VIII Conferência do MES: um importante passo adiante
Evento debateu uma nova etapa na organização do Movimento Esquerda Socialista frente aos atuais desafios da realidade brasileira
Realizamos entre 8 e 10 de dezembro, na cidade de São Paulo, nossa VIII Conferência Nacional do Movimento Esquerda Socialista (MES) contando com 73 delegados representando 21 estados, além de observadores, convidados nacionais e internacionais.
Os debates se desenvolveram sobre situação internacional, lutas e meio sindical, PSOL e situação política, mulheres e feminismo, negritude e antirracismo, além do debate de orientação e balanço e da eleição da nova direção. Em todos os pontos esteve presente a complexa situação política nacional após a eleição de Lula, que combinou a necessidade de unidade na resistência contra a extrema direita com a tarefa de independência frente aos ataques neoliberais do atual governo contra a classe trabalhadora.
Contamos com a presença de importantes convidados que hoje estão conosco nesta trincheira, como Heloísa Helena (Rede), João Machado (Rebelião Ecossocialista), os históricos dirigentes quartistas José Correia e Ana Cristina Carvalhaes, assim como Everton Vieira e Guilherme Prado, dirigentes do Fortalecer o PSOL, além de quadros do coletivo Ubuntu.
Na delegação internacional, tivemos também uma expressiva representação de juventude e sindicalistas dos EUA através do Bread & Roses/DSA representando as fortes lutas sindicais independentes no coração do imperialismo, assim como do MAS panamenho compartilhando a recente e vitoriosa luta popular contra a indústria de mineração neste país. De Porto Rico, a representação da DS/MVC demonstrou a força da esquerda radical na ilha, seguida pelo MSP mexicano e seu exemplo de luta no movimento popular e feminista. Da Venezuela, nosso camarada do LUCHAS pautou não só sua situação nacional, mas a necessidade de um amplo movimento internacional pela educação, e da distante Austrália recebemos um representante da Socialist Alliance que há tempos mantém relações de solidariedade com o MES. Também na delegação internacional recebemos representantes da comunidade palestina que enfrentam o sionismo no Brasil e o Comitê de Solidariedade à Nicarágua, dois espaços com os quais temos estabelecidos laços profundos de solidariedade e militância comum. Foram lidas saudações também do Burô da IV, da direção do NPA francês, de La Aurora (Estado Espanhol), Súmate (Peru), além de duas participações em vídeo, de Eric Toussaint e dos camaradas de Marabunta da Argentina.
Na abertura dos trabalhos, realizamos uma homenagem a dois grandes do movimento trotskista que perdemos esse ano, Esteban Volkov e Hugo Blanco, camaradas com os quais estabelecemos relações próximas, e relembramos também a memória de Diego Bomfim, irmão de nossa companheira Sâmia Bomfim brutalmente assassinado no Rio de Janeiro, homenageando a força de Sâmia e de sua família em seu retorno às lutas.
Organizando nossas tarefas
A ampliação de nossos esforços em propaganda, materializados principalmente na construção da Revista Movimento, foi parte central dos debates ao longo da Conferência. Em todos os debates de nossas frentes de atuação se fez presente a necessidade de avançarmos na formação teórica e na qualidade de nossa propaganda, aprofundando a luta ideológica como parte chave de nossa atuação num momento político transitório, marcado por confusões e capitulações. As assinaturas mensais da Revista, a ampliação do nosso site, redes sociais e demais instrumentos similares são agora responsabilidade central do conjunto de nossa militância.
O ponto internacional foi bastante diverso, apontando a necessidade de seguir discutindo a crise multidimensional, acelerada com os temas do colapso socioambiental crescente, assim como a urgência do ecossocialismo. O apoio à luta palestina teve papel central como principal luta anti-imperialista do mundo hoje, apontando a retomada da luta anticolonial contra o genocídio e limpeza étnica do sionismo de Netanyahu. Levantamos também a questão da Argentina, com os primeiros ataques do ultradireitista Milei e a necessidade da resistência no conjunto da América Latina, assim como a preparação para a COP30 em Belém no ano de 2025 e o Encontro Internacional Contra o Neoliberalismo na Educação, que terá lugar no Rio de Janeiro em 2024.
Na questão sindical, a rica discussão evidenciou as dificuldades atuais do movimento sindical, com alguns setores muito burocratizados e outros cooptados, no qual impera a fragmentação sem um polo coerente, muito por influência do retrocesso tanto da CSP Conlutas como das duas Intersindicais. Votamos a necessidade de reforçar a TLS como ferramenta sindical do MES e a necessidade de impulsionar as maiores lutas em que nos engajamos, como as da educação, do transporte e da saúde. Para isso, é estratégico desenvolver o trabalho de base nos setores em que atuamos com ações de formação e acompanhamento regular permanente.
A nova situação na relação com o PSOL também foi debatida. Com o congresso partidário consolidando uma maioria reformista e as pressões eleitorais apontando para uma maior adaptação, discutimos seguir apostando e disputando o PSOL, mas fortalecendo o MES em diálogo com setores críticos à esquerda no país, para disputar uma alternativa independente e ecossocialista. A adaptação, cujos reflexos oportunistas se podem verificar em diversos níveis tanto no partido como nos movimentos, exige um aprofundamento do debate estratégico em conjunto com todos os setores políticos radicais.
No último dia de Conferência tivemos três pontos centrais de discussão: a questão do feminismo e a luta das mulheres; da negritude e a luta antirracista; do balanço da organização. Na pauta feminista, as companheiras do Juntas! apresentaram os avanços desta frente de luta em meio à complexa situação do movimento de mulheres atuação, afirmando a necessidade de um feminismo popular que se volte às principais tarefas colocadas hoje, relacionadas aos enfrentamentos pelos temas da reprodução social e aos desafios de articulação do movimento feminista hoje. A pauta dos direitos reprodutivos também esteve no centro, afirmando a necessidade de sua defesa mesmo em um cenário conservador, apontando para a criação de novos espaços mais amplos de debate com o conjunto da sociedade.
O debate de negritude foi outro tema central da Conferência, construído pelo acúmulo teórico coletivo que foi materializado pela nova edição da Revista Movimento. Com um mosaico de atuações tanto no movimento antirracista como na própria autoorganização nacional dos negros e negras da organização, demonstrou-se a consolidação de um importante processo de avanço que se constrói de forma unitária e multifacetada ao longo do país, refletindo as experiências das lutas nas periferias das grandes cidades, dos quilombolas e trabalhadores sem terra no campo, dos ribeirinhos e comunidades amazônidas, entre tantos outros exemplos, construindo a identidade de uma luta de maioria, estruturalmente classista, contra os ataques racistas permanentes do capital e as tentativas de cooptação oportunistas.
Unidade na diversidade
Nossa última conferência presencial ocorreu em 2018, na Praia Grande em São Paulo. Fizemos um ato nacional de 20 anos do MES, em 2019; e uma conferência no formato virtual no final de 2021. Houve uma grande ampliação do MES ao longo deste período, construímos novas regionais, frentes e espaços de auto-organização. A maior conquista foi a consolidação das fusões, com agrupamentos políticos que se aproximaram e se incorporaram no MES.
Avaliamos como muito rica a experiência que nos levou a incorporar no MES os seguintes agrupamentos: Coletivo Paulo Romão, Barulho, Anticapitalistas, 1 de Maio, TLS e agora uma série de camaradas de tradição quartista do Espírito Santo, onde a deputada Camila Valadão é uma das principais referentes de toda esquerda.
Hoje temos responsabilidade e presença em diversos movimentos e espaços: temos a presidência do PSOL no RS, RN, DF e TO e a tesouraria no RJ, PR, PB, RO e MS, duas deputadas federais, cinco estaduais, dezenas de vereadores; somos a maior força da juventude do PSOL e a segunda na oposição da UNE e da UBES, com dirigentes em diversos DCE’s centrais.
Com a centralidade da pauta sindical, o desafio de avançar para uma maior organicidade é intenso: hoje temos presença – somos a maior força à esquerda – nos dois maiores sindicatos da educação do país, a APEOESP e o SEPE, além de estarmos localizados com dirigentes no ANDES, Fasubra, e sindicatos ligados a área da Saúde, educação e transporte, sobretudo no Rio Grande do Sul.
A atividade ligada à luta pela terra é uma das maiores novidades no último período. A Conferência discutiu a necessidade de avançar numa maior sintonia nos distintos movimentos onde o MES atua, no movimento agrário e popular, com o MPL, MNT, FNL, MLST, FSRU, entre outros, em diálogo muito harmonioso com o MST, onde no Maranhão, o dirigente Reynaldo do MES, é dirigente do MST e recém-eleito presidente estadual do PSOL.
A partir destes avanços, apostamos numa ação concentrada para intervenção na realidade buscando um novo salto em nosso trabalho de propaganda, enfrentando a batalha das ideias através cada vez mais da Revista Movimento como ferramenta de organização comum, um órgão central para difusão de nossa política, atuando assim para reforçar nossas posições .
Conclusões
O MES está amadurecendo, a conferência expressou a combatividade e entusiasmo que existe a partir da organização e para construir a organização. O nível político e de elaboração apresentado sobre todo no ponto negritude e racismo foi uma ilustração desse acúmulo.
A Coordenação Nacional e a Executiva Nacional foram eleitas ao final, com base na paridade de gênero e uma composição de negras e negros bastante superior aos 30% votados. Foram votadas também uma série de resoluções importantes: adoção da resolução da IV Internacional sobre a questão climática, Ucrânia e Palestina; a carta-programa da TLS sindical; permanência na campanha em defesa da vida dos quilombolas do Maranhão; construir o chamado a uma ampla conferência antifascista, a partir da luta contra a extrema direita, especialmente na Argentina de Milei; participar e construir o encontro contra o neoliberalismo educacional no segundo semestre de 2024 no Rio; e uma intensa preparação para a discussão da esquerda na COP30, em Belém.
Nossa militância terá desafios cada vez maiores frente ao cenário de múltiplas crises que encaramos no horizonte, mas a classe trabalhadora continuará lutando e abrindo brechas de resistência contra o sistema que a explora. Estaremos nas primeiras trincheiras desta luta e nossa conferência foi um importante passo para esta armação. Vamos por mais!