Os imprescindíveis trabalhadores da saúde: uma vez mais, na linha de frente
A nova agenda política do próximo governo deve tocar prioritariamente na defesa da saúde pública, passando em primeiro lugar pela valorização dos que estão na linha de frente
Enormes concentrações tomaram as principais vias de Buenos Aires por semanas. Uma grande maré branca se fez sentir por vários cantos da cidade, em repúdio à política salarial do governador da cidade, Horácio Larreta. Começou com uma reivindicação dos médicos residentes, e rapidamente se espalhou pelas diversas categorias da saúde.
Madrid, 13 de novembro. 200 mil vão às ruas. Com o slogan de “uma saúde 100% pública, universal e de qualidade”, a marcha se deu contra os cortes do governo conservador de Isabel Ayuso e foi convocada e organizada por sindicatos e coletivos em defesa da saúde.
Em meio ao chamado “outono do descontentamento”, processo que combina greves de inúmeras categorias, com a crise política do governo inglês, a ação das enfermeiras e enfermeiros constitui um fato histórico. Pela primeira vez em 106 anos, o Royal College do Nursing decretou uma greve – a ocorrer entre 15 e 20 de dezembro. A luta é contra a queda no valor real do salário, que em dez anos supera os 20%.
Nos Estados Unidos, ainda em setembro deste ano, foram as greves da saúde em Minnesota e Wisconsin que levantaram na forma de cartazes os dizeres: “Pacientes antes dos lucros”.
Uma breve pesquisa nas redes indica que movimentos similares tiveram lugar em Moçambique, Guiné Bissau, Coreia do Sul, entre diversos países, contra as privatizações, cortes e por salários. Uma verdadeira onda internacional de luta dos trabalhadores da saúde.
Não é coincidência que os corpos das trabalhadoras e trabalhadores que estiveram na linha de frente do combate à pandemia agora voltem a ocupar um papel protagonista, desta vez no sentido da luta política. A pandemia de Covid-19 – que arrefeceu mas não terminou – completou quase três anos, sendo um processo que abalou o planeta de conjunto. Como vanguarda da luta pela vida, os profissionais da saúde foram mundialmente reconhecidos. A OMS chegou a determinar que o ano de 2021 fosse designado como o Ano Internacional dos trabalhadores de saúde e cuidadores.
Essa categoria, no mundo inteiro considerada como heróica durante a pandemia, foi dos “aplausos ao combate”. Gozando de grande simpatia popular, as trabalhadoras e trabalhadores dos diversos ramos da saúde passaram por cima da hipocrisia dos governos – especialmente os que reconhecem apenas em palavras a centralidade desses profissionais – exigindo, em protestos e greves, o reconhecimento salarial, a luta contra os cortes nos orçamentos e a defesa do caráter público e popular do direito à saúde.
As manifestações da saúde em todo mundo tem um rosto: a ampla presença feminina nos protestos como expressão da composição profissional das categorias da saúde. Como escreveu o “Esquerda.Net”, repercutindo a entrevista da principal dirigente da luta no Reino Unido, Pat Cullen, citada pelo Guardian disse que os trabalhadores sentiram que a rejeição de negociações formais fez com que “os nossos membros sentissem uma tal injustiça que irão fazer greve pela primeira vez”. Para ela, “o pessoal de enfermagem está farto de ser tomado por garantido, farto de baixos salários e de níveis de insegurança pessoal, farto de não ser capaz de dar aos nossos pacientes o cuidado que merecem”.
Durante a pandemia, o conjunto da população e mesmo os governantes mais privatistas tiveram que reconhecer o lugar dos sistemas públicos de saúde, como o SUS brasileiro ou o NHS inglês.
No Brasil, um dos setores de ponta que esteve na vanguarda para derrotar Bolsonaro foi o movimento de trabalhadoras e trabalhadores da saúde, tanto nas ruas quanto nas eleições.
A nova agenda política do próximo governo deve tocar prioritariamente na defesa da saúde pública, passando em primeiro lugar pela valorização dos que estão na linha de frente.
A luta vai seguir em todo planeta. Nos parece muito interessante a carta aberta que Jesus Jaen, veterano militante socialista e dirigente do Movimento de Trabalhadores da Saúde de Madrid, publicou pautando a política de Isabel Ayuso, chefe do governo:
“Os trabalhadores e trabalhadoras da atenção primária estão fartos, exaustos e indignados com sua arrogância. Mas muito mais, os madrilenos que não podem pagar o seguro na Sanitas, Adeslas ou Ruber. Você tornou possível o que parecia impossível. Uniu todos nós em defesa da nossa saúde! Fique tranquila, se não recuar, voltaremos!”
Com esse chamado, saudamos os “imprescindíveis”, parte integrante e fundamental da nossa classe, internacionalmente.