A mineração e o espalhamento do Coronavírus
Como a atuação das mineradoras pode explicar a primeira morte por Covid-19 no interior de Minas Gerais?
Em Mariana (MG), no dia 1 de abril, foi confirmada a terceira vítima do estado de Minas Gerais acometida por Covid-19, tornando-se a primeira cidade no interior a confirmar uma morte pela doença, causada pela pandemia do vírus Corona (SARS-CoV-2). A vítima era um homem de 44 anos, que trabalhava para uma empresa terceirizada pela Fundação Renova, construída pelas mineradoras Vale S. A. e Samarco, responsável pela reconstrução dos subdistritos destruídos no crime da Samarco, ocorrido em Mariana no ano 2015.
A morte mobilizou entidades sindicais da região dos Inconfidentes a construir uma nota unificada alertando sobre a atuação das mineradoras em Minas Gerais, pois não paralisaram suas ações, além de não demonstrarem preocupação em garantir a segurança dos trabalhadores atuantes na mineração.
Apesar de ser citada pela mídia como a responsável por importação de testes que detectam a doença Covid-19, a empresa pouco faz em atitudes práticas para garantir a saúde e integridade das pessoas que trabalham nas regiões de mineração, que, por exemplo, se deslocam para as áreas de mineração em transportes comunitários, além de trabalhar em locais de grandes aglomerações.
Além disso, as mineradoras, com destaque a Vale S. A., se destacam por altos números de contratações através de empresas terceirizadas, o que permite facilidade em negar direitos trabalhistas, reduzindo a relação com as (os) trabalhadoras (os). Assim diminuem sua responsabilidade em tomar as devidas medidas protetivas e terceirizando, inclusive, a responsabilidade em atender as devidas medidas de proteção.
A Fundação Renova, que existe desde 2016, criada a partir de um acordo nacional com a mineradoras, responsáveis pelo crime da Samarco em 2015, também contrata serviços de diversas terceirizadas nas ações de reconstrução no munícipio de Mariana e demais subdistritos. Essas atividades mobilizam um grande contingente de pessoas em toda a região.
Outra notícia que se destaca é a recém preocupação da Vale com o impacto financeiro da empresa devido a paralisação em outros países, como Malásia e Canadá, que exigiram a suspensão das atividades por temer o espalhamento da doença entre suas populações, que se localizam onde a mineradora está presente.
Mas, no Brasil, em especial no estado de Minas Gerais, nenhuma medida foi tomada para impedir o espalhamento da doença nas cidades mineiras com presença das mineradoras, como em Itabira, Itabirito, Mariana, Ouro Preto, Barão de Cocais, além de diversas outras cidades. Após a primeira morte, demonstrou-se a real possibilidade de as empresas serem responsáveis por infectar não apenas pessoas que circulam as áreas de mineração, mas toda a comunidade das cidades.
Por outro lado, o governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), que estabeleceu quarentena para o estado, não se pronunciou em relação a não paralisação da empresa. Não é a primeira vez que o governador se faz refém da mineradora. Após o crime ocorrido em Brumadinho (MG), Romeu Zema se posicionou favoravelmente a empresa Vale, em detrimento da população. Para Romeu Zema, a Vale tomou todas as atitudes possíveis, e ainda denominando o crime, responsável pela morte de 252, como “incidente”. A maioria das vítimas eram trabalhadores da própria Vale S. A.
O governador, que também é empresário, não se mostrou seguro com a paralisação completa das atividades econômicas, medida indicada pela OMS para combater o avanço da pandemia. Chegou a declarar que estudaria o retorno às atividades do comércio. Essa fala de Zema ocorreu após o posicionamento do presidente da República, Jair Bolsonaro, em rede nacional, na qual o presidente apontou as medidas de quarentena, adotadas por governadores e prefeitos no Brasil, como histeria.
A aparente submissão do governador às mineradoras tem relação com o profundo endividamento e caos fiscal na qual se encontra Minas Gerais, que deve ser agravado com as suspensões de atividades econômicas e, consequentemente, redução da arrecadação. A Justiça do Trabalho de Ouro Preto determinou que parte da multa que a Samarco deve pagar, por condenação do crime de 2015, será utilizada em medidas de combate à doença.
Contudo, o governo não estuda pensar em medidas semelhantes à tomada pela Justiça do Trabalho, nem em aumentar os impostos recolhidos através da mineração, que, por não ter as atividades suspensas em Minas Gerais, pode aumentar os gastos do estado em tratamento dos doentes. No ano de 2019, a Vale distribui entre acionistas o lucro de R$ 7,5 bilhões.
A pouca convicção do governador, em relação as medias de combate ao Covid-19, também se evidenciaram quando 25 governadores escreveram carta direcionada ao presidente com cobranças de atitudes concretas em auxílio aos estados, e, ao lado do Coronel Marcos Rocha, governador de Rondônia, Romeu Zema preferiu não se manifestar. O alinhamento entre governo Zema e Bolsonaro se concretiza na ação de evitar a paralização da mineração, visto que em decreto publicado no dia 26, o governo coloca a mineração como atividade essencial.
Assim, enquanto os casos de infectados por Coronavírus avançam no estado, o governador se mostra letárgico em tomar decisões, ignorando recomendações da OMS e ministério da saúde, realizando um apoio envergonhado ao, cada vez mais isolado, presidente Bolsonaro, e permitindo liberdade integral as mineradoras. Por sua vez, as mineradoras não demonstram nenhuma vontade em suspender suas atividades. Novamente a Vale S. A., bem como as demais mineradoras, demonstram que sua preocupação primeira é com seus lucros e ignoram as vidas que rodeiam seu entorno. As cidades que vivem verdadeiro medo institucionalizado anualmente nas temporadas de chuva, devido à insegurança das barragens que continuam utilizadas na mineração, agora também observam o espalhamento do vírus através das mineradoras.
Fontes:
Coronavírus e mineração