Pela democracia na PUC–SP, abaixo a reforma da Fundasp!

A Igreja Católica pretende aprovar medidas que aceleram um projeto autoritário imposto na universidade paulista.

Alan Fontenele e Alexandre Terini 17 set 2018, 15:18

A comunidade da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) foi surpreendida, neste início de segundo semestre, com a notícia de que a Fundação São Paulo (Fundasp), mantenedora da universidade e representante da Igreja Católica, apresentou uma proposta ao Conselho Universitário (CONSUN) de “Reforma do Estatuto”, que na verdade é um pacote de maldades visando retrocessos sem precedentes na história da universidade.

Os principais pontos são: a extinção dos Departamentos; fim das eleições para Reitor, Diretores e Coordenadores de Cursos; o Reitor será escolhido somente pelo Cardeal e deverá professar a fé católica; os Diretores e Coordenadores escolhidos pelo Reitor; o fim da representação de alunos da Pós-Graduação no CONSUN; a extinção da Pró-reitoria de Planejamento e Gestão, que passaria a ser uma superintendência; a incorporação da Educ (livraria da PUC) pela Fundasp; e Encerramento Compulsório da Carreira Docente aos 75 anos.

A proposta foi formulada, mais particularmente, pelo Conselho Superior de bispos de São Paulo com participação da própria reitora Maria Amália Andery e presidida pelo grão-chanceler da Fundasp, Dom Odilo Scherer. Este último é o mesmo cardeal da ala conservadora da Igreja Católica que faz uma cruzada contra as reformas progressistas do Papa Francisco e que, no ano passado, apoiou o programa do ex-prefeito João Doria (PSDB) de distribuição de restos de comida vencida na merenda escolar e ao povo de rua, mais conhecido como “escândalo da ração humana”.

Dom Odilo é também aquele que desrespeitou a escolha dos estudantes, professores e funcionários nas eleições para Reitor da PUC-SP de 2012, escolhendo a terceira e última colocada na Lista Tríplice, a profa. Ana Maria Cintra, e quebrando assim com a tradição democrática na universidade conquistada com muita luta nos tempos da ditadura. Porém, este não foi o primeiro golpe na PUC-SP pelas mãos de Dom Odilo: em 2008, já havia sido feita uma reforma no estatuto à revelia da comunidade: o processo foi marcado, não apenas pela maior demissão em massa de professores e funcionários da história da PUC-SP, como pela criação do Conselho de Administração (CONSAD), composto por dois padres da Fundasp e o Reitor, tendo poder acima do CONSUN, que por sua vez tem a representação de funcionários e estudantes e professores de todas as Faculdades.

Há, sem dúvida, um projeto autoritário sendo gradualmente imposto na PUC-SP a doses homeopáticas, mas que chegamos ao seu auge neste momento em que, enfim, mostram abertamente suas garras para estrangular a democracia, centralizando o poder da universidade nas mãos da Fundasp. Mas por quê? Pois há, com isso, um projeto de precarização e mercantilização do ensino sendo implantado, que não se restringe apenas aos interesses da Igreja Católica, mas também aos do conglomerado das grandes empresas privadas da educação no país, os chamados “Tubarões do Ensino”, que lucram com suas “fábricas de diploma” em parceria com os bancos que lucram com o endividamento de estudantes bolsistas do programa do FIES. Os Tubarões do Ensino também estão interessados na implantação da Reforma Trabalhista aprovada pelo governo Temer, que já vem sendo implantada nas universidades privadas e públicas pelo Brasil, gerando piores condições de trabalho e demissões em massa. E tal projeto, por revoltar estudantes, professores e funcionários, só pode ser implantado na PUC-SP com a Fundasp assumindo o controle absoluto e eliminando qualquer resistência vinda da comunidade.

A PUC-SP, depois de anos aumentando absurdamente as mensalidades, cortando bolsas, fechando salas, turmas, disciplinas e cursos, precarizando o contrato e demitindo em massa professores e funcionários para contratar professores “rotativos” e funcionários terceirizados – tudo sob a justificativa de “cortar gastos para sanar a crise de endividamento” –, agora finalmente atingiu um saldo positivo no orçamento e ainda recebeu um empréstimo de 27 milhões do BNDES. Mas mesmo assim, nada mudou, apenas se aprofundou: seguem encarecendo as taxas e precarizando o ensino.

Se a Reitoria diz que o diferencial da PUC-SP é “a preocupação social aliada a excelência acadêmica” e tem o compromisso desde a sua fundação como “entidade de assistência social, filantrópica, não lucrativa” perante o Estado de conceder assistência aos alunos de baixa renda e oferecer serviços à comunidade em troca de isenção de alguns impostos (como está no próprio estatuto da universidade), onde está essa filantropia e preocupação social?

Com o novo estatuto proposto pela Fundasp, a tragédia em curso atingiria outro patamar: em primeiro lugar, o fim dos departamentos destruiria a espinha dorsal da universidade, onde a comunidade tem autonomia para determinar as relações trabalhistas e a formulação metodológica de cada curso, colocando a partir daí o poder na mão da Fundasp. Em segundo lugar, a Fundasp também teria o poder absoluto de eleger o Reitor e este, por sua vez, escolheria Diretores e Coordenadores de Curso.

Por último, o encerramento compulsório da carreira docente aos 75 anos envolveria a demissão de muitos dos professores mais antigos que carregam um diferencial de formação acadêmica e pedagógica e dão nome à PUC-SP em todo o país. Não por acaso, muitos destes foram ex-estudantes da universidade que resistiram à ditadura, à perseguição, à censura e à tortura e lutaram por um projeto de universidade democrática, acessível, popular e de qualidade com ensino crítico e emancipador. Época em que a universidade acolheu em seu quadro de acadêmicos e docentes, Paul Singer, Perseu Abramo, Octavio Ianni, Paulo Freire, Maurício Tragtenberg, Florestan Fernandes, e tinha como grão-chanceler da Fundasp o saudoso cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, que ao contrário do ultraconservador Dom Odilo, tanto fez pela restauração democrática e pelos direitos humanos no país.

Portanto, muito nos estranha quando a reitora Maria Amália Andery, que também foi parte dessa história, participar da elaboração dessa proposta abominável de cunho autoritário e mercantilista com o Conselho Superior dos bispos de São Paulo e depois vir à reunião do CONSUN declarar que “o debate será amplo, livre e democrático, envolvendo todos os segmentos da comunidade universitária”. Por acaso quer que os estudantes, professores e funcionários decidam se são a favor ou não de uma proposta que visa justamente acabar com o seu próprio poder de decisão dentro da instituição e ainda encerrar a carreira de uma parcela importante do quadro docente?

Certamente seria fundamental uma reforma do estatuto atual, mas no sentido de ampliar a democracia e os direitos já conquistados, quando o que querem com essa medida é o oposto: dar-lhes um golpe de morte. Por parte do movimento Juntos, nossa posição é categórica contra a proposta da Igreja de Dom Odilo, nos colocamos ao lado dos estudantes, professores e funcionários da PUC-SP por outro projeto de universidade: democrática, popular, crítica e emancipadora. Estão muito enganados se acham que podem simplesmente jogar todo o legado de luta e conquistas históricas no lixo para precarizar, mercantilizar e destruir o nosso ensino! Vai ter muita mobilização e resistência! Não vão nos calar! A PUC É NOSSA!

Artigo originalmente publicado no site do movimento Juntos!.


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