O caso Jojo Todynho: como escolhemos nossas referências
Cantora que construiu sua carreira com forte apoio da comunidade LGBTQIA+ e de outros grupos minorizados, surpreendeu muitos de seus fãs ao se alinhar com figuras associadas a extrema direita
Foto: Instagram/Reprodução
Nos últimos dias, uma polêmica envolvendo a cantora e influenciadora digital Jojo Todynho tomou conta das redes sociais e da mídia. O estopim foi uma foto postada pela artista ao lado da ex-primeira-dama Michele Bolsonaro, seguida por declarações de apoio a um candidato do Partido Liberal (PL). No entanto, esses não foram os primeiros sinais de sua inclinação política à extrema direita. O que também ampliou a indignação foi sua ameaça de apagar uma música que havia feito em homenagem à comunidade LGBTQIA+, em resposta às críticas recebidas.
É importante considerar o atual cenário político brasileiro. O país vive um momento de polarização intensa, onde figuras públicas são frequentemente chamadas a se posicionarem, especialmente quando se tornam referências para alguns segmentos. O governo anterior, de Jair Bolsonaro, foi marcado por políticas e discursos contra a comunidade LGBTQIA+, às minorias e aos direitos humanos em geral. Isso é apenas um aperitivo dos ataques do bolsonarismo aos direitos sociais.
Jojo Todynho, que construiu sua carreira com forte apoio da comunidade LGBTQIA+ e de outros grupos minorizados, surpreendeu muitos de seus fãs ao se alinhar com figuras políticas associadas a extrema direita.
O caso nos leva a refletir sobre como construímos nossas referências no mundo do entretenimento. Muitas vezes, elevamos artistas ao status de ídolos sem considerar suas posições políticas ou valores pessoais. Isso não significa que devamos submeter cada celebridade a um escrutínio ideológico rigoroso, mas sim que deveríamos ser mais criteriosos ao decidir a quem damos tanto poder, voz pública e influência.
O termo “pink money” se refere ao poder econômico da comunidade LGBTQIA+. Muitos artistas e empresas se aproximam dessa comunidade não por um compromisso genuíno com a causa, mas pela oportunidade de mercado que ela representa. O caso de Jojo Todynho levanta questões sobre a autenticidade de seu apoio anterior à comunidade e apropriação capitalista e oportunista que estamos suscetíveis.
Artistas que se beneficiam do apoio de comunidades marginalizadas têm uma responsabilidade adicional. Suas ações e declarações podem ter um impacto significativo sobre esses grupos. A aparente mudança de posição de Jojo Todynho não é apenas uma questão de opinião pessoal, mas também de traição da confiança depositada. Abre uma margem de naturalização de posições que agridem diretamente nossos direitos.
O caso também nos lembra que figuras públicas são seres humanos complexos, capazes de contradições e mudanças de opinião. O que implica ainda mais a responsabilidade coletiva. No entanto, quando essas mudanças afetam comunidades vulneráveis, é natural que haja uma reação forte.
O caso Jojo Todynho vai muito além de uma simples polêmica ou tentativa de cancelamento. Ele nos convida a refletir sobre como escolhemos nossas referências, como lidamos com decepções no mundo do entretenimento e como podemos construir um diálogo mais produtivo sobre questões políticas e sociais com essas referências. A importância de compromissos com uma agenda política e reciprocidade. As trajetórias de representatividade descompromissadas criam a noção de que só porque as pessoas são algumas coisa, isso quer dizer que elas apoiam certos valores. Como disse Carla Akotirene neste caso, o fato de se tratar de uma mulher negra, gorda e favelada não garante contra-hegemonia.
Não se trata apenas de condenar Jojo por seu apoio a figuras políticas que historicamente se opõem aos direitos LGBTQIA+. Trata-se de usar esse momento para uma reflexão mais ampla sobre representatividade, responsabilidade programática e o papel de artistas e figuras que abraçamos na formação da opinião pública.