As vitórias de 2002

Globo vai passar a final do penta, mas a maior vitória de 2002 foi manter viva a esperança e o ânimo.

Max Costa 12 abr 2020, 14:13

A Globo vai exibir neste domingo o jogo final da Copa do Mundo de 2002, quando o Brasil se sagrou pentacampeão mundial. Em tempos de pandemia e desesperança, a emissora tenta nos levar de volta a um ano de vitórias, dentro de campo e também fora dele.

Entre as quatro linhas, o Brasil voava. A dupla de Ronaldinhos fazia belezuras nos gramados, com dribles desconcertantes – que depois estenderam para a Receita e para a política – gols decisivos e, juntamente com Rivaldo, foram os principais responsáveis pela campanha invicta e vitoriosa da seleção brasileira.

Fora de campo, o Brasil ia mal das pernas economicamente, reflexo de uma crise que tinha abatido a América Latina, em especial a Argentina, uma das principais parceiras comerciais. Porém, o que se vislumbrava no campo da política, era animador. A experiência com o governo tucano e sua cartilha neoliberal de privatizações apontava a necessidade real de mudança, e o brasileiro encarnava em um operário a esperança e a possibilidade de recontarmos a história. Greves pipocaram em várias categorias, movimentos como o MST e a luta pela Reforma Agrária se fortaleciam, e mais de 100 mil ocuparam a Esplanada dos Ministérios contra o neoliberalismo de FHC e do FMI.

A experiência de um governo dos trabalhadores era palpável. A vitória nas urnas combinaria o acúmulo eleitoral e institucional do PT com as ruas ocupadas por movimentos que resistiram ao receituário neoliberal da década de 90, e canalizaria, assim, as indignações do povo em um projeto eleitoral. E foi nisso que muitos e muitas se apegaram, inclusive eu. Mesmo com as sinalizações que Lula já dava aos mercados, com a ausência de firmeza estratégica e com as alianças com José Alencar e setores da velha política, o signo da vitória era concreto.

O Brasil foi campeão nos gramados e, nas urnas, o povo foi vitorioso, pelo menos até então. O que decorreu dali em diante mostrou que 2002 se transformou na vitória da derrota ou então no início da derrota de um projeto que poderia ter sido vitorioso.

Nos campos de futebol, o que se sucedeu foi a intensificação de esquemas de corrupção, com a Fifa negociando até a escolha das sedes das Copas, e a emergência de um futebol moderno distante do povo, com estádios elitizados e transformados em arenas. Aliás, estádios estes que foram reformados ou construídos, em sua maioria, com dinheiro público em obras superfaturadas. Recursos que poderiam ter sido investidos na construção de hospitais e equipamentos de saúde, que hoje fazem falta em tempos de pandemia.

No campo da política, Lula enveredou por um caminho de traição sem volta, que acabou por pavimentar o golpe que Dilma sofreu uma década depois. Embora tenha desenvolvido políticas sociais compensatórias, aplicou ajustes econômicos com políticas como a Reforma da Previdência de 2003, que foi o estopim para o surgimento do PSOL. Esteve aliado com expoentes da velha política como Sarney, Barbalhos, Cabral, Renan e muitos outros, e assim caminhou paripasso e tolerante com escândalos de corrupção, como se também se beneficiasse por tais esquemas.

Essas opções alimentaram a direita que, de forma oportunista e em simulacros do que teria sido junho de 2013, ocuparam as ruas juntamente com alguns craques do Penta, lutando contra a corrupção e a velha política, quando na verdade, eram também parte integrante da corrupção e da velha política.

Com esse caminho pavimentado por uma esquerda institucional desmoralizada e pela ausência de novas referências para serem idolatradas, Bolsonaro ocupou o vazio político e tem nos levado para derrotas seguidas. Agora, diria que nossa geração está jogando a partida de nossas vidas contra o Coronavírus, com um jogador que se postula como craque e capitão do time, mas que vive fazendo gols contra.

Mas a partida ainda não terminou. Talvez encerre o tempo comum, mas depois ainda teremos prorrogação e pênaltis decisivos. E, nesse interim, é válido sim olhar para 2002, para aprender com os erros táticos e estratégicos, valorizar os craques mas sem idolatrá-los e avaliar bem as jogadas seguintes.

A maior vitória de 2002 foi manter viva a esperança e o ânimo. É o que precisamos nesse momento, para de forma coletiva, celebrar as vitórias de nosso povo, não apenas os simulacros, mas a vitórias estratégicas e essenciais para nossas vidas.


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