Carta de Bolsonaro
O recuo só significaria um momento proveitoso para o movimento democrático dos trabalhadores se a chamada à mobilização social pelo Fora Bolsonaro fosse intensificada.
Bolsonaro pediu a ajuda de Michel Temer para redigir uma carta à nação e intermediar um diálogo com Alexandre de Moraes. Um cenário inusitado um dia depois de conclamar sua base ignorante, grosseira, preconceituosa a querer a cabeça do ministro do STF que mais longe foi em adotar medidas de investigação e punição aos crimes da família e de aliados de Bolsonaro.
Em linguagem popular, poderia se dizer que Bolsonaro arregou? De modo mais formal, que fez um recuo importante em seu discurso, com sua nota ao país conclamando harmonia entre os poderes? Sim, não há dúvidas de que algo disso existe. Seu discurso do dia 7 de setembro havia sido uma declaração de guerra. Mesmo as conservadoras e reacionárias instituições da República liberal burguesa tiveram de reagir de modo mais firme, numa linha de oposição, pautando com força nunca vista por parte delas o tema do impeachment de Bolsonaro e a defesa de nossa democracia burguesa e rarefeita, mas, ao fim e ao cabo, uma democracia.
As declarações não expressavam uma resposta com a contundência necessária diante da declaração de guerra. Porém, sinalizavam que não dariam um passo atrás num caminho de oposição. O passo seguinte veio com a carta de Bolsonaro. Creio que de fato foi um recuo.
Mas esse recuo só significaria um momento proveitoso para o movimento democrático dos trabalhadores em sua luta contra as ameaças de arbítrio se a chamada à mobilização social pelo Fora Bolsonaro fosse intensificada. Se tal momento permitir que uma vez mais a burguesia busque um pacto com candidato a ditador, então é Bolsonaro que terá avançado. Nesse caso, uma vez mais, a burguesia liberal estará ajudando a dar passagem à autocracia.
Isso porque o dia seguinte ao 7 de setembro foi marcado por um movimento muito mais significativo do que as dezenas de milhares que mobilizaram-se na Paulista, um público majoritariamente de classe média, sem pulso para um enfrentamento contra revolucionário. A ação dos caminhoneiros, com maior ou menor controle de empresas capitalistas, representou uma tropa de choque social mais efetiva. Bolsonaro mesmo teve de desativar o que armou. Que alguns líderes deste movimento tenham que ter feito lives do exterior, foragidos da justiça, mostra as dificuldades e fraquezas do bolsonarismo.
O caráter criminoso de sua família explica diretamente que seu recuo é de fato um recuo e uma busca de negociação. Mas se o recuo de Bolsonaro, mesmo depois da ação contrarrevolucionaria via a base social dos caminhoneiros, não resultar em fortes ações de rua pelo Fora Bolsonaro, então as próximas ações da extrema direita podem ser mais audaciosas. E esperar pela burguesia ou lhe entregar o papel de chefe na defesa das liberdades democráticas é diretamente uma traição aos interesses populares.
Todas estas caracterizações são buscas de aproximação do real. O determinante de fato é a necessidade de que ainda em setembro centenas de milhares tomem as ruas não apenas para dizer “não passarão”!, mas para afirmar abaixo o governo! , deposição e prisão para Bolsonaro.
Neste movimento, será importante levantar as reivindicações da classe trabalhadora, o que inclui reivindicações dos caminhoneiros e das bases das forças polícias, dos soldados e da baixa oficialidade. Assim, também estaremos disputando tal base social do Bolsonarismo, cuja real natureza não é de defesa desses segmentos, mas apenas das empresas, de parte do altos oficiais e, sobretudo, das milícias.