Privilégios, mentiras e impeachment de Marchezan

Nesta segunda-feira, às 10h, será votado o relatório da CPI, cujo resultado é a demonstração de que Marchezan, em suas relações com alguns empresários, cometeu crime de responsabilidade, improbidade e corrupção passiva.

Roberto Robaina 30 ago 2020, 22:35

Em 22 de março de 2017, quando Marchezan articulava sua gestão em parceria com o empresário Michel Costa, já então investigado pela polícia por fraude no DAER, o prefeito anunciava, em coletiva à imprensa, que iria economizar R$ 50 milhões com cortes em cargos de confiança de seu governo. Naquele momento, a prefeitura contava com 700 CCs. Na campanha eleitoral, prometera reduzir em 70% o total de comissionados. Hoje, faltando poucos meses para terminar seu governo, fim que pode ser antecipado por um processo de impeachment, são 689 CCs. O corte prometido foi conversa furada. Não subtraí os que foram demitidos nos últimos dias, depois da crise irreversível na base de sustentação do governo na Câmara Municipal. Parece mesmo que os CCs são reduzidos apenas quando Marchezan quer retaliar aliados, segundo ele, infiéis. 
Aqui precisamente bate o ponto. Marchezan não apenas deixou de combater os privilégios e não reduziu os esquemas partidários que partilharam o poder ao longo destes anos. Sua gestão defendeu privilégios de amigos empresários e sabotou a transparência e a eficácia no serviço público, como provamos com as investigações da Comissão Parlamentar de Inquérito. O prefeito recebeu presente de empresas com negócios junto à prefeitura e usou a estrutura de CCs para obter, durante toda sua gestão, a maioria dos votos na Câmara dos Vereadores. A sociedade precisa saber que a Câmara aprovou, contra o nosso voto, a maioria esmagadora dos projetos do prefeito. 

Como regra, foram projetos atacando interesses dos servidores de carreira, determinando a terceirização dos serviços e o endividamento da cidade. Parcelou a folha em vários meses e congelou salários desde 2017. Como se não bastassem provas de seu caráter antipopular, faz até hoje terrorismo contra os trabalhadores e as trabalhadoras do IMESF, ameaçando demitir a todos. O ataque deste governo representou também assalto ao salário indireto dos servidores, com redução nominal da renda. Foi este o significado do aumento da contribuição previdenciária de 11% para 14% em 2017.

 Assim, carregando nos servidores o preço da crise, os gigantescos déficits orçamentários, sempre projetados pelo governo Marchezan, transformaram-se em superávits crescentes. No último ano de seu governo, Marchezan apresentou à Câmara de Vereadores um projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) com previsão de “pleno equilíbrio fiscal entre despesas (R$ 7,9 bilhões) e receitas municipais (R$ 7,9 bilhões)”. Marchezan vende a ideia de que o “equilíbrio fiscal” em 2021 resulta “de ampla reestruturação administrativa, de planejamento e gestão da máquina pública, condição que capacitou o governo a administrar os reflexos econômico-financeiros de grande amplitude e duração trazidos pela pandemia do novo coronavírus”, quando na verdade foi o resultado de um massacre dos servidores e do abandono de bairros pobres da cidade (e dos não pobres também).Os investimentos em ativos fixos da prefeitura tiveram uma curva declinante em todo o governo Marchezan até 2019. Eis a essência de um governo promotor da recessão. Mesmo neste ano, ano de eleição, no primeiro semestre foram investidos R$ 67,5 milhões. Em 2019, foram R$ 52,7 milhões aplicados nos seis primeiros meses, em valores corrigidos até junho de 2020.

Se Marchezan tivesse cumprido sua promessa de corte de 70% dos cargos de confiança, a cidade teria mais R$ 70 milhões para investir, levando em conta que R$ 100 milhões anualmente são gastos com a estrutura política do governo. Sim, 100 milhoes ao ano! Levando em conta que 30 milhões foram gastos de publicidade em 2019, seriam R$ 100 milhões adicionais. Quando se sabe que as despesas totais em assistência social em 2019 foram de R$ 220 milhões e R$ 30 milhões todos os gastos com habitação, percebe-se a relevância que o corte de privilégios pode representar.

Quando, finalmente, leva-se em conta que a cidade teve um crédito de R$ 57 milhões em 2018 e de R$ 72 milhões em 2019, que serão pagos em algum momento pelas gerações futuras, se vê que a estrutura de CCs tem seu peso ao drenar 100 milhões ao ano dos cofres do governo. Foi esta estrutura que deu a base de sustentação do governo Marchezan na Câmara. Ele disfarçou o toma-la-dá-cá com o discurso do Banco de Talentos. A CPI provou que isso era uma mentira criada por empresas privadas que montaram o plano de governo do autoritário e neoliberal prefeito, apropriando-se com seus especialistas (bagunçando áreas como a educação) da gestão pública. 
No final, no momento de pavimentar seu caminho para tentar um novo mandato, Marchezan mostrou-se um desastre político e desorganizou sua própria base. A oposição, que tem, desde o início, apontado ilegalidades no seu governo, não deixaria de atuar numa hora destas. Diante da possibilidade de derrubar um governo, cuja continuidade representa uma ameaça fatal à luta pelo serviço público, certamente não há razão para hesitar.


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