Bolsonaro inelegível! E agora?
O julgamento do TSE sobre os crimes eleitorais do ex-presidente é um passo importante na luta contra a extrema direita
Foto: Palácio do Planalto
Por cinco votos a dois, o TSE julgou o ex-presidente Jair Bolsonaro como inelegível. Imputado por conta de tais e tais questões, o genocida está legalmente impedido de participar de eleições até 2030.
Essa decisão foi muito positiva. Deve ser comemorada com fôlego, indica uma vitória, porém deve ser trabalhada com cuidado. Em dois aspectos: por um lado, entender o significado dessa inelegibilidade para os setores da direita dura que orbitam em torno de Bolsonaro; por outro, para animar e seguir a luta pela condenação e prisão de Bolsonaro.
Sem dúvidas, é junto ao 8 de janeiro e sua derrota, o mais importante acontecimento do ano para a disputa geral política do país. Bolsonaro é, ao lado de Lula, um dos maiores atores políticos, perdendo a eleição por pouquíssimos votos. Ainda chefia – por força e/ou inércia – a oposição de direita, que é golpista, tem peso e busca retornar ao Planalto para executar seu plano de mudança de regime. Busca um modelo mais autoritário e fechado para, por meio da violência política, passar a “boiada”, ou seja, destruir as conquistas, limitadas, dos últimos 40 anos.
O nome dele fora da urna reorganiza o conjunto das peças desse tabuleiro. Quem vai alentar a esperança de chegar à presidência do país? A oposição de direita tem duas estratégias, que ora se apresentam separadas, ora em comum. Por um lado, acumular forças para vencer a eleição de 2026, com algum nome forte para tanto. De outra parte, reforçar a pressão golpista, aproveitando brechas, disputas de opinião, redes e ruas, para galvanizar a insatisfação social. Se tomarmos o modelo dos Estados Unidos, Trump, mesmo acossado, luta para chegar à urna, como promessa de “revanche” contra Biden. De Santis é uma ameaça presente, com as contradições que vão se acelerar nos próximos meses.
No Brasil, Bolsonaro sai do jogo bem cedo. É difícil a perspectiva de voltar ao cenário em curto prazo. O mais provável é, de imediato, abrir-se uma disputa interna para ver quem herdará a centralidade no palco da extrema direita. Se cogitam três figuras por agora que, de sua parte, representam três setores, três hipóteses que devem ser testadas pela extrema direita.
São três nomes aventados, todos ainda incipientes, com a certeza de que novos pretendentes devem ser apontados em breve. Um é Romeu Zema, governador de Minas Gerais, que expressa a linha de modernização bolsonarista, colocando no tema da eficácia seu ativo mais importante, minimizando questões retóricas; na contenda, cogita-se Tarcisio, neófito governador de São Paulo que vai testar a aplicação de seu programa nos próximos dois anos e sua capacidade de articulação política com órfãos do tucanato e outros agentes políticos de peso; por fim, numa via de renovação por dentro do clã, Michelle Bolsonaro, que congregaria setores mais ideológicos, além da estrutura partidária do PL mesmo.
A outra ponta da estratégia da extrema direita é visibilizada pelo agrobolsonarismo. Pressiona o governo para que faça concessões, como Lula fez no Plano Safra, e atua para criminalizar e cercar a luta do campo. O núcleo duro da conspiração golpista hoje é esse setor, que acumula vitórias e força material.
Esse cenário localiza a disputa de 2024, antecipando o debate eleitoral nas grandes cidades, envolvendo todo um leque de “articuladores” que começam a organizar as chapas para concorrer – alguns apostando na ideia de que 24 pode ser uma antessala para 2026. Isso é parcialmente verdade.
O lulismo deve apostar numa linha de composição com setores mais ao centro, não bolsonaristas, como Ducci, em Curitiba; Paes, no Rio de Janeiro ou até Fuad, em Belo Horizonte. O próprio centro estará num impasse entre o derretimento, a aliança com o bolsonarismo, como Nunes em São Paulo, ou voltar-se para o lulismo.
Da parte do PSOL, é preciso insistir na tarefa de desbolsonarizar o ambiente político, sem que isso signifique concessões aos que defendem a retirada de direitos. Isso significa equilibrar a dialética de supor movimentos unitários e democráticos com a afirmação de independência e compromissos programáticos nítidos com a maioria social.
Porém, a mudança que representa a inelegibilidade de Bolsonaro não será medida apenas nas urnas e nas articulações eleitorais. O significado dessa medida ainda está por vir.
Se representar apenas sua proscrição eleitoral até 2030, será a tentativa de um pacto que tem tal medida como ponto de chegada, definitivo. Isso será insuficiente e apenas irá inflamar a grita pela injustiça por parte da turba da extrema direita; a esquerda que apoiar essa limitação, refém do Judiciário e do argumento da relação de forças, vai endossar um caminho de derrotas.
Da nossa parte, a condenação de Bolsonaro tem que servir como ponto de apoio para multiplicar esforços para ganhar a maioria da sociedade brasileira, a começar pelos seus setores mais organizados, a classe trabalhadora e a juventude, para necessidade de julgar e punir, levando Bolsonaro e seus cúmplices para a prisão.
Os que protagonizaram 8 de janeiro não podem ter qualquer anistia. E existe uma ampla base social e eleitoral que está disposta a levar adiante essas tarefas, a despeito de certas direções políticas que vão buscar pactos para “virar a página”.
Como estamos afirmando em diversos artigos e teses: há uma luta prolongada contra a extrema direita no Brasil e no mundo. A proscrição de Bolsonaro é um capítulo importante e vitorioso, mas sobretudo inicial, dessa luta no Brasil.