Reflexão Sobre a Importância dos Estudos dentro do Partido Revolucionário
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Reflexão Sobre a Importância dos Estudos dentro do Partido Revolucionário

Artigo sobre a importância da preparação teórica para a atuação militante

Ruan Debian 10 nov 2023, 09:37

Ruan Debian1

Gigantes pensadores no contexto do marxismo mundial, não por mero acaso imortalizados como clássicos, sempre se engajaram incansavelmente na luta contra a precarização tanto teórica da classe trabalhadora em geral quanto, sobretudo, da organização revolucionária. Marx afirmou que “Nunca a ignorância auxiliou alguém”2, enquanto Trotsky, de maneira semelhante, argumentou que “Expor a verdade da situação aos oprimidos é abrir-lhes o caminho para a revolução”, e Lenin sintetizou bem a prática marxista com a célebre frase “Sem teoria revolucionária, não há movimento revolucionário.”3.

Não foram fraseologias soltas ao vento pronunciadas pelos camaradas supracitados para encantar aqueles que os ouviam. Muito pelo contrário! Quando as proferiram em seus respectivos momentos históricos, todos estavam combatendo tanto as mentiras quanto as ilusões burguesas que poderiam facilmente ser utilizadas para manipular o proletariado.

Para uma melhor compreensão do que desejamos transmitir, estabeleçamos uma conexão com o tempo presente. Algumas organizações, que até se autodenominam socialistas, advogam que o PSOL deve ser a base do governo Lula. Alegam que essa iniciativa não afetaria de maneira alguma a independência partidária. Infelizmente, o raciocínio ilógico não se detém aí; afirmam que, ao mesmo tempo em que apoiam o governo, podem, quando julgarem apropriado, atuar como oposição. Sinceramente, tal conduta não passa de um oportunismo eleitoral disfarçado de tola inocência! Para completar o falseamento narrativo, ainda argumentam que ao estar no governo teriam melhores condições para auxiliar o povo oprimido deste país, e criticam aqueles que propõem alternativas que não se baseiem na conciliação de classes, acusando-os de não compreender o sofrimento do proletariado e de serem sonhadores desconectados da realidade brasileira.

Percebem como, à primeira vista, algumas dessas argumentações podem parecer convincentes? Observem que, sob essa perspectiva, “estar no governo ajudará mais o povo sofredor”, e pensar de forma contrária seria considerado cruel.

Ora, como não existe a possibilidade de lutar pelo povo estando fora do governo? Dentre tantos exemplos, podemos destacar a notável atuação da camarada Sâmia Bomfim na defesa do MST e de todos os movimentos sociais. No que tange à independência partidária, os chamados “missionários” de respostas preestabelecidas convenientemente esquecem que o PSOL surgiu como resposta à expulsão dos radicais do Partido dos Trabalhadores (PT), pois estes se recusaram a apoiar a reforma da previdência dos servidores públicos, um acordo promovido pelo governo Lula na época com as elites econômicas.

Não convém prolongar esta discussão, mas é fundamental ressaltar que a história evidenciou repetidamente que acordos de conciliação de classes, que relativizam os princípios dos partidos revolucionários, resultaram na decadência dessas organizações, transformando-as em partidos da ordem burguesa. Dois exemplos ilustrativos são a Social Democracia na Alemanha, que renega seu passado marxista, e o próprio PT na atualidade.

Respostas simplistas, como mencionada anteriormente, são facilmente exploradas por setores reformistas que, em última instância, buscam a prevalência de seus interesses pessoais, não os interesses de sua classe social.

Como podemos combater essas respostas simplistas? Podemos encontrar uma valiosa lição em um breve diálogo do livro “Alice no País das Maravilhas”, entre a protagonista e o Gato de Cheshire, quando este afirma à Alice que, se ela não sabe para onde está indo, qualquer caminho serve. A lição a ser extraída é que, para nós, revolucionários, qualquer caminho não serve! Nosso destino já fora indicado pela camarada Rosa Luxemburgo, quando afirmou que lutamos “por um mundo em que sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”. Portanto, nossa aspiração, e o motivo de nossa luta, é alcançar o socialismo.

Para atingir nosso objetivo, precisamos do agente da revolução socialista, ou seja, o partido revolucionário. O adjetivo “revolucionário” não é uma mera adjacência, como veremos posteriormente. De forma sucinta, um partido pode ser definido como uma organização associativa com interesses definidos, cujos membros atuam para promover a prevalência desses interesses. Em uma sociedade com divisões de classes, esses interesses estão intrinsecamente ligados à classe que o partido representa.

A luta de classes, que ocorre diariamente, não depende necessariamente da presença de um partido revolucionário, pois é uma consequência intrínseca à dinâmica do capitalismo. Entretanto, isso não significa que o partido revolucionário não tenha importância fundamental. Sua tarefa essencial consiste na organização política que fornecerá os meios para que os trabalhadores atuem de forma cada vez mais consciente na luta de classes, em outras palavras, serve como um meio seguro para a revolução.

Consideramos que uma das principais funções do partido revolucionário, para o desenvolvimento da consciência de classe, é a formação teórica de seus membros. Apesar de ser amplamente reconhecido que apenas os processos de estudo dentro da organização não garantirão, por si só, a formação de militantes revolucionários, estamos totalmente convencidos de que, sem essa formação, o processo educativo comunista não se consolidará (naturalmente, existem exceções, e muitos podem usá-las como justificativa para subestimar a importância da formação teórica, abrindo espaço para um espontaneísmo, talvez, inconsciente).

Portanto, o partido revolucionário precisa criar um ambiente contínuo e sistemático propício para os estudos marxistas embasados em sua ancestralidade revolucionária.

Camaradas, se o partido revolucionário não proporcionar condições para que seus militantes se imerjam na tradição revolucionária através de estudos marxistas sistematizados, onde mais eles terão acesso a isso? Em que espaço os militantes em formação poderão aprender sobre Marx e Engels como estrategistas revolucionários? Como poderão se afirmar como trotskistas se não tiverem acesso crítico ao pensamento de Trotsky? Não há dúvida de que apenas através dos esforços da organização revolucionária em criar um ambiente para isso será possível acessar figuras como Vladimir Lênin, Rosa Luxemburgo, Nahuel Moreno e muitos outros camaradas que contribuíram para a formação de uma organização revolucionária e que não traíram a classe trabalhadora, ao contrário de Stalin.

Reiteramos, se o partido não oferecer esses espaços aos militantes, quem mais o fará?

Enfatizamos nestas linhas finais a importância dos estudos contínuos e sistemáticos não apenas por sua indiscutível relevância, mas também pelo fato de que, em uma situação não revolucionária, eles podem ser desenvolvidos de forma segura e tranquila. Em outras palavras, se estivéssemos enfrentando uma conjuntura revolucionária, não teríamos a capacidade de dedicar um final de semana inteiro à leitura de obras marxistas, uma vez que estaríamos diretamente envolvidos na luta pela ascensão do socialismo. O mesmo ocorreria no extremo oposto, caso vivêssemos uma situação contrarrevolucionária, onde uma ditadura estivesse se consolidando ou já consolidada. Afinal, quem se sentiria tranquilo lendo um livro sabendo que a qualquer momento poderia ser preso, torturado ou morto?

Sem dúvida, a situação não revolucionária em que estamos inseridos é o momento ideal para o partido revolucionário consolidar uma cultura política sistematizada de estudos rigorosos. Dessa forma, estaremos teoricamente equipando nossos membros para que possam intervir de maneira mais eficaz nas diversas lutas sociais atuais. Assim, teremos, conforme as palavras de Florestan Fernandes, mais chances de “transformar a ‘oportunidade histórica’ em história real” (Lenin, 200, p.267).

Referências Bibliográficas:

LENIN, Vladmir. Que Fazer? Problemas candentes do nosso movimento. São Paulo: Expressão Popular, 2015.

NETTO, José Paulo. Karl Marx: Uma Biografia. São Paulo: Boitempo, 2020.

1 Pedagogo, estudante de Ciências Sociais e dirigente estadual do MES-MG.

2 Netto, 2020, p.8

3 Lênin, 2015, p.71


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Pedro Micussi