Indulto de Bolsonaro mira extinção de penas de PMs condenados por Massacre no Carandiru
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Indulto de Bolsonaro mira extinção de penas de PMs condenados por Massacre no Carandiru

Decreto anistia policiais por crimes não hediondos cometidos há 30 anos. Homicídio só entrou nesse rol dois anos após o assassinato de 111 presos na Casa de Detenção

Tatiana Py Dutra 23 dez 2022, 15:25

Em um dos últimos gestos de seu governo, o presidente Jair Bolsonaro (PL) assinou o decreto para indulto de Natal. A determinação, publicada nesta sexta-feira (23) no Diário Oficial da União, perdoa penas de agentes de forças de segurança condenados por crimes culposos cometidos há mais de 30 anos. Os policiais militares (PMs) acusados pelas mortes de 111 presos no Massacre do Carandiru, se enquadram nesse perfil. Aliás, ao que tudo indica, o indulto foi feito para beneficiá-los.

“Busca-se conceder indulto, ademais, aos agentes públicos que integram, ou integravam há época do fato, os órgãos de segurança pública de que trata o art. 144 da Constituição e que, no exercício da sua função ou em decorrência dela, tenham sido condenados, ainda que provisoriamente, por fato praticado há mais de trinta anos, contados da data de publicação deste Decreto, e não considerado hediondo no momento de sua prática”, diz trecho do indulto.

Ao todo, 74 policiais militares foram a júri popular pelo assassinato coletivo de detentos durante uma rebelião no Pavilhão 9 do Complexo do Carandiru, ocorrido em 2 de outubro de 1992. A defesa dos PMs alegou que eles atiraram em legítima defesa e que 34 presos teriam sido mortos pelos companheiros de cela. Para o Ministério Público, porém, os policiais executaram detentos que já estavam rendidos. Nenhum dos 22 agentes feridos na ação morreu. 

Entre os condenados nos cinco júris populares realizados entre 2013 e 2014, 69 seguem vivos. Apesar de terem recebido penas de 48 anos a 624 anos de detenção, ninguém foi preso. Agora, a condenação em si pode ser extinta. Isso porque o indulto de Natal não contempla culpados por crimes hediondos, como homicídio. Porém, esse crime só foi tornado hediondo pela legislação brasileira em 1994, dois anos após o massacre.

“Parece ser um indulto encomendado para beneficiar os PMs condenados pelo Massacre do Carandiru e também para contemplar os agentes das forças armadas que participaram das operações pela lei e pela ordem no Rio de Janeiro e em outros estados nos últimos anos e que cometeram crimes contra civis”, disse o advogado Ariel de Castro Alves, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais.

A anistia para agentes de segurança contraria sugestão do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão técnico ligado ao Ministério da Justiça responsável pelo parecer que embasa o decreto do indulto. Porém, após avaliação da Casa Civil, quem dá a palavra final sobre o conteúdo do texto é o presidente da República, que também concedeu o perdão a oficiais das Forças Armadas condenados por crime de excesso durante operações Garantia da Lei e da Ordem (GLO). 

Liberdade questionada

Advogados ou defensores públicos dos presos que se encaixam nas regras do indulto precisam buscar a Justiça para solicitar a libertação dos condenados – o que pode ocorrer até o fim de janeiro. No entanto, organizações de direitos humanos de São Paulo se organizam para protestar contra o decreto, que seria inconstitucional por beneficiar a um grupo específico. A decisão pode vir a ser questionada pela Procuradoria Geral de Justiça, para posterior revogação em  instâncias superiores, como o Supremo Tribunal Federal (STF). 

A cooptação, radicalização e, neste caso, perdão de militares e agentes de segurança acaba por ser mais uma marca da gestão Bolsonaro que desde 2019 permite a libertação de condenados desses grupos. Amigo do presidente, o deputado federal Daniel Silveira  também recebeu a impunidade como prêmio de tão influente benfeitor.

E não seria a primeira tentativa de libertar os condenados pelo massacre: em agosto passado, a Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados aprovou um projeto que anistia o grupo, proposto pelo deputado Capitão Augusto (PL-SP). O projeto deve ser votado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa antes de seguir para o plenário.

Em geral, indultos presidenciais costumam beneficiar pessoas acometidas de doenças graves ou de deficiências físicas que tornem penoso o cumprimento da sentença em estabelecimento prisional.


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