Postular o PSOL como alternativa, isso não é antipetismo.

Postular o PSOL como alternativa, isso não é antipetismo.

Uma resposta ao texto de Paulo Pasin e o diálogo que queremos com a Resistência.

Estevan Campos 28 abr 2022, 10:33

A Resistência (tendência interna do PSOL) publicou texto de Paulo Pasin [1] no qual o autor, respondendo a um texto de nosso dirigente, Roberto Robaina [2], “acusa” nossa organização de se orientar por um “antipetismo visceral”. Nesse texto, o autor tem um objetivo claramente diversionista, pois tenta resgatar debates do passado para evitar o debate que é central hoje no PSOL, sobre a política que o Partido levará adiante no processo eleitoral em SP. Para tanto, recorre ao péssimo método da falsificação das posições do MES, beirando a calúnia contra nossa organização.

O diversionismo não é nossa prática, portanto queremos não só apontar os problemas de método no texto do camarada, mas também debater o conteúdo de sua elaboração e, o mais importante, colocar no centro do debate o que de fato é central para o PSOL no momento.

SOBRE O DIVERSIONISMO E AS FALSIFICAÇÕES, UM PÉSSIMO MÉTODO ENTRE SOCIALISTAS

Recentemente, a Resistência publicou um texto de “debate” com nossa organização em que qualificava como “destrutivo e desleal” o método de “falsificar posições” e a utilização de “instrumentos desleais, diversionistas e nocivos ao debate de diferenças” [3]. Lendo o texto de Paulo Pasin, o melhor conceito para definir essas acusações é o que a Psicologia define como “projeção”, um mecanismo de defesa do sujeito (nesse caso coletivo, a organização), através do qual seus atributos indesejados são atribuídos a outros.

Em seu texto, Pasin falsifica uma série de posições do MES, de forma a tentar fundamentar seu argumento de que o que orienta nossa política é um “antipetismo visceral”.

Primeiramente, falsifica nossas posições em relação ao golpe parlamentar de 2016, ao afirmar que o MES teria defendido a palavra de ordem “Fora todos”, ou afirmando que Luciana Genro defendeu a renúncia de Dilma, quando na verdade nossa posição à época foi a defesa de “Eleições Gerais já”, além de termos tido uma posição clara contra o impeachment de Dilma. Quem defendeu o “Fora Todos” na época, foi o PSTU, partido que era então integrado pelos militantes que hoje constroem a Resistência. Não vamos ser levianos de imputar aos camaradas da Resistência essa posição, ainda que a tenham defendido publicamente, pois é sabido que essa diferença esteve no centro de sua ruptura com o antigo partido.

Em segundo lugar, se não falsifica, distorce nossos posicionamentos sobre a Federação com a Rede. No trecho em que Pasin cita o texto de Robaina, onde afirmamos que a “Federação ser com a Rede também influenciará positivamente na disputa sobre a relação da bancada do PSOL com o provável próximo governo”, Pasin recorta o texto no trecho em que apontamos de maneira transparente com quais figuras da Rede esperamos ter esse tipo de unidade, Joênia Wapichana e Heloísa Helena (citadas em todos os textos que publicamos sobre a Federação) e, toma a liberdade de completar nossa afirmação, incluindo Marina Silva, representante da ala mais à direita da Rede (caracterização que também consta em nossos textos). Uma clara distorção de nossa posição.

Pasin, em uma tentativa de criar desavenças entre as organizações que defendem uma candidatura do PSOL para a presidência em 2022, questiona “o que seria do PSOL se o MES fosse maioria em 2016?”. Ora, de imediato, podemos afirmar que o PSOL não teria uma posição subordinada, buscaria, através da defesa da palavra de ordem de “Eleições Gerais” a construção de uma linha independente do PSOL, contra o impeachment, mas que apostasse no povo, e não nas negociações com Eduardo Cunha e o Congresso Nacional, como fez a direção do PT, à qual o PSOL se subordinou no período. O exercício contrafactual pode ser interessante, mas não resolve os problemas do presente. Poderíamos também perguntar: e se a esquerda tivesse apostado na luta por eleições gerais ao invés das negociatas com Cunha, centrão e afins? O que sairia de uma eleição antecipada em 2016? Bolsonaro seria presidente?

Mas, bem, não vamos nos ater a esses pontos. Vamos debater o conteúdo do texto de Pasin e, apesar de suas falsificações, tentar avançar no conteúdo do debate em curso no PSOL. 

PETISMO E ANTIPETISMO SÃO AS ÚNICAS POSIÇÕES EXISTENTES?

A tese central do texto de Pasin é de que o MES orienta sua política pelo “antipetismo visceral”. O que chama a atenção é o adjetivo buscado por Pasin para tentar desqualificar as posições do MES: o “antipetismo”. Vale, ainda que brevemente, resgatar a história de nossos posicionamentos, para tentar entender o que Pasin compreende como “antipetismo”.

O PSOL surgiu e foi fundado no período em que o PT governou o Brasil. Levou adiante um governo que caracterizamos como “social-liberal”, manteve a política econômica dos governos tucanos, não tocou nos privilégios da elite econômica (financeira, industrial, agrária), e sua política “social” foi nos marcos defendidos pelo Banco Mundial, das políticas “focalizadas”. No governo, levou adiante um modelo de desenvolvimento completamente extrativista, oposto ao que defende a perspectiva ecossocialista do PSOL, lembremos Belo Monte, Jirau e Santo Antônio, transposição do Rio São Francisco, etc. Levou adiante “reformas” neoliberais, como a da Previdência. Do ponto de vista de classe, foi um governo burguês. Portanto, a definição do PSOL de ser oposição de esquerda aos governos petistas, estava correta. Não sei se é a isso que se refere Pasin ao definir nossas posições como “antipetistas”.

Talvez o autor se refira à defesa da operação Lava Jato. Esse tema também foi objeto de grande debate entre nossas organizações. Aqui, também não podemos aceitar falsificações. Defendemos a operação por termos uma posição de que o Partido deve também empalmar com a luta contra a corrupção. Ao mesmo tempo, denunciamos os excessos da Lava Jato, como a escuta ilegal da então Presidenta Dilma, ou a condução coercitiva do ex-presidente Lula, bem como denunciamos sua prisão ilegal e seu caráter político (pois visava retirá-lo do processo eleitoral). Agora, reconhecer que a operação foi instrumentalizada para direcionar toda a indignação contra o PT, não pode significar ignorar parte do que ela revelou, como as relações espúrias das grandes empreiteiras com o governo. Mas vamos adiante.

Fizemos oposição aos governos petistas e faremos novamente, caso Lula seja eleito, pois sabemos da natureza do programa do PT. Agora, caberia uma “acusação” de antipetismo se o MES se recusasse a toda e qualquer unidade com o PT, o que simplesmente não é verdade.

Por exemplo, no Rio Grande do Sul, onde o MES é a direção do PSOL, mais especificamente em Porto Alegre, o PSOL (dirigido pelo MES) levou adiante sob o governo Marchezan, e mantém sob o governo Melo, um bloco de oposição em conjunto com o PT na Câmara Municipal. Aliás, não só mantemos um bloco de oposição comum, como esse bloco já foi liderado por Roberto Robaina, acusado por Pasin de antipetismo. Será novamente ele o líder do bloco de oposição (com o PT) a partir de 2023. Mas não só na atividade parlamentar sabemos fazer unidade com o PT. Também nos movimentos contra Bolsonaro, no que houve de mais próximo de uma Frente Única, como o “Tsunami da Educação”, o “Ele Não”, ou os atos “Fora, Bolsonaro”, também estivemos atuando em unidade com o PT.

Agora, de fato, o MES tem uma postura diferente, mesmo na atuação unitária: não subordinamos nossa atuação à direção petista. Exemplo disso foi o pedido de impeachment feito pelas nossas parlamentares, ainda em 2020. Diferente da postura da direção majoritária do PSOL (e que parece reproduzida pela Resistência), não ficamos aguardando pelo PT para levar adiante o pedido de impeachment ou para defender a palavra de ordem de “Fora, Bolsonaro”. Aliás, o PT foi o último partido de oposição a Bolsonaro a assinar algum pedido de impeachment. Até mesmo a Rede, tão criticada por Pasin, o fez antes da direção petista.

Já definimos em diversos textos quais são as tarefas que entendemos ser prioritárias para o período: ampla unidade para derrotar Bolsonaro e, junto a isso, a construção do PSOL como alternativa. E talvez aqui, é que resida nossa diferença.

A unidade de ação e mesmo uma unidade eleitoral, não significa o apagamento das diferenças entre os projetos. O PT, como dito acima, leva adiante uma política que na essência é burguesa (pois de sustentação do regime burguês). Não é o nosso projeto. É nossa tarefa apresentar essas diferenças e não as esconder. Do que podemos ler das mais diversas publicações da Resistência, essa organização tem tido imensas dificuldades em fazer essa combinação (básica para os socialistas) entre construir a unidade quando necessário sem deixar de se diferenciar.

E aqui não se trata, necessariamente, de sua posição em apoio à chapa Lula-Alckmin já no primeiro turno (ainda que tenhamos uma posição diferente nesse tema). Mesmo essa posição que julgamos equivocada poderia ser defendida mantendo a diferenciação, e não “pintando” um possível governo Lula-Alckmin como algo que ele não é. Essa dificuldade da diferenciação com o petismo por parte da Resistência fica evidente quando comparamos seu texto [4] sobre a Conferência Eleitoral do PSOL, com o da Insurgência [5], que compõe o mesmo bloco interno que a Resistência (PSOL Semente) e tem a mesma posição quanto à tática eleitoral. É possível fazer unidade e se postular como alternativa, apontando as diferenças entre nossa estratégia e a do PT.

O que o texto de Pasin faz parecer, considerando nossas posições (e não a falsificação das mesmas), é que o autor incorporou a lógica petista que afirma que qualquer posição crítica aos governos petistas é “antipetismo”, ou, como o PT sempre falou sobre o PSOL, “esquerda que a direita gosta”, que “faz o jogo da direita”, e outras desqualificações impulsionadas pelo PT ao longo de seus anos no governo federal para atacar nosso Partido. Uma lógica que Pasin parece reproduzir.

E SOBRE O PRESENTE, O QUE PASIN E A RESISTÊNCIA TEM A DIZER?

Como dito logo no início deste texto, o objetivo do texto de Pasin é claramente diversionista. Se esforça para colocar debates que, na prática, nada dizem sobre o presente e o futuro do PSOL. A questão que fica é: qual o motivo da manobra diversionista?

Os companheiros defenderão neste dia 30, na Conferência Eleitoral do PSOL, o apoio à chapa Lula-Alckmin já no primeiro turno. Temos diferença quanto a esse posicionamento (já amplamente debatido desde o Congresso partidário de 2021). Embora consideremos um erro essa política, dado que as eleições tem dois turnos e ao que tudo indica, Lula estará no segundo turno, Bolsonaro apresenta um risco real de mudança de regime, caso conquiste um segundo mandato. Esse fator faz a hipótese de apoio a Lula ser uma possibilidade a ser considerada.

Já em São Paulo, debate que até aqui a Resistência tem evitado, a realidade é completamente diferente. Em SP, o PSDB governa há quase 30 anos, tendo como governador por três vezes o agora vice de Lula, Geraldo Alckmin. A retirada da candidatura de Boulos abriu um debate no PSOL sobre a possibilidade de apoio a Haddad no primeiro turno. Do ponto de vista do campo “PSOL Popular”, o apoio serve à estratégia particular de Boulos de se tornar prefeito da capital paulista em 2024, com apoio do PT. Esperam que o “gesto” da retirada da candidatura ao governo seja retribuído pelo PT daqui a dois anos.

O PT, como é sabido, já conta com o apoio dos partidos que compõe sua Federação (PCdoB e PV) e do Solidariedade, de Paulinho da Força (aquele mesmo do impeachment). Espera contar ainda com o apoio do PSB, de Marcio França e Geraldo Alckmin, para “derrotar o tucanato” (SIC). Bom, essas contradições de composição são as contradições do PT. O problema do PSOL é o que nós faremos diante dessas movimentações.

Até o momento, a posição da Resistência tem sido de uma transposição mecânica da linha que defenderam nacionalmente “Lula sim, Alckmin não” (que já é problemática, pois o problema da candidatura de Lula não é Alckmin, mas seu programa) para o estado de São Paulo, com “Haddad sim, França não”. Como dito acima, não há paralelo entre a situação estadual e a nacional, o risco aqui em SP não é o bolsonarismo, mas a continuidade do PSDB à frente do governo. Falar em derrotar o projeto tucano com o apoio e aliança com aquele que, entre os tucanos, mais tempo esteve à frente do governo, soa como piada. É zombar da classe trabalhadora paulista, especialmente do funcionalismo público, tão atacado por Alckmin e os tucanos.

Mas por qual motivo a Resistência evita a todo o custo esse debate?  

Nas palavras da própria Resistência, “polemizar a sério com as posições políticas de outra corrente socialista do PSOL ou de colocar ideias à prova, […] é sempre saudável e bem-vindo”. Para fazer um debate sério sobre nossas posições políticas, elas têm, primeiramente, que se tornarem públicas. O que até agora, neste tema da tática eleitoral para SP, a Resistência não fez.

Ao não publicizar sua posição a Resistência interdita o debate, não contribui em nada para o avanço da consciência e das elaborações. Mesmo sem o posicionamento dos camaradas, penso ser importante colocar três questionamentos, espero sinceramente que os camaradas não os considerem como provocação:

– se no cenário estadual não há o risco Bolsonaro, qual o motivo de considerarem a possibilidade do apoio a Haddad já no primeiro turno?

– qual a diferença qualitativa entre PSB e Solidariedade para que a exigência dos companheiros ao PT seja só “França não”?

– existem diferenças de princípios entre os camaradas e o “PSOL Popular”, quanto à não composição em governos de conciliação de classe. Mesmo sabendo que o momento em que essa diferença não poderá ser mais adiada se aproxima, os companheiros irão condicionar sua posição sobre SP pela manutenção de um bloco que não tem acordo em um tema tão importante, de princípio?

Por fim, temos duas batalhas fundamentais para o futuro do PSOL, nas quais esperamos contar com os companheiros da Resistência. A primeira, ao que tudo indica, já temos acordo: que a Conferência Eleitoral vote contra a participação do PSOL em um eventual governo Lula-Alckmin. A segunda batalha, é essa sobre a tática eleitoral estadual, sobre a qual os companheiros ainda não se posicionaram. A definição do PSOL SP depende exclusivamente do posicionamento dos camaradas da Resistência, o Partido ter candidatura ao governo será fundamental para apresentarmos nosso programa, especialmente em um cenário em que não tenhamos candidatura à presidência, essa definição, fundamental, hoje só depende do posicionamento dos camaradas. A insistência do MES em debater o tema com os camaradas, não é à toa.

[1] https://esquerdaonline.com.br/2022/04/25/o-mes-psol-e-explicito-no-seu-antipetismo-visceral/

[2] https://movimentorevista.com.br/2022/04/uma-leitura-da-situacao-nacional-e-a-necessidade-de-um-partido-independente/

[3] https://esquerdaonline.com.br/2022/04/15/a-proposito-dos-delirios-fracionalistas-do-mes/

[4] https://esquerdaonline.com.br/2022/04/21/eleger-lula-para-derrotar-bolsonaro-apesar-de-alckmin/

[5] https://www.insurgencia.org/blog/frente-a-conferencia-eleitoral-do-psol-a-posicao-da-insurgencia


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