Por Tarifa Zero no transporte coletivo de Ponta Grossa
A mobilização popular que barrou o aumento da passagem em 2006 inspira a defesa de um transporte público gratuito, como direito social e não como negócio
Foto: Bruno Welington Oliveira Souza
No ano de 2006, mais precisamente no dia 31 de março, o então prefeito de Ponta Grossa, Pedro Wosgrau (PSDB), preparava-se para assinar um decreto que aumentaria a tarifa do transporte coletivo de R$ 1,80 para mais de R$ 2.
Naquele momento, Ponta Grossa testemunhou a força do movimento social organizado. Uma ampla rede de articulação, envolvendo o movimento estudantil, movimentos populares, professores, servidores públicos e trabalhadores, unificou-se na construção de um Comitê Contra o Aumento da Passagem de Ônibus, que passou a panfletar e convocar a população para a luta no próprio dia 31 de março de 2006.
Naquela data histórica, mais de 3 mil pessoas trancaram o Terminal Central de Ponta Grossa, das 7h30 às 13h, em um ato de massas que resultou em uma vitória retumbante. Diante da força da mobilização popular, o prefeito foi obrigado a não assinar o decreto, e a tarifa permaneceu congelada por mais dois anos.
Os setores dominantes da cidade recuaram por medo da força popular, expressa em três grandes atos, sendo o primeiro com mais de 3 mil pessoas no dia 31 de março de 2006, seguido por manifestações com cerca de 1.000 e depois 500 pessoas nas semanas seguintes.
O Comitê Contra o Aumento da Tarifa era composto majoritariamente por estudantes — secundaristas e universitários —, mas também reunia lideranças de bairro e trabalhadores. A indignação era profunda: o serviço era precário, mas os aumentos eram constantes.
Passadas quase duas décadas, parte daqueles setores optou por deslocar a luta para dentro do Estado, caminho que acabou sendo sequestrado pelo limite do “possível”, reduzido a políticas de subsídios sucessivos à VCG (Viação Campos Gerais), empresa concessionária do transporte coletivo em Ponta Grossa.
Ao longo desses anos, a equação se repetiu: poderes públicos omissos correram atrás de mais isenções fiscais e subsídios milionários, enquanto a empresa, em troca, entregou um serviço cada vez pior, marcado pela precarização dos trabalhadores, agravada pela quase completa demissão dos cobradores, sem qualquer redução efetiva da tarifa.
Os signatários deste texto, entretanto, seguem na luta. Sem se render, sem se deixar cooptar. Se há duas décadas a Tarifa Zero parecia uma utopia, hoje ela é um debate nacional sério, apresentado como resposta concreta à crise da mobilidade urbana, fruto do crescimento desordenado das cidades médias e grandes do país.
Por isso, convidamos todas e todos a seguir na luta. Não podemos assistir passivamente à Prefeitura, à Câmara Municipal e aos deputados da cidade empenharem-se em preservar o lucro, torrando centenas de milhões de reais em dinheiro público, enquanto a população paga caro por um serviço ruim.
Nossa experiência histórica demonstra que somente com mobilização popular, independência política e autonomia dos movimentos sociais a luta pode avançar, sem se transformar em mais um mecanismo de transferência de recursos públicos para a empresa concessionária.
Lutamos para que esse modelo seja rompido e para que o direito de ir e vir, bem como o acesso à saúde, educação, cultura, esporte e lazer, sejam garantidos por meio do direito à Tarifa Zero.
Tarifa Zero
O modelo de gestão privada do transporte coletivo, adotado em cidades do Brasil e de inúmeros outros países, mostra-se cada vez mais ineficiente e deficitário. Tarifas elevadas, oferta limitada de linhas e frequência insuficiente tornaram-se rotina, exigindo soluções estruturais e urgentes.
Atualmente, mais de 170 municípios brasileiros já adotam programas de gratuidade no transporte coletivo, sem lucro empresarial. Em 138 cidades, a oferta plena de transporte gratuito atende mais de 8 milhões de pessoas diariamente. Paralelamente, o Governo Federal avalia a construção de uma política nacional para enfrentar o problema da mobilidade urbana.
Nesse sentido, a PEC 25/2023, de autoria da deputada Luiza Erundina e outros parlamentares, propõe a criação de um Sistema Único de Transporte, preservando a autonomia municipal, nos moldes do SUS. A proposta conta com o apoio de 173 parlamentares na Câmara dos Deputados e está em sintonia com a Constituição Federal, que desde 2015 reconhece o transporte público como direito social.
Em Ponta Grossa, a situação é ainda mais grave. Há décadas, uma única empresa controla o transporte coletivo sob concessão municipal. A insatisfação popular com a qualidade do serviço e com o valor da tarifa é amplamente conhecida, mesmo diante de repasses frequentes da Prefeitura, justificados como subsídios para reduzir uma suposta “tarifa técnica”.
É fundamental esclarecer: Tarifa Zero não é subsídio ao lucro empresarial. Trata-se de um programa público, com controle social, transparência e fiscalização, completamente distinto do monopólio privado mantido em Ponta Grossa há mais de três décadas.
Garantir mobilidade urbana, reduzir o uso de carros particulares, diminuir a poluição e o tempo de deslocamento são alguns dos benefícios de um Programa de Tarifa Zero no Transporte Coletivo de Ponta Grossa. Trata-se de eliminar um custo que encarece brutalmente a vida da maioria da população, hoje obrigada a pagar R$ 5,00 por uma única passagem para acessar trabalho, escola, posto de saúde ou espaços de lazer.
É hora de enfrentar o problema do transporte público em Ponta Grossa de forma séria, em sintonia com as experiências já consolidadas no país, e de construir uma alternativa que coloque o direito da população acima do lucro empresarial.