‘Mulheres negras em marcha por reparação e bem viver’
Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha é um convite à reflexão. E à ação
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Em 25 de julho de 1992, centenas de mulheres se reuniram no 1º Encontro de Mulheres Negras Latino-Americanas e Caribenhas, em Santo Domingo, na República Dominicana. O impacto social do evento e de sua ambiciosa proposta de denunciar o racismo, o machismo e a violência enfrentadas por elas fez com que a ONU reconhecesse a data como Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.
É uma data para reflexão e ação. Hoje, mais de 450 atividades – como rodas de conversa e caminhadas – estão sendo realizadas em pelo menos 20 estados brasileiros. “Mulheres negras em marcha por reparação e bem viver” é o lema das ações – e temas para discussão não faltam. Porque, apesar de ser um país de maioria negra, o Brasil é extremamente racista, e a negritude feminina é a parcela da população que mais sofre com a desigualdade.
Alguns dados
Apesar de serem mais escolarizadas que os homens, as mulheres negras ganham menos. Pesquisa da Fundação Seade, ligada ao governo de São Paulo, revelou em março que a média salarial delas é de R$ 13,86 por hora, enquanto a de um homem não negro é de R$ 27,15. Elas também sofrem mais com o desemprego: no terceiro trimestre de 2022, 14,2% das mulheres negras estavam desempregadas no Estado. Entre os homens não brancos, a taxa era de 5,8%.
As negras também são maioria entre as vítimas de violência física. A quarta edição da pesquisa “Visível e Invisível: A Vitimização de Mulheres no Brasil” revelou que 45% das mulheres negras afirmam que já sofreram alguma violência ou agressão ao longo da vida, número que cai para 36,9% entre brancas. Desse grupo, 6,3% afirmam que já foram vítimas de espancamento e 6,2% já sofreram ameaças com faca ou arma de fogo – contra 3,6% e 3,8% relatados por mulheres brancas. Conforme a Anistia Internacional, as negras são 62% das vítimas de feminicídio no país.
Para Juliana Brandão, pesquisadora sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, esses dados são evidências das formas que o racismo estrutural se materializa na vida das mulheres negras.
“O que chama atenção é que essas mulheres têm mecanismos que estão disponíveis, mas que não estão acessíveis. Além de massacradas por essa violência, elas estão sendo completamente silenciadas de qualquer maneira de sair desse ciclo, que acaba se naturalizando”, diz.
Direitos negados
A proporção de negras que tiveram negado o acesso negado a recursos básicos – como assistência médica, comida ou dinheiro por algum companheiro ou ex-companheiro – é de 10,9%, também maior do que entre mulheres brancas (7,1%).
Essa parcela da população ainda é subrepresentada na política. Nas últimas eleições, nove mulheres negras foram eleitas para o Congresso Nacional. Elas representam 18% da bancada feminina, que tem 94 cadeiras. São cinco representantes a menos em relação ao pleito anterior. A ausência de mulheres negras nos espaços de poder também são expressão da violência, da interdição e do silenciamento que a nossa sociedade impõe.
Por isso, mais do que nunca, o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha é uma data para refletir sobre nossas mazelas e cobrar dos agentes públicos melhores condições de sobrevivência e subsistência.
Tereza de Benguela
Em 25 de julho também é celebrado o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra, que tem o propósito de dar visibilidade ao papel da mulher negra na nossa história por meio da figura da líder do Quilombo Quariterê, no Mato Grosso, no século 18. Por 20 anos, ela combateu o governo escravista e coordenou as atividades econômicas e políticas da comunidade.
A história de “Rainha Tereza” é a materialização de uma sociedade mais igualitária, e cobra de nós mais atitude no combate ao racismo, ao machismo e a violência contra as mulheres negras.
Viva as mulheres negras. Viva Tereza de Benguela!