Câmara de Porto Alegre terá duas CPIs para apurar mau uso de verbas na Educação
Apurações preliminares apontam gastos de mais de R$ 100 milhões em materiais que nunca foram entregues para às escolas e irregularidades nas aquisições
Foto: Fernando Antunes/CMPA
O presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, vereador Hamilton Sossmeier (PTB), decidiu acatar dois pedidos de abertura de comissão parlamentar de inquérito (CPI) para apurar possíveis irregularidades na Secretaria Municipal da Educação (Smed). Uma solicitação foi encaminhada por partidos da base do governo do prefeito Sebastião Melo e a outra, pela oposição.
O líder do governo, Idenir Cecchim (MDB), pediu uma CPI para apurar supostas alterações na aquisição de telas interativas e materiais didáticos, na tentativa de barrar a frente da oposição e garantir a presidência do colegiado. De autoria de Mari Pimentel (Novo), o requerimento da oposição apresenta 12 motivos para a investigação, como supostas realizações de obras em determinadas escolas, aquisição, sem licitação, de kits pedagógicos para robótica e diferentes equipamentos que acabaram encalhados em escolas e depósitos alugados pela prefeitura, além de contratação irregular de empresas.
“São mais de R$ 100 milhões com suspeita de utilização indevida, com desperdício já evidente, inclusive com possibilidade de corrupção. Nós temos investigado e denunciado esse tema e agora, com a comissão parlamentar de inquérito, poderemos fazer um trabalho mais profundo e mais eficaz. Nós vamos seguir trabalhando para investigar esse problema que nós temos na Educação de Porto Alegre, nesta gestão do governo Melo”, comentou o presidente do PSOL na cidade, vereador Roberto Robaina.
Uma série de denúncias sobre irregularidades nas compras da Smed tomou corpo no início de junho e, pouco mais de um mês depois, a prefeitura decidiu afastar a secretária municipal da Educação, Sônia da Rosa, que estava no cargo desde março de 2022. Na carta em que pediu sua exoneração, ela diz que o afastamento será importante para “a apuração transparente da destinação dos materiais e equipamentos tecnológicos adquiridos”.
‘Carona’ na licitação
Diretores de escola e docentes apontam problemas na entrega dos materiais, além de carência de capacitação para aproveitamento dos recursos. Além disso, alegaram que muitas vezes houve descompasso entre os livros adquiridos pela secretaria e a proposta pedagógica das escolas.
Entre maio e junho do ano passado, por exemplo, as 98 escolas da rede municipal foram surpreendidas com a chegada de 40 caixas de livros com títulos que iam de clássicos de Machado de Assis a quadrinhos de Calvin & Haroldo. Os cerca de 2,3 mil exemplares – que custaram R$ 9,3 milhões – não integravam títulos de autores gaúchos ou relacionados com a realidade local.
Pudera. A compra não foi feita com licitação, mas por meio de adesão à ata de registro de preço – que, em outras palavras, permite “pegar carona” em outras licitações, inclusive de outros Estados. Tal pregão, no qual Porto Alegre pediu carona para uma concorrência aberta em Sergipe, previa a exigência de pelo menos três orçamentos diferentes para ser escolhido o de menor preço, mas apenas uma empresa se apresentava como fornecedora. Trata-se da Inca Tecnologia, de Curitiba (PR), que está sob investigação do Tribunal de Contas da União (TCU) por vendas superfaturadas para o governo do Amazonas e por irregularidades em outro negócio no Estado do Sergipe.
O Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul e o Ministério Público Estadual também apuram se houve desperdício de dinheiro público nas compras da prefeitura de Porto Alegre. Motivos para investigar não faltam.