Hipocrisia em defesa da infância: como a extrema direita perpetua a exploração
Após sequestrar o Congresso para fugir de suas responsabilidades, bolsonaristas lançam falas vazias sobre exploração infantil – e ainda protegem as empresas que lucram com isso
Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados
Em um jogo de cena político que evidencia o autoritarismo de fachada da extrema ireita brasileira, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) apresentou, nesta terça-feira (12), um suposto projeto para combater a exploração sexual infantil na internet. Porém, com “soluções” que ignoram as responsabilidades das gigantes da tecnologia e amarram o Poder Executivo, o parlamentar constrói um tributo hipócrita à liberdade de expressão – enquanto ele e sua bancada mantêm o país refém de atos antidemocráticos.
O PL apresentado pelo parlamentar bolsonarista visa obrigar plataformas a remover conteúdo somente após notificação de vítimas ou do Ministério Público, vedando “juízos subjetivos ou discricionários da plataforma”. Ferreira justifica:
“O presente projeto de lei busca equilibrar a proteção integral de crianças e adolescentes com a preservação da liberdade de expressão […] esse equilíbrio é indispensável” . Ainda prevê ‘controle dos pais’, campanhas educativas e aumento de pena para autores de sexualização infantil .
Tudo isso poderia soar bem – se não fosse o teatro vazio que existe por trás. A narrativa construída ignora um fato essencial: a mesma extrema direita protagonizou um motim na Câmara, obstruindo o avanço de um projeto muito mais efetivo (PL 2628/2022), submetido ao Senado em 2022 e aprovado em dezembro de 2024, que determinava diretrizes claras para remoção de conteúdo de abuso infantil e responsabilização das plataformas – inclusive exigindo que perfis de crianças sejam vinculados a responsáveis legais – e que teria tramitado rapidamente por pedido de urgência. Nikolas participou da obstrução, inclusive gravando uma live sentado na cadeira do presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos – PB).
“Quer cassar nosso mandato? Que se dane!”, disse um destemido Nikolas na transmissão.

do PL. (Foto: Instagram/Reprodução)
Essa incoerência foi relembrada pela deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), hoje, nas redes sociais:
“Para não esquecer: a urgência do Projeto de Lei 2628, que trata da proteção de crianças e adolescentes nas redes sociais, estava em pauta na semana passada na Câmara. Não foi votado porque golpistas sequestraram o Congresso pela impunidade de Bolsonaro. Isso é bolsonarismo: a defesa dos próprios interesses criminosos acima das necessidades do Brasil!”.
Ou seja: enquanto se arvoram defensores da infância, são os mesmos que, em conluio com seu grupo, impediram que uma lei robusta saísse do papel. A dupla face de Nikolas Ferreira – que chama o problema à cena, mas bloqueia a solução real —-é uma demonstração explícita de como a extrema-direita instrumentaliza tragédias para manter privilégios.
E as big techs?
Outro ponto alarmante: o projeto de Ferreira nunca menciona responsabilizar as “big techs” pelas receitas geradas com conteúdo exploratório. Em vez disso, busca blindar essas empresas de decisões do Executivo via instrumentos infralegais. Mais do que uma lei, o projeto é um escudo para empresas que lucram com a violação de direitos.
Somente um projeto como o PL 2628 – que exige obrigação clara de remoção, delimita a vinculação de contas infantis, responsabiliza plataformas e evita brechas autoritárias – seria um passo efetivo, se não tivesse sido interrompido pelas forças que hoje simulam preocupação.
Esse contraste expõe o verdadeiro caráter danoso da extrema direita: não é a defesa da família ou das crianças, mas a defesa de um modelo de poder que criminaliza a democracia e lucra com a desinformação e o descaso.