Venezuela: a posição expressa pelo presidente do PSOL não nos representa

Luiz Araújo declarou, em nome do PSOL, que toda a esquerda do PT ao PSOL apoia a política de Maduro na Venezuela. Isso não é verdade.

Pedro Fuentes 1 ago 2017, 19:00

Rechaçamos a posição assumida pelo presidente do partido Luiz Araújo que, em nome do PSOL, declarou à imprensa que toda a esquerda do PT ao PSOL apoia a política do presidente Nicolás Maduro na Venezuela. Para ser ainda mais explícito, declarou que o Foro de SP tem essa posição de apoio, embora o PSOL (por sorte!) não esteja lá. Será que o próximo passo de Luiz Araújo será que o PSOL ingresse neste organismo onde, entre outros, está Daniel Ortega — que se transformou num autocrata que se diz de esquerda e tem sólidos acordos com o imperialismo? Acha também que temos que apoiar o ditador Bashar al-Assad na Síria?

Araújo pode falar em seu nome, mas não aceitamos nenhuma declaração em nome do PSOL de apoio a Maduro sem discussão e votação nos organismos partidários. Por isso temos todo o direito de tornar pública esta nota.

A posição de Araújo e da Secretaria de Relações Internacionais é uma vergonha para um partido que defende o socialismo e a liberdade. É uma mancha para o PSOL que tem como razão de ser, desde sua fundação, lutar pela liberdade e pelo socialismo — como diz em seu próprio nome. Ficar do lado de Maduro é apoiar práticas anti-socialistas e antidemocráticas que lembram o estalinismo. As práticas maduristas são uma cópia das que fez Stalin em seu momento. Apoiar Maduro é ficar do lado de quem utiliza o exército para uma repressão que já fez mais de cem mortos. É apoiar quem faz uma manobra fraudulenta impondo aos funcionários públicos que tenham que votar com um novo documento chamado cartão cidadão; que engana o povo falando do inimigo imperialista, mas faz acordos para entregar uma grande parte da riqueza mineral do país.

Todo o partido deveria apoiar a Plataforma Cidadã em Defesa da Constituição onde estão ex-ministros como Héctor Navarro, Oly Millán Campos, Ana Elisa Osório e Gustavo Márquez; os professores universitários Edgardo Lander, Esteban Emilio Mosonyi, Santiago Arconada; o constitucionalista Freddy Gutiérrez; o major-geral Cliver Alcalá Cordones; os dirigentes do Marea Socialista Gonzalo Gómez, Juan García, Carlos Carcione e Roberto López Sánchez. São companheiros que fizeram parte do governo de Chávez, ou valiosos companheiros que estiveram na primeira fileira contra o golpe de 2002 e participaram da fundação do PSUV. É posição similar a de Maristella Svampa, Lander e mais de 500 intelectuais e personalidades que assinam um chamado mundial por uma saída democrática para Venezuela. Ambas estão contra a Nova AC, contra o MUD e toda ingerência estrangeira do imperialismo.

Na Venezuela vive-se uma situação dramática, provocada pela casta burocrático-burguesa no poder e pela lumpen-burguesia expressa na MUD. A MUD ganhou amplos setores da classe média e do povo tomando as bandeiras democráticas que o madurismo abandonou. Quem deu força à MUD foi Maduro com sua política. O MUD — se blindando atrás dessas bandeiras — pretende devolver o poder a um pequeno setor burguês que durante muitos anos o usou apenas para viver tranquilamente da renda do petróleo entregue ao imperialismo. Mas Maduro responde diretamente a uma casta formada entre o aparato burocrático-burguês e os militares que abandonaram as conquistas democráticas, sociais e anti-imperialistas que foram introduzidas pela Revolução Bolivariana dirigida pelo comandante Chávez: a nacionalização do petróleo, a democracia direta que facilitou a auto-organização popular, a utilização da renda petroleira para desenvolver ambiciosos projetos sociais.

No entanto, o povo passa fome e vive uma situação dramática na Venezuela. O enfrentamento não tem nenhum setor progressivo. Nossa posição não é de neutralidade! Apoiamos aqueles que defendem que seja o povo que decida, sem manobras fraudulentas! Na Venezuela não há um enfrentamento militar que nos obrigaria ter que tomar outra posição.

Nós podemos falar sem nenhum temor sobre Maduro e Diosdado Cabello, porque estivemos desde o primeiro momento apoiando as transformações radicais de Chávez. Nós estivemos na Venezuela quando a patronal fez a longa greve e a sabotagem petroleira. Estivemos juntos com os trabalhadores de Carabobo quando estes recuperaram as destilarias — junto com o movimento 13 de Abril e o ministro de planejamento Ronald Denis ajudando-os a fazer o movimento de contra-insurgência. Graças a essa posição consequente o comandante Chávez veio ao Fórum Social Mundial de 2003 em Porto Alegre, convidado por Luciana Genro, fazendo um discurso histórico no auditório da Assembleia Legislativa — à revelia da direção do PT e dos organizadores do Fórum Social Mundial, que haviam feito de tudo para negar o convite.

Por isso, temos suficiente autoridade para falar a verdade. Araújo e a Secretaria de Relações Internacionais falam de apoio à Revolução Bolivariana. Porém, o governo de Maduro é a antítese do Chavismo. É, digamos com todas as palavras, a degeneração da Revolução Bolivariana. É um regime bonapartista totalitário: guardadas as devidas proporções, Maduro tem muito mais semelhanças com o Gaddafi dos últimos anos e José Eduardo dos Santos, de Angola.

A história tem nos ensinado, desde a Revolução Francesa até nossos dias, que quando uma revolução se estanca ganham força os aparatos que a degeneram. Assim se passou com a Revolução Russa ou mesmo com a de Angola — que sofre a ditadura de J. E. Santos — e agora na Venezuela. O enfrentamento atual entre duas forças regressivas (a direita com a MUD e o governo de Maduro) explodiu com força brutal contra o povo, que vive momentos angustiantes. Na Venezuela vive-se a contradição entre a grande crise mundial que vive o capitalismo e ausências ou debilidades de alternativas anticapitalistas. Mas o PSOL existe para construir alternativas e não para se misturar com o neo-estalinismo.

Por último, a chamada “votação para uma nova constituinte” tem sido uma mega fraude. Para que os companheiros do PSOL, dirigentes ou militantes, olhem para os processos com objetividade, compartilho um breve texto de um companheiro do chavismo crítico fazendo a análise sobre domingo.

A arte do engano e a mega fraude

Com crise, com as pesquisas dando menos de 20% de apoio ao governo, com cifras não críveis que ultrapassam a Chávez e a anteriores votações de Maduro, tendo perdido a Assembleia Nacional em 2015, com mais dissidências como o Chavismo crítico… E ainda assim uma abstenção “oficial” de 58,47% sem contar ainda os votos nulos.

Os 8 milhões de votantes não são de maneira nenhuma críveis. Vimos muitos centros de votação quase vazios, mas que deram impacto visual habilitando o Poliedro para votar por fora dos centros eleitorais de sempre. Uma manobra goebbeliana espetacular. Não acreditamos nessas cifras e na porcentagem de 41,57% de votantes do primeiro boletim.

O governo repressivo fez uma megafraude eleitoral com militarização, repressão, voto forçado e sob pressão. Trata-se um governo de corruptos, subornado pela Odebrecht, obras pagas inconclusas pelo valor que atenderia a fome, desfalque brutal, e uma direita com símbolos desbotados de esquerda que entrega ao país enquanto briga verbalmente com o império. Já sei que haverá companheiros que justificarão até que nos prendam — os chavistas críticos e a esquerda não-madurista. Mas não sigam apoiando este governo farsante e violador dos direitos humanos. Vamos resistir às manipulações. Nem burocracia nem capital. Nem PSUV nem MUD. Não ao Arco Mineiro, não ao sacrifício do povo por uma dívida corrupta, não a mais empresas mistas com transnacionais e imperialismos, velhos ou novos. Agora o poder constituído da nomenclatura se apresenta como “constituinte” — pura burocracia corrupta. Superemos ela. Viva Chávez.

Há muitos outras provas irrefutáveis apresentadas por militantes chavistas. Uma delas (em espanhol) é “En Venezuela el orden de los factores si altera el producto”, por Oscar Omaña.


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Pedro Micussi