“As ciências sociais e as humanidades não são um luxo”

Em manifesto, pesquisadores internacionais se colocam contra ataques de Bolsonaro ao conhecimento.

Vários Autores 8 maio 2019, 13:34

26 de abril, o presidente brasileiro Jair Bolsonaro confirmou no Twitter o que o seu Ministro da Educação, Abraham Weintraub, havia anunciada no dia anterior: seu governo quer acabar com os subsídios públicos destinados aos estudos de Sociologia e Filosofia. 

Para essas disciplinas seria preciso financiar os seus próprios estudos. Enquanto o ministro calcou sua ação no modelo lançado pelo Japão em 2015, o presidente precisou que o ensino superior deveria se concentrar na leitura, escrita e no cálculo, e que no lugar das ciências humanas, o Estado federal deveria investir nos domínios que trazem um “retorno sobre o investimento imediato” ao contribuinte, como a medicina veterinária, a engenharia e a medicina.

Por meio dessa declaração pública internacional, os signatários se colocam contra as graves consequências dessas medidas, que já fizeram o governo japonês voltar atrás após protestos nacionais e internacionais.

O pensamento crítico não é reservado aos ricos

Em primeiro lugar, a educação em geral e o ensino superior em particular não podem gerar retornos sobre o investimento imediato: trata-se de um investimento nacional nas gerações futuras.

Em segundo lugar, as economias modernas precisam não somente de competências técnicas especializadas, mas de uma formação intelectual ampla e geral às cidadãs e aos cidadãos.

Em terceiro lugar, não cabe à classe política, em nossas sociedades democráticas, decidir o que constitui um bom ou um mau saber. A avaliação dos conhecimentos e de sua utilidade não deve ser realizada pelo critério da conformidade a uma ideologia dominante

As ciências sociais e as humanidades não são um luxo; um pensamento crítico do mundo e uma compreensão rigorosa do funcionamento de nossas sociedades não podem ser prerrogativa dos mais ricos. Enquanto universitários de múltiplas disciplinas, nós compartilhamos uma convicção profunda de que nossas sociedades, inclusive o Brasil, necessitam de mais – e não de menos – educação. A inteligência coletiva é um recurso econômico e um valor democrático.

Alguns dos autores: Etienne Balibar, Universidade de Paris-Nanterre; Seyla Benhabib, Yale; Michel Bozon, Instituto Nacional de Estudos Demográficos da França (INED) ; Wendy Brown, Universidade da Califórnia em Berkeley ; Judith Butler, Universidade da Califórnia em Berkeley ; Sonia Corrêa, Sexuality Policy Watch ; Muriel Darmon, presidente da Association française de sociologie ; Didier Fassin, Institute for Advanced Study, Princeton; Eric Fassin, Universidade de Paris-VIII ; Zeynep Gambetti, Universidade do Bosphore – Bogazici – , Istanbul, Turquie ; Maria Filomena Gregori, Unicamp, presidente da Associação Brasileira de Antropologia; Sabine Hark, Universidade Técnica de Berlin ; Bernard Lahire, Ecole normale supérieure de Lyon ; Catherine Malabou, Universidade de Kingston, Londres,; Achille Mbembe, Universidade de Witwatersrand; Richard Miskolci, Unifesp; David Paternotte, Universidade livre de Bruxelles ; Mario Pecheny,, Universidade de Buenos Aires, Conselho Nacional de Pesquisa Científica (Conicet), Argentina; Larissa Pelucio, UNESP; Joan W. Scott, Institute for Advanced Study, Princeton; Gita Sen, Bangalore ; Lynn Stephen, Universidade de Oregon presidente da The Latin American Studies Association [ LASA] ; Sylvia Tamale, Universidade de Makerere; Anna Uziel, UERJ Mara Viveros Vigoya, Universidade da Colombie emBogota (UNAL), vice-presidente de LASA.

Para assinar o manifesto e visualizar a lista completa dos signatários: https://internationaledugenre.net/liste-des-signataires-contre-le-projet-de-jair-bolsonaro-de-supprimer-les-subventions-publiques-destinees-aux-etudes-de-sociologie-et-de-philosophie/.

Tradução de Pedro Micussi da versão publicada pelo jornal Le Monde.

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