Governo Lula promove leilão para exploração de petróleo na Amazônia
Concessões na Foz do Amazonas demonstram a real política do governo federal para os combustíveis fósseis
Foto: Cezar Fernandes/Divulgação
O leilão de blocos dos campos de extração de petróleo promovido pelo governo Lula na Margem Equatorial do Brasil, especialmente na Foz do Amazonas, reacendeu o debate sobre os riscos socioambientais e a lógica de exploração predatória imposta por grandes conglomerados internacionais. Em mais um capítulo do avanço neoliberal sobre os bens naturais do país, a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) realizou, na terça-feira (17), um leilão de concessão de 172 áreas para exploração de petróleo, das quais 34 blocos foram arrematados em bacias estratégicas como Parecis, Foz do Amazonas, Santos e Pelotas.
Ao todo, nove empresas desembolsaram mais de R$ 989 milhões em bônus para garantir o direito de explorar essas áreas. Entre elas, gigantes como ExxonMobil, Chevron, Shell e a estatal chinesa CNPC, todas com histórico de impactos ambientais em diferentes partes do planeta. Só na bacia da Foz do Amazonas – chamada de “novo pré-sal” por seu potencial estimado em até 10 bilhões de barris, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) – 19 dos 47 blocos foram adquiridos por essas multinacionais, num valor que ultrapassa os R$ 844 milhões.
A Petrobras também participou ativamente do leilão. Segundo Sylvia Anjos, diretora-executiva de Exploração e Produção da estatal, “a empresa conquistou todas as áreas que pretendia”, concentrando os lances na Foz do Amazonas. A própria estatal ainda tenta, junto ao Ibama, o licenciamento para perfurar o bloco FZA-M-59, situado na costa do Amapá, área que integra uma região de altíssima sensibilidade ambiental e presença indígena.
Apesar da narrativa oficial sobre geração de empregos e desenvolvimento regional, defendida pela ANP e pelo governo federal, o que está em curso é a consolidação de um modelo extrativista predatório que ignora a emergência climática e os alertas da comunidade científica. A Margem Equatorial – que compreende cinco bacias sedimentares do norte e nordeste brasileiro – abriga uma biodiversidade ainda pouco estudada e aproximadamente 13 mil indígenas, que poderiam sofrer impactos diretos em caso de acidentes, como o derramamento de óleo.
“O licenciamento sem estudos socioambientais adequados representa grave violação dos direitos fundamentais”, alertou o Ministério Público Federal, que tentou barrar judicialmente o leilão. A ação argumentava que a exploração sem as devidas salvaguardas infringe tratados internacionais de proteção ao meio ambiente e às populações tradicionais.
Outro ponto crítico é a proximidade de blocos ofertados em alto-mar com áreas de proteção ambiental. A Bacia Potiguar, por exemplo, tem blocos situados a apenas 398 km de Fernando de Noronha. Segundo pesquisadores do ICMBio, um eventual vazamento naquela região poderia atingir o arquipélago em pouco tempo, devido às correntes oceânicas – uma ameaça real a um dos maiores patrimônios naturais do país.
Especialistas apontam ainda a contradição de insistir na ampliação da fronteira fóssil no momento em que o mundo discute o fim do petróleo e a transição energética. “A Margem Equatorial deveria ser tratada como um patrimônio ecológico e cultural da humanidade, e não como a nova colônia energética das petroleiras”, afirma Ilan Zugman, diretor da 350.org América Latina, organização que acompanha as ameaças do setor ao clima global.
Embora 31 empresas tenham sido habilitadas para o leilão – entre elas representantes de 11 países -, apenas 172 dos 332 blocos inicialmente ofertados receberam lances. A ausência de interesse em áreas como a Bacia Potiguar pode ser reflexo das pressões sociais e dos riscos já identificados por entidades ambientais e Ministério Público.
A concessão de blocos em regiões tão sensíveis como a Foz do Amazonas expõe, mais uma vez, a contradição entre o discurso ambiental do governo Lula e sua prática, que estimula os combustíveis fósseis e o agronegócio através das mentiras do chamado “capitalismo verde”. A defesa dos mercados de carbono e da financeiração da natureza, além dos bilhões de isenção fiscal ao agronegócio, demonstram as reais prioridades ambientais do governo tanto quanto esse estímulo privatizante à industria dos combustíveis fósseis.