Conselho de Ética da Câmara instaura processo contra deputadas do PT e do PSOL
Iniciativa do PL pode retirar mandato de seis mulheres democraticamente eleitas, vítimas de violência política de gênero
Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, que costuma ser bastante moroso na análise de denúncias contra parlamentares bolsonaristas, acolheu ontem (14) processos disciplinares contra as deputadas Célia Xakriabá (PSOL-MG), Sâmia Bomfim (PSOL-SP), Talíria Petrone (PSOL-RJ), Erika Kokay (PT-DF), Fernanda Melchionna (PSOL-RS) e Juliana Cardoso (PT-SP).
As representações foram apresentadas pelo PL, que as acusa de quebrar o decoro parlamentar durante a aprovação do projeto do marco temporal de terras indígenas, no fim de maio. Na ocasião, as parlamentares protestaram contra o texto, que limita a demarcação de terras indígenas àquelas já tradicionalmente ocupadas por esses povos em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
Segundo o PL, as deputadas gritaram ao microfone para os deputados favoráveis ao texto: “Assassinos! Assassinos do nosso povo indígena!”. Apesar de os microfones terem sido cortados, o partido de Jair Bolsonaro afirma que as deputadas ofenderam parlamentares da oposição, em especial Zé Trovão (PL-SC), autor do requerimento de urgência para a votação do marco temporal. Segundo a sigla, as deputadas ainda teriam usado as redes sociais para “manchar a honra de diversos deputados”.
Inicialmente o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, apresentou uma representação conjunta contra as seis deputadas, o que vai contra o regimento da Casa. Por isso, o requerimento foi retirado em 2 de junho e reapresentado de forma individualizada à Mesa Diretora da Câmara.
Misoginia
O acolhimento das ações pelo Conselho de Ética já era esperado pelas deputadas, dada a disposição do presidente da Câmara, Arthur Lira, em pautar o tema. Ainda assim, elas e outros parlamentares protestaram durante a reunião, portando cartazes com os dizeres “Não vão nos calar”, “Não vão nos intimidar” e “Basta de machismo”.
Em suas falas, parlamentares questionaram a rapidez do andamento do processos ante a tantos que aguardam o aceite da Mesa Diretora. O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), por exemplo, disse ter protocolado, em fevereiro,representações contra parlamentares que se manifestaram em favor dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro nas redes sociais. As representações seguem “na gaveta”. Ele pediu isonomia no tratamento dos casos e denunciou a perseguição política, com uma “eiva de machismo”, contra as parlamentares de esquerda.
Sâmia Bomfim afirmou que as representações foram aceitas em tempo recorde. “Foram quatro horas entre o protocolo e chegar aqui na pauta do Conselho de Ética. Isso nunca tinha acontecido na história do Congresso Nacional”, apontou.
Ela acrescentou que diariamente as parlamentares são ofendidas, sofrem violência política e até são ameaçadas de morte e, mesmo assim, não há punição no conselho. Na visão dela, a extrema direita se incomoda com o empoderamento feminino e tenta intimidar as parlamentares.
Para Célia Xakriabá, não há democracia com o silenciamento de mulheres eleitas democraticamente.
“Parlamentar significa direito de falar. Por que não posso falar de genocídio, de etnocídio legislado?”, questionou.
“Não houve nenhuma indignação dos deputados quando no microfone de aparte me chamaram de imbecil. Isso está registrado nos vídeos. Ou quando outros deputados falam com parlamentares chamando-as de abortistas ou vagabundas, mesmo não estando com microfone aberto”, afirmou Juliana Cardoso.
Violência política
Pela legislação, é considerada violência política contra as mulheres toda ação, conduta ou omissão com a finalidade de impedir, obstaculizar ou restringir os direitos políticos delas.
“É violência política de gênero sim, é violência contra os povos indígenas, é transformar o conselho em instrumento daqueles que acham que podem calar a voz das mulheres no Parlamento, eliminar o outro porque pensa de forma diferente”, reiterou a deputada Erika Kokay (PT-DF) Conforme ela, as deputadas não podem ser processadas por expor o que pensam.
Com informações da Agência Câmara de Notícias