Prefácio ao livro ‘História crítica do Banco Mundial’
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Prefácio ao livro ‘História crítica do Banco Mundial’

De Éric Toussaint (Editora Movimento, 2021).

Michael Löwy 8 set 2021, 18:02

Atenção, este livro é importante! É uma obra de salubridade pública… O autor, Éric Toussaint, fundador e porta-voz internacional do Comitê para a Abolição da Dívida Ilegítima (também conhecido como o Comitê para a Abolição da Dívida do Terceiro Mundo – CADTM), investiga as atividades do Banco Mundial (BM) desde a sua criação. Sua obra é, portanto, fruto de anos de pesquisa, e se baseia principalmente nas quinze mil páginas de documentos produzidos pelo próprio BM. Trata- se de um trabalho ao mesmo tempo científico, concreto, preciso, amplamente documentado, e inspirado a partir de um ponto de vista crítico, claramente anticapitalista.

Ao longo de suas páginas, Éric Toussaint desmascara as mentiras do BM e desmistifica esta sinistra e poderosíssima instituição, mostrando, com amplas provas, que sua atuação está a serviço de um único objetivo: a maximização dos lucros das grandes empresas capitalistas, em particular dos Estados Unidos. Em última análise, o BM é um instrumento de dominação mundial do imperialismo americano, que tem nomeado, desde suas origens, todos os principais dirigentes da instituição.

Um dos aspectos mais infames da longa história do BM é o seu apoio sistemático a todas as ditaduras, desde os fascistas Franco e Salazar ao general Al Sissi do Egito, à junta militar brasileira, Pinochet, Mobutu, e tantos outros. Em troca, suspendeu qualquer ajuda ao Chile de Allende, ou à Nicarágua da Frente Sandinista.

Utilizando o mecanismo da dívida, o BM impõe, aos países do Sul em particular, as clássicas medidas neoliberais do Consenso de Washington que agravam e aprofundam as desigualdades sociais: privatizações, cortes no orçamento dos serviços públicos, redução dos impostos da oligarquia, etc. É uma estratégia francamente necropolítica, responsável, entre outras, pela morte anual de 2,5 milhões de crianças por desnutrição em escala mundial.

Trata-se igualmente de uma política ecocida, que subvenciona massivamente as energias fósseis (carvão, petróleo, gás), contribuindo assim diretamente à catastrófica mudança climática. Lawrence Summers, economista-chefe do Banco Mundial, declarava em 1991 que tentar impor limites ao crescimento por causa dos limites naturais é um “erro”, ou melhor, uma “estupidez”, “puramente demagógica”. Nos últimos anos, o discurso do BM ficou bem mais “verde”, mas a prática de apoio aos interesses fósseis do capital continuou como antes.

Os teólogos da libertação da América Latina caracterizaram este tipo de política como uma forma de religião perversa: a idolatria do mercado, do capital, da dívida externa, do lucro. O Banco Mundial é um destes ídolos mortíferos que exigem sacrifícios humanos, como Baal na antiguidade. Ou como Mammon, o ídolo do dinheiro, o mais próximo, em seu espírito, do BM… Marx também utilizava imagens semelhantes: em seu discurso inaugural para a Primeira Internacional, em outubro de 1864, ele compara o Capital com o antigo ídolo Moloch, que exigia sacrifícios de crianças. E no primeiro volume de O Capital, ele compara o trabalho infantil nas fábricas da Inglaterra, com o culto da divindade hinduísta Juggernaut: as vítimas do sacrifício eram jogadas debaixo das gigantescas e pesadas rodas que transportavam o ídolo.

Poucos são os governos do Sul, mesmo de esquerda, que tentaram resistir ao Banco Mundial: foi o caso, por um curto período, do Equador de Rafael Correa, assim como a Venezuela de Hugo Chávez, que tentou criar o Banco do Sul. A maioria dos governos do Sul está a serviço das classes dominantes locais, que se alinham aos preceitos do Consenso de Washington.

 O Banco Mundial, como o FMI, não são reformáveis. Novas instituições são necessárias, inspiradas por uma lógica internacionalista, em ruptura com o capitalismo. Éric Toussaint é um socialista revolucionário, mas ele aponta para medidas imediatas, que poderiam ser tomadas já: uma auditoria da dívida, levando à anulação de sua parte ilegítima; um imposto de crise sobre os mais ricos; a redução radical da jornada de trabalho para acabar com o desemprego; o aumento das despesas com saúde e educação; a socialização dos bancos, das empresas farmacêuticas e do setor da energia.

Livros como este de Éric Toussaint são indispensáveis: eles constituem preciosas armas no combate à ideologia dominante, preciosas ferramentas para entender e para transformar o mundo.


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