Pelo direito de lutar pela terra: Justiça para Claudemir da FNL
Claudemir Novais, um dos coordenadores da Frente Nacional Luta Campo e Cidade, também é alvo de muitas condenações ilegais, mesmo já tendo sido preso injustamente há dez anos atrás. Ainda assim, o número de ocupações vitoriosas que se tornaram assentamentos e a consciência tranquila são maiores em sua trajetória.
Em 1972, no sul da Bahia, nasceu Claudemir Novais. Na infância difícil, trabalhou desde os oito anos e compartilhou a vida com outros sete irmãos, na pequena cidade de Ibicuí. Os pais adotivos trabalhavam no comércio e construíram em casa as primeiras lembranças do mundo da política que Claudemir carregaria. Seu pai participava do Partido do Movimento Democrático Brasileiro, e sua mãe, do Partido Democrático Social.
Aos 13 anos, as discussões sobre democracia e eleições diretas para o país chamaram a atenção de Claudemir. Recorda de em 1985 participar de atos políticos onde encontrava os conhecidos da juventude católica e dos bancários sindicalizados. Logo já estava à frente do Grêmio Estudantil Edson Luís. Assim foi amadurecendo a ideia de se organizar dentro de um partido, tal qual os pais mostraram que havia sentido, e então começou a contribuir para a construção do Partido dos Trabalhadores em Ibicuí, onde cresceu.
Em 1993 foi à Prado, cidade baiana, para conhecer um acampamento que ficava dentro da fazenda Rosa do Prado desde 1989, cheio de famílias com a esperança de tornar o território um assentamento definitivo. A visita foi suficiente para Claudemir ser conquistado pela urgência genuína e potência da luta pela terra. Ali, decidiu que a construção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o MST, faria parte do seu cotidiano. As primeiras atividades foram com a tarefa de vender fotografias de autoria de Sebastião Salgado, para garantir a verba necessária para construir uma grande escola de referência nacional para as famílias assentadas.
Do nordeste, convocado para São Paulo
Não demorou para Claudemir receber o convite – ou convocação, como gosta de dizer – para ajudar a desenvolver a luta social pelo direito à terra e ao trabalho digno no sudeste, e prontamente aceitou. Na capital de São Paulo, trabalhou na secretaria do MST assim que chegou, na virada de 1997 para 1998. Foi a partir da tarefa de fortalecer as articulações administrativas e políticas da luta no campo, sempre em contato direto com Zé Rainha, que anos depois pôde participar da escolha do local para fundação da sonhada escola nacional Florestan Fernandes.
O companheirismo e a afinidade política com Zé Rainha foi aumentando na medida em que já não havia o mesmo espaço para organizar novas ocupações e mobilizações para destravar a Reforma Agrária, principalmente a partir de 2006. As duas lideranças, conhecidas por pertencer ao “MST da base”, eram responsáveis por dezenas de ocupações na região do Pontal do Paranapanema naquela época. Assim estabeleceram diálogo com outras regiões que já se organizavam de maneira autônoma também, começando por ocupações na região de Brasília.
Quando os dois decidiram deixar a organização partidária, nem por um momento pensaram sobre seguir ou não a luta pelo direito à terra. Zé Rainha seguiu resistindo à perseguição política e Claudemir também, só que desde então em Araçatuba. Em janeiro de 2009 chegou à ocupação Chico Mendes, montada em 2004. Em poucas semanas de mobilização e enfrentamento à burocracia, inclusive dentro do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), conquistou junto às famílias a regularização do assentamento Chico Mendes.
Operação Perseguição aos Lutadores do Campo
Os homens e mulheres do “MST da base” continuaram intensificando as ocupações nos anos seguintes. Em 2011, já somavam cerca de 80 acampamentos em São Paulo, sendo 22 apenas na região de Araçatuba. Zé Rainha e Claudemir foram surpreendidos então com os mandados de prisão da Polícia Federal, desdobramento da Operação Desfalques. Depois de terem seu sigilo telefônico quebrado sem razão, num processo com diversas ilegalidades (saiba mais sobre os argumentos da defesa das lideranças da FNL aqui), foram presos com outras seis pessoas, por nove meses. Neste período, Claudemir e Zé Rainha resistiram 75 dias em isolamento completo, sem acesso à luz do sol. Com o passar dos dias, conseguiram se comunicar discretamente, cada um em uma cela.
Desde então, em liberdade e sobretudo em estado permanente de resistência, Claudemir e Zé Rainha, junto a outras lideranças nacionais da FNL, seguem ousando tentar provar sua inocência para a Justiça. Em outubro, estarão na marcha que o movimento realizará em São Paulo, lutando pela reforma agrária brasileira.
Claudemir Novais, hoje historiador formado na PUC, com três filhos e uma companheira alagoana, continua morando em Araçatuba. Sabe bem que a condenação de 4 anos e 10 meses de prisão que o acompanha é consequência da luta social pelo direito à terra, ao trabalho, à moradia e à liberdade. Claudemir sabe também que o número de assentamentos fundados, o número de famílias que através da luta conquistaram seu próprio sustento, e o tanto de terras sem função social que ainda existem, não são apenas números maiores, mas motivos maiores para continuar marchando.