A Argentina não merece o fascismo
A professora Bárbara Leite analisa as próximas eleições argentinas diretamente do país vizinho
Se aproxima no próximo domingo (19/11) um déjà vu do que já vivemos no Brasil sobre a possibilidade de ver entrando pela porta eleitoral um governante fascista no país dos hermanos. Com ideias completamente conservadoras, retrógradas, permeadas por violências, Milei vem prometendo a mudança com uma entonação de novidade e prosperidade, baseadas na privatização da vida e Estado mínimo.
Mas sabemos que de novidade, isso nada tem. As tentativas da mercadologização de tudo, favorece exatamente quem tudo já tem: os donos dos meios de produção. À classe trabalhadora que vem enfrentando cotidianamente a luta pela sobrevivência segue e seguirá enfrentando dificuldades para trocar seu trabalho por pão e arte.
Nessa panaceia de livre concorrência, as grandes empresas vão disputar para acumular enquanto o povo será jogado de escanteio, sem consideração e humanidade.
Recentemente observei um grupo de amigos em uma conversa na universidade falando sobre o Brasil, comparavam sobre o que há em nosso país que não tem na Argentina e vice e versa. E pensei que a relação entre os países realmente são de hermanos, porque tem comparação, competição, disputa, inveja e brigas, mas tem muita troca potente também e principalmente, ninguém mexe e ninguém toca.
E é um pouco nesse sentimento de que não desejamos que nossos hermanos passem pelo que passamos, que dizemos: a Argentina não merece Milei. Tivemos a experiência com Bolsonaro e esse ser que prometia ser o Messias, Salvador, no final trouxe muita desgraça para o Brasil.
Mas o que, por exemplo? Perguntam… e os exemplos vêm aos montes: começaram a acontecer ataques contra as escolas, um sentimento de ódio foi instaurado em nosso povo, a inflação nos supermercados aumentou consideravelmente, comer carne virou, no governo Bolsonaro, um artigo de luxo.
O negacionismo da pandemia assassinou mais de seiscentos mil brasileiros, o povo indígena e quilombola rasgou em sangue e terror. A democracia se viu fragilizada, nosso povo se polarizou. Ou seja, tristemente, a política do “tudo pelo mercado e pelo crescimento” levou ao genocídio de parte importante do nosso povo e isso não tem mais volta.
É um momento difícil, de crise. Nós já passamos por isso e sabemos o preço que foi, é e seguirá sendo o fascismo ter entrado nas instituições brasileiras. Isso fará sempre parte da nossa história e dói, não tem mais volta.
É complexo ver o sofrimento do que pode vir a ser a dor no subjetivo e no objetivo também, a ameaça às universidades, a saúde pública, os cortes para os aposentados, o fim do subsídio ao transporte público, a regressão das pautas feministas e o negacionismo de sua histórica ditadura.
Domingo a Argentina enfrentará uma das eleições mais importantes de sua história e difícil também. Difícil porque se sabe que os argentinos estão cansados, desconfiam desse mesmo lugar e desejam uma mudança para tentarem sair da crise desesperadora que assola o país, que não permite um planejamento individual e coletivo que seja previsível do ponto de vista do orçamento e da moeda.
Mas Milei não é a saída, o fascimo não é solução para absolutamente nada. Não queremos o que o Brasil viveu na pele para nossos hermanos. Afinal, a generosidade desse povo, a cultura, a arte e a potência que carregam no corpo e no peito merecem seguir em marcha na construção de sua liberdade, no fortalecimento democrático, de um futuro que seja realmente de mudança e diferente do nosso.
Não desejamos o que vivemos porque hoje, infelizmente, nossa história já está marcada pelo fascismo, e isso poluiu de ódio e dor as terras brasileiras, sem nenhuma solução milagrosa do mercado que pudesse nos salvar e justificar de tamanha ignorância.
1Por Bárbara Leite Pereira: mãe, trabalhadora, doutoranda da UFRJ e da Universidad de Quilmes.