A tentativa de cassar Brisa Bracchi e o cerco aos mandatos de esquerda
Quando uma vereadora jovem da oposição é colocada sob cassação num processo repleto de irregularidades, o alvo não é só o mandato, mas a democracia, os direitos das mulheres e a esquerda que ousa lutar
Foto: Reprodução
Em Natal, a tentativa de cassação do mandato da vereadora Brisa Bracchi (PT) expõe um ataque direto à democracia local, à presença de mulheres na política e à direita que usa o poder legislativo para silenciar a oposição. A parlamentar lidera a bancada de oposição na Câmara Municipal de Natal e agora enfrenta um processo que, segundo sua defesa, está recheado de vícios: foi notificada às 13h27 de segunda-feira (17 de novembro) e uma sessão de julgamento marcada para 9h da manhã de terça-feira (18) – intervalos inferiores ao mínimo de 72 horas previsto no Regimento Interno da Casa e no Decreto‐Lei 201/67.
O relatório da comissão especial, aprovado por 2 × 1, recomenda a cassação com base na acusação de que Brisa teria destinado R$ 18 mil de emenda parlamentar para o evento “Rolé Vermelho: Bolsonaro na Cadeia”, realizado em 9 de agosto, e que o ato teria caráter político-partidário.
Para a defesa, porém, não houve contrapartida ilegal, nem contratação para fazer campanha – e servidores da fundação municipal responsável afirmam que “os processos ligados à emenda tramitaram sem irregularidades”.
A Justiça do Estado do Rio Grande do Norte concedeu liminar suspendendo a sessão marcada para 18 de novembro, apontando a “verdadeira violação formal grave” do rito e declarando que “o perigo de dano, por sua vez, é manifesto e de difícil reparação, uma vez que (…) estar-se-á diante da perda de um mandato eletivo por expediente potencialmente nulo”.
Esse episódio simboliza motivações que vão além do mérito formal. Há, ao menos, três dimensões políticas que se impõem:
Silenciar a oposição – Brisa é líder da bancada opositora e representa uma voz jovem, mulher e transformadora. A rapidez do processo e a “marcação” da sessão em menos de 24 horas após aprovação do parecer são interpretados como tentativa de atropelar a defesa e eliminar uma parlamentar que incomoda.
Violência política de gênero – A secretária nacional de Mulheres do PT, Anne Moura, interpretou o processo como “violência política de gênero”, porque atinge uma mulher jovem que representa o movimento de cultura, juventude e política popular.
Retrocesso democrático – Trata-se de uma sinalização para toda a esquerda e para as mulheres: se um mandato pode ser cassado por processo tão precário e marcado por irregularidades, o recado é claro para quem ousa se posicionar contra o conservadorismo. Movimentos sociais e partidos já fazem vigília na Câmara em apoio à vereadora.
Saiba Mais
Outros parlamentares de esquerda sob risco ou já alvo de cassação
No âmbito nacional, o caso mais emblemático é o do deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ). O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados aprovou, em 9 de abril de 2025, por 13 votos a 5, parecer que recomenda a cassação do mandato de Glauber por suposta “quebra de decoro parlamentar”.
Glauber defende que o processo tem “viés político” e acusa a articulação de Arthur Lira para punir quem denuncia o chamado “orçamento secreto”.
Outro caso de alerta vem da vereadora Professora Ângela (PSOL) em Curitiba. Uma denúncia por “quebra de decoro parlamentar” – relacionada à distribuição de cartilha de redução de danos – foi admitida por comissão da Câmara Municipal de Curitiba e pode levar à cassação de seu mandato.
Esses casos evidenciam que a ofensiva não é esporádica, mas parte de um padrão: parlamentares da esquerda que questionam privilégios, defendem direitos sociais, diversidade e democracia são sistematicamente colocados em processo que pode resultar em cassação – muitas vezes com falhas no rito, pressa e motivação política claramente identificável.
Resta mobilização, solidariedade e o enfrentamento desse ataque ao direito de ser oposição.