Os tropeços da extrema direita
A desorganização do bolsonarismo e seus aliados marca a conjuntura atual no Brasil
Faltando um ano para as eleições, a velocidade da conjuntura atinge os principais atores políticos que organizam essa disputa. Tanto no plano internacional quanto no âmbito nacional, a sucessão de eventos toma a todos, oscilando entre o instável e o imprevisível.
O que marca a conjuntura atual no Brasil, após as manifestações de 21 de setembro, é, novamente a desorganização da extrema direita, que prometia ganhar fôlego com o sete de setembro, o cerco ao congresso, o apoio de Trump e a luta pela anistia. Por agora, a situação de Bolsonaro, Tarcísio e seus apoiadores é mais incerta e difícil do que há alguns meses.
O governo recuperou terreno e popularidade. O cenário está ligado por muitos fios, que vão desde os interesses imediatos eleitorais, até as reviravoltas no cenário internacional, passando pela decisiva temperatura das ruas. E foi essa que falou alto nos atos contra a PEC da Blindagem e contra as manobras pela anistia.
Agora, quem reorganiza e dá as cartas? Com a extrema direita brasileira em posição defensiva, quais as coordenadas imediatas da luta política? Sem dúvidas, é preciso aproveitar a conjuntura para desenvolver uma linha combativa de apoio ao movimento de massas e seus desafios. Há politização e debate, ainda que não se converta de imediato em novas ações de rua como foram os grandes atos do 21 de setembro.
Conjuntura veloz, extrema direita atrasada
A extrema direita está batendo cabeça. Tudo caminhava para uma saída que combinasse dois elementos: Bolsonaro seguiria com força na luta contra a anistia e Tarcísio se prepararia para assumir a disputa presidencial; agora, isso não é nada certo e o tema da anistia está “empantanado”. Enquanto isso, Tarcísio quer jogar para o começo de 2026 a definição acerca da tática eleitoral.
Isso ocorre num cenário de mudanças bruscas na conjuntura, sobretudo mundial. Trump e Lula tiveram um telefonema onde os gestos foram de “ trégua tácita”, após o desempenho de Lula na ONU. N’outro flanco, Trump atua para impor uma paz colonial na Palestina, promete sobretaxar a China outra vez e ameaça cada vez mais a Venezuela. Tudo isso em meio a uma grande confusão interna, onde as funções de seu governo seguem paralisadas e grandes protestos toma as ruas em solidariedade à resistência palestina e contrários ao genocídio.
Dentro disso, a pauta no congresso nacional patina entre medidas progressivas como a taxação dos grandes- bets etc e a continuidade do ajuste- edução e reforma administrativa. O artigo de David Decacche publicado recentemente na Revista Movimento, demonstra como a austeridade pode ser vendida como justiça fiscal.
Quatro mudanças importantes
A recente pesquisa Quaest apontou que segue a tendência ao crescimento da popularidade do governo e mesmo nas simulações eleitorais contra o mais forte dos candidatos, Tarcísio, Lula dilata sua vantagem. A burguesia estava – e de alguma forma ainda está- preparando seu plano “Milei” mesmo que o próprio enfrente grandes dificuldades na Argentina, sinalizando um pouco das tensões que relacionam a conjuntura nacional com a situação mais geral. Podemos resumir quatro elementos que estão em dinâmica e explicam o recuo da extrema direita, ainda que não sabemos o alcance: i) as manifestações de 21 de setembro; ii) as oscilações de Trump; iii) se agudiza a crise de liderança da extrema direita brasileira; iv) a defensiva de Milei e as interrogantes regionais.
O 21 de setembro, juntando mais de meio milhão de pessoas em centenas de cidades do Brasil expressou a indignação com a PEC da Blindagem e demonstrou reservas importantes do movimento de massas, retomando a ofensiva das ruas, que até então estava inclinada apenas para o bolsonarismo. Foi um respiro e um bom sinal. Seus efeitos no parlamento mudaram a agenda, deram base social para as posições do STF, jogando para frente a questão da anistia e enterrando de vez a PEC da Blindagem.
Trump também é outro elemento importante. Sua posição diante da Palestina foi de assumir o protagonismo do cessar-fogo, para impor um novo pacto colonial, ao lado do Estado Genocida. No âmbito da guerra comercial, teve de ceder a Lula, desde a ONU até a recente reunião telefônica, deslocando por agora para Oriente Médio e China a tensão da polarização. Isso desorganizou a direita mais troglodita que esperava que Trump sairia em apoio ao clã Bolsonaro, como faz com Milei agora. Contudo, a negociação de Lula engendra novas contradições, que podem resultar em mais submissão. E sabemos que Trump é bastante imprevisível e lidera uma ofensiva neocolonial sem precedentes contra os povos. Trocando em miúdos, ele não nos faltará e devemos seguir mobilizados contra a ingerência imperialista no país.
Isso tudo gerou um curto-circuito na extrema direita, que queria atrair o Centrão para um acordo de anistia – no eufemismo da dosimetria – e deixar o caminho livre para Tarcísio encarnar o “Milei à brasileira”. Isso por agora está afastado, visto que novamente se volta uma disputa interna que envolve setores políticos: Tarcísio quer adiar sua definição para 2026 enquanto Ratinho Jr. volta como carta de um setor. E surgem outros complicadores, como a cautela com que o agro vem se movimentando.
E por fim, para ter um Milei para chamar de seu, é preciso que o original tenha êxito. Apertado pela crise fiscal, Milei teve uma derrota importante na principal eleição regional e agora caminha para eleições nacionais de meio período com um impasse: apostou tudo numa acordo de salvação com os Estados Unidos, que injetaram montantes substantivos no Tesouro Argentino, mas tem como calcanhar de Aquiles uma eleição indefinida, onde seu principal candidato acaba de renunciar por um escândalo de vínculos com o tráfico internacional de drogas. Dia 26 será a eleição que vai selar o destino de Milei.
Atuar na conjuntura: as tarefas imediatas
Devemos tomar três grandes tarefas, sem esquecer de apoiar e empurrar o conjunto das lutas parciais.
A primeira é seguir lutando pela efetivação da prisão de Bolsonaro e a retomada da bandeira “Sem Anistia” como combustível para a mobilização de ruas. A condenação e prisão efetiva de Bolsonaro são um elemento chave para a situação defensiva da extrema direita brasileira e é necessário seguir na dianteira.
No campo da luta sindical, a centralidade da luta contra reforma administrativa pode unir todos os setores do funcionalismo público contra o projeto de retirada de direitos, construindo uma jornada de resistência que possa envolver servidores na base, o sindicalismo combativo e mesmo os setores mais dinâmicos do Movimento Estudantil.
Além disso, a solidariedade internacional antifascista se mantém no centro das tarefas, especialmente com o desenvolvimento das pretensões imperialistas de Trump sobre a América Latina. Para isso, apostamos na unidade expressa pela 1ª Conferência Internacional Antifascista e na tenacidade expressa para seguir impulsionando a luta da nossa geração – agora recarregada pela exemplar Flotilha – em solidariedade à Palestina.