Oportunidade perdida no Enem
Os textos-base da Redação do Enem, aplicado no último domingo em Belém e outras cidades paraenses devido à COP 30, apagaram os trabalhadores rurais e não acompanharam as necessidades do nosso tempo
Este domingo foi o primeiro dia de Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) nas cidades paraenses de Belém, Ananindeua e Marituba. Por conta da COP-30, a prova começou a ser aplicada apenas neste dia 30 de novembro em municípios da região metropolitana da capital do Pará. Tão aguardado e às vezes temido, o tema da Redação abordou “a valorização dos trabalhadores rurais”, que apesar de importante, foi apresentado de forma genérica e frágil fundamentação.
A temática da Redação que poderia prosseguir os debates travados no contexto da Conferência sobre Mudanças Climáticas da ONU, se mostrou uma oportunidade perdida de avançar em discussões fundamentais, para alterar a lógica produtiva dominante em torno do direito à terra e o manejo do solo. Se formos considerar os textos-base selecionados pelos avaliadores do INEP, que deveriam orientar os estudantes na construção da Redação, estes se mostraram bem limitados. Não se sabe se por vontade própria ou por orientação governamental, para não contrariar os representantes do agronegócio.
Entre os textos-base selecionados, o maior priorizava o agronegócio, que também se expressou em uma tabela com números fantasiosos, enquanto o texto que falava sobre agricultura familiar era tão pobre que parecia cópia do Wikipedia, apesar de ser extraído do site da Contag. O único texto-base a ser valorizado era o que tratava dos riscos que trabalhadores rurais vivenciam cotidianamente.
Porém, nada mais se viu nos textos que deveriam ser orientadores sobre Reforma Agrária, concentração fundiária, trabalho análogo à escravidão, crimes no campo, dificuldades para escoamento da produção, êxodo rural e migração para as favelas das cidades. A prova sequer falava da importância de trabalhadores rurais para garantir alimento de qualidade e livre de agrotóxicos na mesa dos brasileiros.
Em ano de COP-30 no Pará e, há uma semana do evento da ONU realizado em Belém, que motivou inclusive o adiamento do Enem na cidade, também não se registrou nenhuma linha sobre o papel de trabalhadores rurais no enfrentamento às mudanças climáticas e na preservação de nosso ecossistema.
No entanto, se os textos-base da Redação do Enem, selecionados pelo INEP, não acompanharam as necessidades do nosso tempo, a esperança é que nossos estudantes tenham contrariado as orientações do órgão governamental e, com vivência amazônica, tenham apresentado repertório de qualidade e um leque de argumentações sobre a real importância e valorização de trabalhadores rurais, pautando os debates centrais sobre esses sujeitos que são essenciais para nossas vidas, pois se o campo não planta e colhe, a cidade não come e nem sobrevive.
Agro é morte. Agricultura familiar é vida. Viva os trabalhadores e as trabalhadoras rurais!