18 anos da Lei Maria da Penha: onde avançamos?
Legislação trouxe mais rigor ao combate à violência contra a mulher, porém registros de agressões e mortes seguem aumentando
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Há exatos 18 anos, entrava em vigor a Lei Maria da Penha, que estabelece diretrizes para o combate à violência contra a mulher – seja ela física, moral, psicológica, sexual ou patrimonial. O nome da legislação remete à biofarmacêutica cearense Maria da Penha Maia Fernandes, alvo de duas tentativas de homicídio pelo marido, em 1983, e se tornou ativista da causa.
A criação da lei foi um marco, uma vez que até então, a violência doméstica e contra a mulher era considerada de menor potencial ofensivo. A impunidade era fator de multiplicação de agressões e mortes, perpetuando imbecilidades como a tese da “legítima defesa da honra” e ditados como “em briga de marido e mulher não se mete a colher”. A ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, avalia que a lei trouxe ganhos para a sociedade brasileira.
“Primeiro, ela tipifica o crime existente: a violência física, a violência psicológica, a violência patrimonial, a violência moral e a violência sexual. E organiza o Estado brasileiro para garantir o atendimento às mulheres”, disse à Agência Brasil.
Para especialistas, uma das principais inovações trazidas pela Lei Maria da Penha são as medidas protetivas para as vítimas de violência doméstica e familiar. Estas medidas incluem o afastamento do agressor do lar ou do local de convivência, o distanciamento da vítima, o monitoramento dos acusados de violência doméstica por meio de tornozeleiras eletrônicas, a suspensão do porte de armas do agressor, entre outras.
A legislação ainda trouxe mecanismos mais rigorosos para combater a violência contra a mulher e previu a criação de equipamentos públicos que assegurem a efetividade da lei, como delegacias especializadas no atendimento à mulher, casas-abrigo, centros de referência multidisciplinares para mulheres e juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher, com competência tanto cível quanto criminal, entre outros.
A violência continua
Ainda que represente um avanço nos direitos humanos das mulheres, a Lei Maria da Penha não tem o condão de evitar que as agressões e mortes sigam acontecendo. Ao contrário: os números crescem. Conforme o último Anuário Brasileiro de Segurança Pública, todos os registros de crimes com vítimas mulheres cresceram em 2023 na comparação com 2022: Só no ano passado, 258.941 mulheres foram agredidas, o que indica alta de 9,8% em relação ao ano anterior. Os casos de ameaça cresceram 16,5%, e os registros de violência psicológica aumentaram 33,8%.
Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), em que se baseia o anuário, ainda revelam que entre 2015 e 2023, ao menos 10.655 mulheres foram vítimas de feminicídio. O número de casos cresceu 1,4% em 2023 na comparação com o ano anterior e atingiu a marca de 1.463 vítimas – o que significa que quatro mulheres foram mortas por dia. É o maior número da série histórica iniciada em 2015, quando entrou em vigor a Lei 3.104/2015, que prevê o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio e inclui o feminicídio no rol dos crimes hediondos.
A diretora do Instituto Patrícia Galvão, Marisa Sanematsu, sugere ações de enfrentamento mais contundentes.
“Os números alarmantes de agressões e feminicídios comprovam a urgência de um pacto de tolerância zero contra a violência doméstica”, disse à Agência Brasil. “Todo feminicídio é uma morte evitável, se o Estado e a sociedade se unirem para enfrentar e denunciar todas as formas de violência que vêm sendo praticadas contra as mulheres.”