É preciso lutar contra o rentismo encastelado no Banco Central
Marcos Corrêa/PR, CC

É preciso lutar contra o rentismo encastelado no Banco Central

É preciso exigir a imediata queda dos juros e a derrubada da lei da “autonomia” do Bacen, que legaliza o sequestro da instituição pelo rentismo.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 15 fev 2023, 18:30

Nas últimas semanas, ganhou corpo um debate a respeito do papel do Banco Central e de seu presidente, Roberto Campos Neto, após a decisão recente de manter a taxa básica de juros (Selic) em 13,75% (a maior taxa de juros real do mundo) e a publicação de um comunicado da instituição, em tom de chantagem, prometendo a manutenção de patamares elevados de juros por conta dos “riscos fiscais”. Na sequência, Lula passou a defender publicamente a diminuição da taxa de juros e a criticar a “autonomia” do Bacen, aprovada em 2021.

Não faltaram comentários de “analistas” de corretoras, bancos e da imprensa pró-mercado em defesa das posições do presidente do Bacen e da “autonomia” da instituição, sob risco de crise, além de manifestações de insatisfação de rentistas. Tomar parte nessa batalha política não serve apenas para discutir o tema em específico, mas aproveitar as brechas e contradições do governo e as expectativas que setores de massa depositam nele para propor uma guerra contra o rentismo no Brasil, a fração mais parasitária e poderosa dos capitalistas.

Quem é Roberto Campos Neto? E quem deu a tal “autonomia” para o Banco Central?

Roberto Campos Neto, como diz o nome, tem como avô Roberto Campos, famoso entreguista, ministro do Planejamento e político da ditadura militar. Campos Neto assumiu a presidência do Bacen em 2019, após indicação de seu amigo pessoal Paulo Guedes, e, em 2021, com a aprovação da lei da “autonomia” do Bacen, ganhou mandato fixo de 4 anos. Apesar de se apregoar o caráter “técnico” dos diretores e presidente do Bacen “autônomo”, são conhecidos os mecanismos de “porta-giratória” pelos quais funcionários de bancos e corretoras circulam entre o Bacen e instituições privadas.

Se há décadas o Banco Central foi capturado pelos interesses do capital financeiro, com a “autonomia” foi legalizada a separação entre a instituição e a soberania popular. Trata-se de uma autonomia do governo eleito e da sociedade, para gerar total integração aos lobbys financeiros, garantindo seus interesses. Essa é a razão pela qual o presidente eleito é Lula, mas quem indicou o atual chefe do Bacen foi Bolsonaro, candidato derrotado nas eleições de outubro. Por sinal, Campos Neto atendeu ao pedido de Bolsonaro a seus eleitores e se fez fotografar indo votar com camiseta da seleção brasileira de futebol, além de permanecer, como flagrado pela imprensa, em grupo de whatsapp de “ministros de Bolsonaro”.

É evidente que Campos Neto não é um “técnico” neutro, como se isso fosse possível numa posição como a que ele ocupa. Por sinal, no primeiro governo Lula, com a nomeação de Henrique Meirelles, então presidente mundial do Bank Boston, houve um exemplo de como, mesmo antes da “autonomia”, os banqueiros e rentistas sempre comandaram a política monetária brasileira, o que aliás foi uma das razões para a fundação do PSOL em 2004.

A luta pela imediata redução dos juros e um programa para enfrentar o capital financeiro

O conflito aberto por Lula contra Campos Neto abriu uma ótima oportunidade para lançar luz sobre o papel nefasto do Banco Central, que sequestra a política econômica do país para a manutenção dos ganhos, únicos no mundo, do rentismo. Não por acaso, mesmo um economista que participou da elaboração do Plano Real e do governo FHC, como André Lara Resende, tem se manifestado de forma contundente para denunciar as ações do Bacen e seus efeitos no aumento do serviço da dívida, na redução do crescimento econômico e no aumento do desemprego.

Por tudo isso, é preciso exigir a imediata queda dos juros e a derrubada da lei da “autonomia” do Bacen, que legaliza o sequestro da instituição pelo rentismo. Ao mesmo tempo, há uma oportunidade para esgarçar o conflito político em curso, a única forma de realmente combater a desigualdade: no debate sobre a reforma tributária, é hora de exigir a taxação de grandes fortunas, heranças, lucros e dividendos, a isenção do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil, como prometido por Lula na campanha eleitoral, e a desoneração do consumo popular. Também é preciso exigir uma política permanente de aumento do salário mínimo, das aposentadorias e dos benefícios do Bolsa Família.

Todos os movimentos sociais, sindicatos, parlamentares combativos e a esquerda radical devem tomar parte dessa luta contra o rentismo e por um programa de emergência. Bons exemplos são as manifestações de sindicatos de bancários nos últimos dias e a iniciativa da deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), junto com Maria Lúcia Fatorelli e a Auditoria Cidadã da Dívida, de propor a criação de uma Frente Parlamentar sobre o Limite dos Juros e a Auditoria Integral da Dívida Pública com Participação Popular.


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