Parecer para orientar a bancada do PSOL sobre a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva
Novo marco reafirma o dever do Estado com a escolarização na escola comum e valoriza o protagonismo das pessoas com deficiência, em sintonia com princípios socialistas de igualdade e justiça social
Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
No dia 21 de outubro de 2025, o governo federal publicou o Decreto nº 12.686, que institui a Política Nacional de Educação Especial Inclusiva (PNEEI). O novo marco normativo reafirma o compromisso do Estado brasileiro com a garantia do direito à educação sem discriminação, assegurando igualdade de oportunidades para pessoas com deficiência, pessoas com transtorno do espectro autista e pessoas com altas habilidades/superdotação.
A Política Nacional de Educação Especial Inclusiva é composta por 24 artigos que, em última instância, tratam de direitos humanos e consolidam um avanço histórico na luta contra a segregação escolar. O decreto será regulamentado por portaria específica, que definirá as estruturas de governança, o funcionamento dos observatórios de educação inclusiva e as formas de implementação nos territórios, em articulação com estados, municípios e redes de ensino.
É fundamental compreender que o decreto, enquanto instrumento normativo, não cria uma nova política, mas organiza, reafirma e dá força jurídica a princípios e diretrizes que já estavam previstos em legislações anteriores — em especial a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (2008), a Lei Brasileira de Inclusão (Lei nº 13.146/2015), a Lei nº 12.764/2012 e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, incorporada ao ordenamento com status constitucional pelo Decreto nº 6.949/2009.
O texto não revoga direitos, não restringe o funcionamento das instituições especializadas e não impõe o fechamento das APAEs ou de centros conveniados. Pelo contrário, reafirma a possibilidade de que tais instituições atuem como parceiras na oferta de serviços de Atendimento Educacional Especializado (AEE), desde que em articulação com a escola comum e dentro da função pedagógica, e não substitutiva, do sistema escolar.
Entre os principais avanços, o decreto:
- Reafirma o direito à escolarização na escola comum, rejeitando a existência de sistemas paralelos e classes segregadas;
- Valoriza o AEE como serviço educacional e pedagógico, reafirmando o protagonismo docente e a centralidade da escola como espaço de aprendizagem e convivência;
- Define, pela primeira vez, carga horária mínima de formação continuada em serviço (80h) para professores de AEE e profissionais de apoio, garantindo uma base nacional de qualificação;
- Institui a Rede Nacional de Observatórios da Educação Especial Inclusiva, que permitirá o monitoramento, a avaliação e o aperfeiçoamento contínuo da política, fortalecendo a transparência, o controle social e a participação popular.
Além disso, o decreto reconhece o papel articulador do professor de AEE, cuja atuação ultrapassa o espaço da sala de recursos, integrando o trabalho pedagógico com professores da sala comum, famílias e equipes intersetoriais. Reafirma também a ética do cuidado, garantindo ao estudante com deficiência autonomia, privacidade e protagonismo sobre o cuidado que recebe, de modo coerente com o princípio da interdependência humana e da dignidade da pessoa com deficiência.
No campo da acessibilidade, o decreto fortalece a obrigação do Estado de investir em tecnologias assistivas, sistemas de comunicação alternativa, adaptações razoáveis e recursos personalizados que assegurem o pleno acesso, participação e aprendizagem de cada estudante.
É necessário ressaltar que não há inovação que represente ameaça à rede de instituições especializadas. O texto apenas reafirma que a escolarização é dever do Estado e direito subjetivo da pessoa com deficiência, devendo ocorrer na escola comum, em consonância com os tratados internacionais e com a legislação brasileira vigente.
Desde a sua publicação, setores conservadores e da extrema direita têm propagado notícias falsas sobre o conteúdo do decreto, alegando que ele “acaba com as APAEs” ou “retira direitos das famílias”. Essas afirmações são infundadas e fazem parte de uma estratégia política que visa deslegitimar as políticas de inclusão e reinstaurar práticas segregatórias, que movimentam um mercado da deficiência.
O PSOL deve compreender que o decreto é fruto das mobilizações históricas do Movimento de Pessoas com Deficiência, de pesquisadores e professores comprometidos com a escola pública e inclusiva, e de famílias e movimentos sociais que há décadas lutam contra o capacitismo e a exclusão escolar.
Nosso campo político deve reconhecer que a educação inclusiva é uma conquista civilizatória e um componente essencial da luta socialista por igualdade, diversidade e justiça social. É papel da bancada do PSOL defender publicamente o Decreto nº 12.686/2025, contrapondo-se às iniciativas de setores ultraconservadores que tentam sustá-lo via Projetos de Decreto Legislativo (PDLs) e reverter avanços democráticos.
Cabe à nossa bancada atuar com clareza, unidade e diálogo com o movimento social, reconhecendo a amplitude e complexidade da pauta da deficiência. O enfrentamento às políticas de retrocesso deve ser construído em aliança com as pessoas com deficiência, os profissionais da educação, os pesquisadores e as famílias, de forma coletiva e solidária.
O Decreto nº 12.686/2025 é, portanto, um marco de fortalecimento da educação pública, democrática e inclusiva, que precisa ser defendido, acompanhado e aperfeiçoado com participação popular e controle social.