A importância da imprensa socialista
Jornal Página 50 n. 1 (agosto de 2007).

A importância da imprensa socialista

Um novo tempo na Movimento

Leandro Fontes 27 jun 2022, 19:51

Não é segredo para ninguém que a imprensa “oficial” no Brasil e no mundo está a serviço do capitalismo. Portanto, a imprensa dominada pela burguesia não é um ente neutro no que corresponde a disputa do poder do Estado, do regime e dos governos. Pelo contrário, no caso brasileiro (mas, não só), os meios de comunicação se materializaram como o quarto poder da república e empresas como a Folha de S. Paulo e, principalmente, o Grupo Globo intervém sem nenhum rodeio na disputa política do país. Por isso, conforme desenvolvi no artigo O Grupo Globo é um partido político? | Revista Movimento (movimentorevista.com.br), não é nenhum exagero classificar a empresa da família Marinho como um poderoso partido político (sem registro legal) da direita brasileira. Assim sendo, este conglomerado de comunicação com característica monopolista, sustentáculo da ditadura militar, que se aproxima de 100 anos de existência, defende abertamente todos os dias um modelo de capitalismo (hora mais reacionário, hora mais liberal) em seus periódicos, telejornais, novelas, programas de entretenimento e em suas mídias. Ora, não é por menos, a empresa construída ao redor de um jornal não é uma manifestação isenta no espaço e, sim, uma engrenagem robusta e sofisticada para gerar lucro para uma família que possui negócios capitalistas. Ou seja, a mídia é a ferramenta que fabrica o “consenso” da opinião pública para que os burgueses sigam lucrando e os proletários sigam gerando riquezas para os burgueses. De tal forma, atacar os interesses do Grupo Globo e de seus parceiros é chave no caminho da emancipação do povo brasileiro.

Acontece que, lamentavelmente, figuras públicas, parlamentares e aspirante a parlamentares, que se reivindicam da “esquerda”, de modo ingênuo ou oportunista (mais oportunista que ingênuo) buscam acriticamente se relacionar, sob o guarda-chuva de pautas parciais e/ou obscurantistas, com as entranhas da mídia corporativa com objetivo de alcançar projeção e catapultar suas carreiras. Logo, esse tipo de representante da “esquerda” coloca combustível na locomotiva que está na contramão da inadiável ruptura com a alienante fabrica do senso comum manufaturado.

Portanto, essa é uma peleja mais do que centenária para aqueles que reivindicam as ideias socialistas, tendo a luta de classes como bússola. E ela não falha. De tal maneira, não causa espanto a denúncia aguda de Astrojildo Pereira na unanimidade da imprensa brasileira de “ofício” em condenar a revolução russa de 1917 e taxar Lênin como um agente conspirador do governo alemão. Para tanto, incoerência e imbecilidade era pouco para classificar as matérias sobre os acontecimentos na Rússia. A verdade, nua e crua, se remete a imparcialidade abjeta da imprensa burguesa no tocante as consequências da palavra de ordem bolchevique: “todo poder aos sovietes”. Quer dizer, todo poder a maioria, aos operários, camponeses e soldados. Pela primeira vez na história os expropriadores foram expropriados e esse fator foi considerado intolerável para as classes dominantes no mundo e, por consequência, para os mercadores da informação. Por isso, foi dever da classe trabalhadora organizada e de intelectuais comprometidos com o povo, como Lima Barreto em seus artigos condensados no livro Bagatelas, defender o triunfo da revolução socialista de outubro no Brasil.

Fenômeno similar é descrito por Marx na crítica contundente a cobertura da imprensa inglesa a guerra civil nos Estados Unidos (um dos celeiros de algodão para as gigantescas indústrias da Inglaterra), onde sobravam insultos aos estados livres do Norte e relativismo aos escravistas do Sul, sob a narrativa que a guerra era apenas uma disputa tarifária. Claro, a imprensa inglesa empresarial estava do lado do Sul porque este favorecia os interesses dos capitalistas industriais de seu país. Quer dizer, o que determina é o interesse de classe. Talvez por essa razão Marx afirmou que “a primeira liberdade da imprensa consiste que ela não seja um ofício” (A liberdade de imprensa, L & PM Editores, 1980). Pode-se ler essa afirmação da seguinte forma: em nome da carreira numa redação pode pesar a mão em benefício da posição do proprietário e dos parceiros econômicos do jornal. Não estou dizendo que Marx disse exatamente isto, porém é possível concluir um conjunto de variantes em sua crítica.

O fundamental, no que compete a liberdade de imprensa (sem negar os profissionais do jornalismo), é que numa sociedade dividida em classes, todas as classes e frações de classes possam ter o direito de expor suas posições publicamente. Assim sendo, é tão necessário a organização independente dos trabalhadores, com seu próprio programa. Mas, não só. É preciso que a esquerda socialista tenha capacidade de expressar suas ideias e com elas organizar sujeitos dispostos a defendê-las. De tal maneira, a comunicação com a vanguarda e as massas é decisiva nessa batalha ininterrupta na disputa da consciência do povo e contra as ideias hegemônicas da burguesia. Por isso, Lênin no “Que Fazer?” destacava o papel determinante do jornal do partido combinado com a construção de fortes organismos políticos locais. Isto é, ao redor do jornal, o povo se organiza coletivamente para ação. Nahuel Moreno em “Problemas de Organização” irá reforçar essa proposta afirmando que o jornal é a grande ferramenta para a construção do partido e o canal que dá unidade da política partidária para a ação nacional e nas estruturas de base (fábricas, sindicatos, universidades, escolas, bairros, etc).

Lênin e Moreno, cada qual em seu tempo e espaço, estavam certos na defesa do jornal como uma ferramenta de organização partidária para a ação comum militante. E deve-se agregar que o jornal, assim como as revistas de conteúdo marxista, igualmente é um instrumento de propaganda socialista que exige um salto de quadros partidários para sua produção em conteúdo, distribuição e financiamento. Não é por nada que a adesão de colaboradores e lista de leitores é tão decisiva para a manutenção e longevidade dessa ferramenta estratégica.

Mas, é preciso parar a roda para uma indagação: “o modelo de jornal (ou revista) impresso caiu em desuso no tempo presente?” Não exatamente, porém é um fato que o avanço tecnológico impôs novas ferramentas que precisam ser utilizadas com objetivo de fortalecer e difundir ainda mais a imprensa operária e socialista. Isto é, as plataformas digitas não minimizam e nem agigantam sozinhas a propaganda e a orientação partidária contida no jornal ou revista. Logo, o que determina o alcance do conteúdo do jornal ou revista socialista é a capacidade de direção e o comprometimento militante da organização para esse fim. De tal maneira, se O Globo, a Folha, o Estadão, utilizam as redes sociais, sites, contas no youtube e plataformas de assinaturas virtuais, os socialistas (nas suas possibilidades) devem competir na mesma raia. Logicamente, sem renunciar aos materiais impressos. Entretanto, ainda estaremos longe de uma comunicação direta com as massas que possa competir com o JN e as novelas globais, até porque não possuímos canais de televisão e estações de rádio em âmbito nacional, tema de Estado que só é resolvido em outra situação social e política. No entanto, enquanto as condições de “paridade de armas” não se concretizam, é preciso apostar nas ferramentas disponíveis para seguir a luta política e ideológica.

Nesse sentido, há 20 anos surgiu a Revista Movimento com objetivo de ser veículo e ferramenta para auxiliar no processo de reagrupamento das forças de esquerda, anticapitalista e marxistas revolucionárias, além de aportar no debate de ideias e na disputa ideológica no Brasil. O MES, corrente interna do PSOL e da IV Internacional, organização que nessas duas décadas constrói a Movimento, tem a satisfação de comunicar que a nossa Revista passa a ter um novo formato a partir do segundo semestre. Agora a Revista Movimento será mensal e estará disponível virtualmente em todo território nacional para assinantes. Essa nova fase da Revista se insere na necessidade do fortalecimento da propaganda socialista na disputa aberta com o neofascismo bolsonarista e a esquerda social-liberal, que atuam como meros gerentes dos negócios capitalistas. Esperamos que a Revista Movimento, nesse novo formato, seja uma ferramenta útil e dinâmica para centena de milhares de militantes e ativistas que buscam emancipar o Brasil e mundo.


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Pedro Micussi