‘Tarcísio é entreguista’, alerta Mariana Conti contra autarquização da saúde da Unicamp
Proposta desmonta vínculo histórico entre universidade e SUS, fragiliza servidores, coloca pacientes em risco e reforça risco de privatização
Foto: Unicamp/Divulgação
A ofensiva do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) sobre o patrimônio público paulista chegou ao coração de uma das maiores universidades da América Latina. Para a vereadora Mariana Conti (PSOL), o plando de transformar o complexo de saúde da Unicamp em uma autarquia representa um risco real de privatização, com impactos profundos para trabalhadores, pacientes e para o próprio Sistema Único de Saúde (SUS).
“Tarcísio de Freitas é um governador entreguista. Ele privatizou água, escolas, estradas, e agora está com a mira apontada para o hospital e todo o complexo da área da saúde da Unicamp. (…) Isso é abrir caminho para a privatização, e quem trabalha e usa o SUS sabe muito bem a tragédia que isso significa”, denuncia Mariana.
A vereadora – que visitou o hospital ao lado da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL) e do Sindicato dos Trabalhadores da Unicamp (STU) – reforça que defender a estrutura atual é um ato de proteção à vida:
“Defender o hospital, a área de saúde e a universidade pública é defender saúde de qualidade para a população.”
O que está em jogo
Relatório apresentado pela Reitoria da Unicamp, no último dia 10, propõe transformar toda a área da saúde em uma autarquia chamada Hospital das Clínicas da Unicamp (HC-Unicamp). A mudança criaria uma nova estrutura administrativa vinculada diretamente à Secretaria Estadual da Saúde, rompendo o vínculo orgânico com a universidade – base da integração entre assistência, ensino, pesquisa e extensão.
A transformação ocorreria entre 2026 e 2036, com impacto sobre oito unidades essenciais, incluindo o Hospital de Clínicas e o Caism. Segundo o STU, isso significa perda do controle administrativo e financeiro pela universidade e risco de demissões em massa, já que o regime de contratação passaria a depender do governo estadual. Além disso, a mudança será uma ameaça à qualidade da assistência de alta complexidade, hoje integrada aos cursos e pesquisas da Unicamp e uma abertura de brecha para serviços terceirizados e parcerias privadas – caminho seguido por outros hospitais estaduais autarquizados e criticado por especialistas em políticas públicas de saúde.
Autonomia administrativa que pode custar caro ao SUS
Entre as medidas previstas pelo relatório, estão:
1. Criação do HC-Unicamp como autarquia própria
Passaria a operar com orçamento separado e vinculado à Secretaria de Saúde, e não mais à Unicamp.
2. Transferência progressiva dos custos ao governo estadual
A partir de 2028, o custeio operacional ficaria com a Secretaria de Saúde. Até 2031, o estado assumiria o pagamento integral dos servidores. Segundo a ATU, a Unicamp deixaria de destinar 17% do seu orçamento – cerca de R$ 1,1 bilhão – à saúde. Conforme especialistas ouvidos pela imprensa isso representa risco de subfinanciamento crônico, já observado em hospitais estaduais geridos com estruturas semelhantes.
3. Expansão acadêmica condicionada ao corte na área de saúde
Os recursos retirados da saúde seriam utilizados para criar novos cursos e ampliar 1,1 mil vagas. Embora a expansão acadêmica seja legítima, ela não deveria depender do enfraquecimento do principal centro hospitalar público do interior paulista.
4. Manutenção apenas parcial dos benefícios aos servidores
A proposta afirma que benefícios atuais seriam mantidos, mas não garante a continuidade dos direitos estatutários, nem impede alterações contratuais futuras – um ponto que gera enorme insegurança entre trabalhadores.
Negócio de risco
Quem perde com a autarquização são especialmente os pacientes do SUS, sob risco de redução da qualidade do atendimento, possível restrição de acesso conforme diretrizes da Secretaria de Saúde e a lentificação de serviços e filas, já observada em modelos estaduais autarquizados.
Sofrerão também os trabalhadores do complexo de saúde, com incertezas sobre carreira, estabilidade e condições de trabalho, além da possibilidade de adoção de modelos de contratação precarizados, como OSs.
A Unicamp, com a perda da gestão direta de uma das áreas mais estratégicas para suas pesquisas e formação, também sofre prejuízo. Além disso, há risco de enfraquecimento da integração entre ensino, atenção hospitalar e investigação científica.
A escalada privatista de Tarcísio
Nos últimos dois anos, o governo Tarcísio intensificou a entrega de serviços públicos ao setor privado. Entre os de maior destaque estão a privatização da Sabesp, vendida mesmo com resultados financeiros robustos; a ampliação de parcerias público-privadas na educação, incluindo gestão de escolas; as concessões de rodovias em blocos lucrativos, com tarifas em alta, além da defesa explícita de modelos de gestão hospitalar por OSs, criticados pelo TCU e por órgãos de controle.
A autarquização da saúde da Unicamp se insere nessa estratégia: enfraquecer estruturas públicas robustas para, posteriormente, justificar terceirizações, PPPs ou privatizações.
Defender a saúde da Unicamp é defender o SUS
O complexo de saúde da Unicamp não é apenas um hospital. É um centro de referência para 4,2 milhões de moradores, responsável por casos de alta complexidade, formação de profissionais e produção de conhecimento. Separá-lo da universidade e submetê-lo à lógica administrativa do estado – marcada por cortes e privatizações – é um risco real à saúde pública.
“É abrir caminho para a privatização — e isso significa tragédia para quem trabalha e quem usa o SUS”, resume Mariana Conti
A disputa agora é política, jurídica e social. E quem defende o SUS, a universidade pública e o interesse coletivo sabe: a saúde da Unicamp não pode ser entregue ao projeto privatista de Tarcísio de Freitas.