O governo Lula, a Faria Lima e o Centrão debatem a meta fiscal: fiscalismo e frustração popular
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O governo Lula, a Faria Lima e o Centrão debatem a meta fiscal: fiscalismo e frustração popular

É preciso insistir na denúncia da orientação fiscalista do governo e de seus efeitos para as políticas sociais.

Israel Dutra 7 nov 2023, 19:49

Enquanto o mundo assiste ao massacre na Palestina, o debate político na imprensa nacional aponta para um suposto desencontro de declarações no governo, acerca da meta fiscal. A imprensa liberal faz coro com a linha de austeridade a qualquer custo. Utilizando uma declaração de Lula, em entrevista coletiva, que afirmava não ter certeza de qual seria a meta fiscal para 2024 e da linha do déficit zero sustentada pelo Ministério da Fazenda, os principais economistas liberais clamaram pelos compromissos assumidos por Haddad quando da aprovação do Novo Arcabouço Fiscal (NAF). 

Por trás dessa discussão está o modelo econômico adotado pelo governo. Para além das opções ideológicas e retóricas, a rota escolhida por Haddad e sua equipe é inequívoca: ajuste fiscalista, na trilha do NAF, e a reforma tributária aprovada na Câmara, que terá graves consequências, sobretudo para área da saúde. Precisamos inverter a lógica da agenda dos liberais, pautando os direitos sociais, os serviços públicos e a defesa do orçamento voltados para áreas essenciais. Não há outra saída fora da luta política ao redor dessa agenda. A experiência que se está fazendo em São Paulo – onde o enfrentamento à privatização da Sabesp, com importante participação do PSOL, coloca em xeque os planos neoliberais do bolsonarista Tarcísio de Freitas – é um ponto de apoio para a luta mais geral. 

O debate sobre a meta fiscal: aonde vamos? 

Para sair do “economês” e entender o que está em jogo, resumimos alguns conceitos, retomando o debate que já fizemos quando nos posicionamos contra o NAF. A nova nomenclatura que foi adotada trata o NAF como novo “Regime Fiscal Sustentável” (RFS). Tomamos, para isso, uma citação de trabalho de David Decacche e Alves Jr: 

“O novo regime fiscal (RFS), antes batizado de NAF, substituiu a desmoralizada lei do Teto de Gastos, impondo um teto móvel, mas baixo, para as despesas primárias federais. A prioridade é a mesma, de nítido corte neoliberal: de início estabilizar e depois reduzir a relação dívida pública bruta/PIB através do controle de gasto público. A redução da relação dívida pública/PIB através do controle de gasto público resulta em outra finalidade neoliberal mais geral: a redução do gasto público em economia. Conforme reconhecido em publicação do corpo técnico do FMI, regras de gasto semelhante provocam necessariamente a redução do peso da despesa pública no PIB”. 

A contradição, portanto, é bem mais simples e cruel. Com a notícia de que a arrecadação foi menor do que o previsto, a meta fiscal de déficit zero em 2024 ficou quase inviável. Lula vocalizou apenas essa ideia, apoiado nas preocupações de Rui Costa e dos setores do governo que querem garantir o novo PAC como carro-chefe do governo, além de recursos necessários para seguir satisfazendo a sanha de negociatas em emendas e privilégios por parte do centrão e Lira. O que vem pela frente, contudo, é a manutenção do ajuste e da orientação fiscalista, já votada no orçamento, no trágico “jabuti” de Zeca Dirceu, que vai legitimar o não cumprimento constitucional do piso do investimento em saúde. O da educação segue ameaçado, mas é regido por outros mecanismos compensatórios. Isso sem falar da oferta de reajuste ao funcionalismo, indigna; e a preparação da reforma administrativa que enseja novas “maldades” com o conjunto do funcionalismo público brasileiro. 

A estratégia de conciliação de classes organiza as derrotas da classe

Tanto a estratégia econômica como a estratégia política do governo atendem à orientação da conciliação de classes, ou seja, justificando com as alianças com setores da burguesia, do centro e da direita, os limites da ação do governo, diante da expectativa que a maioria do povo depositou novamente em Lula, para bloquear o pesadelo Bolsonaro. 

Na “frente política”, o governo não utiliza sua localização na ONU para ter uma postura mais decidida que poderia colocar o cessar-fogo na ordem do dia, após as votações desmoralizadas da Assembleia Geral, tomando como exemplo as posições de Bolívia, Chile, África do Sul, Jordânia, Turquia e Colômbia – países que não tem uma definição político-ideológica comum quanto a sua diplomacia. 

Ainda no âmbito político, o governo se recusa a utilizar a mobilização ao redor da palavra-de-ordem “sem anistia” para aproveitar a desorganização dos golpistas após o 8 de janeiroe acelerar a prisão, proscrição e desmoralização do bolsonarismo e de seus agentes. A expressão na “frente econômica” dessa estratégia é aceitar os pressupostos neoliberais, com o fiscalismo a gosto da Faria Lima, da equipe econômica e de Haddad, a despeito dos próprios desencontros do governo.

A esquerda, a independência do governo e a necessidade de um plano de lutas 

Diante do anúncio de que o governo seguirá esperando as “previsões de receitas” para definir se manterá a estratégia de “déficit zero”, é preciso insistir na denúncia dessa orientação fiscalista e de seus efeitos para as políticas sociais, como a redução do piso de investimento da saúde e, possivelmente, da educação. É preciso apostar na agenda de luta pelo cumprimento do piso da enfermagem, uma conquista fundamental ameaçada por Haddad.

Ao mesmo tempo em que seguimos a luta contra a política fiscalista do governo e as privatizações nos estados. 

O ato público, que contou com 26 categorias e cerca de 25 mil pessoas em BH, contra o plano de Zema foi um sinal importante. A luta em São Paulo contra as privatizações ganhou novo impulso com a crise de fornecimento de energia elétrica, onde a ENEL, responsável privada, deu um verdadeiro show de incompetência, com vários bairros paulistas ficando por 4 dias sem luz. Ficou escancarado que o projeto privatista representa prejuízos para a maioria do povo. A luta vai esquentar, com uma batalha na ALESP e um plano de lutas ao redor da greve unificada do dia 28 de novembro.

É fundamental fortalecer a luta em favor do povo palestino, pelo cessar-fogo em Gaza e o fim do genocídio. Exigir que o governo brasileiro rompa relações com o Estado de Israel. 

O PSOL, suas figuras públicas e dirigentes tem a obrigação de estar na luta em defesa do povo palestino: trata-se de uma questão de princípios, de um imperativo estratégico e de um dever moral. Articulado com essa defesa, colocamos a necessidade de impulsionar as lutas, seguindo o exemplo de Minas e SP, apoiando também as entidades da saúde que lutam, na justiça e na opinião pública, para aplicação dos índices constitucionais. 

Por tudo isso, reafirmamos o lugar do MES em conjunto com a ala militante do PSOL em defesa de uma orientação internacionalista, independente e anticapitalista para o partido.


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Pedro Micussi