapitalista. Apoiamos o Juntos como parte de um movimento autêntico de juventude, organizativamente independente, conectado com os processos mundiais como as lutas dos Chilenos, Paraguaios, os franceses que levantam na “Nuit debout”, a campanha por democratização da comunicação através de Snowden, a onda de ocupações de escolas que a recém começa no Brasil. Também é chave a entrada em cena da classe trabalhadora, agrupada em suas ferramentas e com seus métodos e reivindicações. Apostamos no desenvolvimento dessa entrada para lutar por um patamar superior na condição da vida política nacional.
Defendemos o fortalecimento do PSOL como ferramenta democrática e anticapitalista, como forma de receber novos lutadores de distintas origens e concepções de esquerda; parte desse combate passa por seguir defendendo o ingresso pleno da Esquerda Marxista nas fileiras do PSOL; por ampliar nossa presença orgânica nos setores da classe operária; por ampliar laços com importantes organizações de dentro e fora do PSOL, com aliados como o PSTU e a CSP Conlutas; por dar a batalha no terreno das ideias, nas universidades, na academia, para a construção de uma forte e renovada vertente marxista revolucionária- como parte dessa política impulsionamos a Revista teórica Movimento; na difusão do portal de la Izquierda, onde nos orgulhamos de anunciar que acabam de se incorporar como colabordores, os quadros do agrupamento “Barulho” da cidade de Brasília, que tem forte presença na vida intelectual da capital do país; na defesa dos mandatos socialistas no enfrentamento dentro dos parlamentos reacionários; no internacionalismo militante em defesa das causas dos imigrantes, da revolução curda e no acompanhamento de novos fenômenos como Podemos e Sanders.
Estes são os passos para preparar a resistência diante do novo ciclo, como forma de superar o vazio de direção do conjunto do país, dando um sentido comum para as ações independentes do povo em sua luta para construir um novo Brasil.