Depois da eleição, seguir a luta no Brasil pós-Bolsonaro
Após engajar-se pela derrota de Bolsonaro na eleição, o PSOL deve manter-se independente e atuar na sociedade, com os movimentos sociais, de trabalhadores e da juventude pelo enfrentamento à extrema-direita, com liberdade de crítica e ação.
A vitória de Lula foi um triunfo democrático de todo povo brasileiro. Nas semanas seguintes ao triunfo eleitoral, novos desafios apresentam-se para o PSOL e para construir uma agenda política capaz de responder às demandas do povo e para derrotar nas ruas o bolsonarismo.
Há alguns dias, a Executiva Nacional do MES publicou um documento analisando a eleição e os desafios a seguir. Neste editorial, voltamos nossa atenção às questões mais candentes da atual situação, sobretudo no que diz respeito à localização de nossa ferramenta política, o Partido Socialismo e Liberdade. Há igualmente uma boa notícia dos últimos dias: a derrota da tentativa do trumpismo de controlar as duas casas legislativas na eleição de meio período nos Estados Unidos, debilitando ainda mais o genocida que conta os dias para sair do Palácio do Planalto.
A transição em curso
Após a reafirmação, por diferentes setores, da legitimidade da eleição, iniciaram-se os debates da transição, reduzindo os questionamentos ao pleito a setores mais isolados e radicais do bolsonarismo. Ciro Nogueira e Arthur Lira prontamente entraram em campo para negociar as primeiras medidas, cargos e tempos com os membros da transição coordenados por Geraldo Alckmin.
O novo governo apontou como prioridade a votação de uma proposta de emenda à Constituição para retirar do teto de gastos os pagamentos do Bolsa Família de 600 reais mensais, sem previsão no orçamento enviado por Bolsonaro, além de 150 reais por criança de 6 anos. Com isso, Lula pretende garantir o cumprimento de sua principal promessa de campanha, além de abrir de imediato algum espaço para a recomposição de áreas fundamentais totalmente depauperadas por Paulo Guedes.
Trata-se, no entanto, de uma medida apenas emergencial para garantir que o governo possa estabelecer-se, cuja aprovação terá alto custo político: como já sinaliza Lira, em troca da aprovação da PEC, ele pretende fortalecer sua reeleição à presidência e garantir as principais posições de comando da Câmara para os partidos reacionários do centrão que governaram com Bolsonaro, além de impor algum compromisso com o novo governo pela manutenção do orçamento secreto, denunciado por Lula durante a campanha.
Ao mesmo tempo, a divulgação dos nomes da transição revela os impasses que se apresentam na coalizão lulista. Não por acaso, a grande imprensa, os porta-vozes e operadores do mercado pressionam por um comando claramente neoliberal na economia e por mais consolidação fiscal, exigindo que Lula mantenha a política fiscal de Temer e Bolsonaro e rejeite as demandas da sociedade que se apresentaram na eleição. Lula e o PT tentam manobrar no interior desse jogo de pressões, buscando manter e ampliar a frente eleitoral heterogênea que se montou contra Bolsonaro para garantir maioria congressual. Ao mesmo tempo, seguem enormes as expectativas geradas em amplos setores sociais pela campanha lulista.
A extrema-direita bolsonarista atua
A extrema-direita bolsonarista, por sua vez, manteve-se em ação após a derrota no segundo turno: trata-se de uma base radicalizada com posições delirantes, financiada por empresários bolsonaristas, que organizou, com a conivência de chefias da PRF, trancamento de estradas e, em seguida, acampamentos na frente de quartéis de todo o país pedindo explicitamente um golpe militar para impedir a posse de Lula e manter o derrotado Bolsonaro na presidência.
Apesar de isolados, não se pode descartar a hipótese de que franjas radicalizadas do bolsonarismo tentem realizar alguma ação para emular o “Capitólio” trumpista até a posse de Lula. Além disso, o recrudescimento do discurso fascista dos grupos acampados e sua agitação direta sobre os militares deve servir de alerta para a mobilização e o enfrentamento contundentes ao bolsonarismo.
O PSOL deve ser independente e lutar pela punição de Bolsonaro
É nesse contexto que ocorre a discussão sobre a localização do PSOL no novo governo. A última reunião da Executiva Nacional do partido foi convocada às pressas pela direção. Após uma discussão polarizada e com votação apertada de 10 a 9, o partido deliberou pela participação na transição, com indicação de nomes para compô-la.
Após engajar-se pela derrota de Bolsonaro na eleição, o PSOL deve manter-se independente e atuar na sociedade, com os movimentos sociais, de trabalhadores e da juventude, pelo enfrentamento à extrema-direita, com liberdade de crítica e ação. Desse modo, será possível exigir, contra as pressões e chantagens da burguesia e do centrão, o cumprimento dos compromissos de campanha de Lula, como o fim do teto de gastos, a revisão da reforma trabalhista, a anulação dos decretos de sigilo de 100 anos de Bolsonaro, entre outros, além de acompanhar as reivindicações das lutas que seguirão num país conflagrado, empobrecido e em crise.
Ao mesmo tempo, o partido não deve ceder a arranjos com os partidos reacionários do centrão bolsonarista. É papel do PSOL seguir a luta pela reparação às vítimas da pandemia, pela investigação e punição de todos os crimes de Bolsonaro e de seu governo. Exigimos justiça para Genivaldo Santos, queremos saber quem foram os mandantes do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, lutaremos pela desocupação das terras indígenas e quilombolas invadidas e destruídas por grileiros, pelo garimpo e pela extração de madeira ilegais, não aceitaremos que o fascismo siga implantando-se na sociedade e promovendo sua agitação pelo golpismo e pelo massacre da esquerda, das organizações de trabalhadores, de mulheres, negras, negros e LGBTs. Eis aí o melhor lugar que o PSOL pode ocupar a partir de 1º de janeiro de 2023.