Retrospectiva 2025: a flotilha que desafiou Israel
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Retrospectiva 2025: a flotilha que desafiou Israel

Missão humanitária internacional tentou romper o bloqueio a Gaza, mas foi atacada, interceptada e teve ativistas presos por Israel em águas internacionais

Tatiana Py Dutra 26 dez 2025, 07:00

Foto: Global Sumud Flotilla

A Global Sumud Flotilla entrou para a história recente da solidariedade internacional como uma das mais amplas e ousadas tentativas de romper o bloqueio imposto por Israel à Faixa de Gaza. Formada por cerca de 40 embarcações e aproximadamente 400 ativistas de mais de 45 países, a missão partiu da Europa com um objetivo claro: levar alimentos, medicamentos, água potável e atenção internacional a uma população submetida há quase duas décadas a um cerco considerado ilegal por organizações de direitos humanos.

O nome Sumud, palavra árabe que significa “firmeza” ou “resiliência”, sintetiza o espírito da iniciativa. Desde 2007, mais de dois milhões de palestinos vivem em Gaza sob severas restrições à circulação de pessoas e mercadorias, cenário agravado após a ofensiva israelense iniciada em outubro de 2023. Diante da fome generalizada, da destruição de hospitais e da morte de dezenas de milhares de civis, ativistas decidiram agir onde a diplomacia internacional tem falhado.

“Romper o cerco à Faixa de Gaza e abrir um corredor humanitário é uma missão histórica”, afirmaram os organizadores da flotilha, ligada à rede internacional Flotilha da Liberdade. A delegação brasileira contou com mais de dez integrantes, entre eles a vereadora Mariana Conti (PSOL-Campinas), a presidenta do PSOL-RS Gabrielle Tolotti, e o militante do PSOL Nicolas Calabrese.

Ataques antes mesmo da travessia

Ainda na fase de preparação, dois navios da Global Sumud Flotilla foram atacados no porto de Sidi Bou Said, na Tunísia, nos dias 8 e 9 de setembro. Investigações conduzidas pelo site Bellingcat, referência internacional em análise de fontes abertas, apontaram fortes indícios do uso de munições incendiárias lançadas a partir de plataformas aéreas, possivelmente drones.

Vídeos analisados por especialistas independentes mostram objetos em chamas caindo sobre os barcos Family Boat e Alma, provocando incêndios a bordo. “Parece um objeto incendiário lançado de uma plataforma aérea”, afirmou o pesquisador N.R. Jenzen-Jones, da Armament Research Services. Posteriormente, o próprio Ministério do Interior da Tunísia reconheceu que se tratou de um “ataque premeditado”.

Interceptação militar e prisão

Já em alto-mar, na madrugada de 1º de outubro, a flotilha foi cercada por navios de guerra israelenses, sobrevoada por drones e intimidada por submarinos, segundo relatos confirmados por veículos como Reuters e The Guardian. Pouco depois, embarcações como o Sirius foram interceptadas em águas internacionais, em uma ação amplamente condenada por juristas.

“Estamos diante de um crime grave. Interceptar barcos civis em águas internacionais é ilegal”, denunciou a vereadora Mariana Conti, que relatou ter sido abordada “com metralhadoras e lasers apontados para o rosto”.

Os ativistas foram levados à força para o porto de Ashdod e posteriormente transferidos para prisões em Israel, onde permaneceram incomunicáveis por dias, segundo relatos diplomáticos e de organizações humanitárias. A Anistia Internacional classificou a ação como “um ataque descarado contra trabalhadores humanitários desarmados”.

A relatora especial da ONU para os territórios palestinos, Francesca Albanese, também se manifestou, afirmando que a interceptação demonstra “desprezo pelas ordens do Tribunal Internacional de Justiça” e pela obrigação de garantir ajuda humanitária à população civil.

A ativista sueca Greta Thunberg, que integrava a missão, foi ainda mais direta: “Fomos raptados e submetidos a tratamento degradante”, denunciou após sua libertação.

Repercussão e retorno ao Brasil

Após intensa pressão internacional e mediação diplomática, 13 ativistas brasileiros foram libertados e deportados via Jordânia, desembarcando no Aeroporto de Guarulhos sob aplausos de centenas de militantes e movimentos populares. Ainda assim, a própria flotilha precisou organizar uma vaquinha internacional para custear o retorno dos brasileiros, denunciando a ausência de apoio material por parte do governo israelense.

Ao chegar ao Brasil, Gabrielle Tolotti resumiu o sentido político da missão:

“Nosso objetivo não era só chegar a Gaza, mas levar os olhos do mundo para Gaza. E isso a gente conseguiu. Fomos interceptados com armas, mas não nos quebraram.”

O ativista Thiago Ávila reforçou que a repressão não encerra a luta: 

“Saímos com o mesmo senso de justiça e dignidade, mesmo depois de termos sido atacados e presos”.

Solidariedade como resistência

A Global Sumud Flotilla não conseguiu entregar fisicamente a ajuda humanitária, mas rompeu o bloqueio do silêncio. Ao expor a violência empregada contra civis desarmados e a criminalização da solidariedade, a missão reacendeu o debate internacional sobre o cerco a Gaza e a responsabilidade de Israel por violações do direito internacional.

Mais do que uma travessia marítima, a flotilha se consolidou como um ato político e humanitário de denúncia, reafirmando que, diante da fome e do genocídio, a neutralidade não é uma opção. “Fomos detidos, mas não calados”, declarou Tolotti. A frase ecoa como síntese de uma missão interrompida pela força, mas fortalecida pela solidariedade global.


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