A negação da ciência e a lógica da exploração como política pública: ecossocialismo ou extinção!
A corrida perversa atrás do lucro e a lógica produtivista e mercantil da civilização capitalista está levando o planeta a um desastre ecológico.
Crescimento da poluição do ar, da água e do solo, aquecimento do planeta, destruição da camada de ozônio, destruição das florestas, redução da biodiversidade pela extinção de milhares de espécies, esgotamento dos solos, acumulação de resíduos, envenenamento alimentar, manipulações genéticas, “vaca louca”, “gripe suína”, pandemia do COVID-19.
Os sinais estão cada dia mais evidentes para ciência, e revelam que a corrida perversa atrás do lucro e a lógica produtivista e mercantil da civilização capitalista está levando o planeta a um desastre ecológico capaz de destruir os fundamentos naturais da vida humana.
No entanto, no Brasil de 2020, a negação da ciência e a lógica da exploração adotadas como política pública são um fenômeno que tem tomado proporções de emergência mundial. A insistência de que as “catástrofes naturais” não estão relacionadas com as atividades humanas e a falta de ações concretas para controlá-las, estão gerando consequências trágicas para o planeta.
Recentemente, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, na famosa reunião ministerial do dia 22 de abril, disse: “É uma oportunidade que nós temos, que a imprensa está nos dando um pouco de alívio nos outros temas, é passar as reformas infralegais de desregulamentação, simplificação. Grande parte dessa matéria se dá em portarias e normas dos ministérios que aqui estão, inclusive o de Meio Ambiente. Enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de imprensa, que só fala de Covid, e ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”.
Naquela ocasião, ainda estávamos no início da pandemia de Covid -19 no país, e o que se seguiu a partir de então, revela que o governo Bolsonaro acolheu a ideia do ministro de mudar normas e regulações ambientais, sem necessariamente passar pelo debate e votação no Congresso, aproveitando-se da tragédia que o país enfrenta, e que até agora ocasionou mais de 90.000 mortes, para através de atos administrativos desmontar políticas públicas ambientais negociadas ao longo de anos com a sociedade e aprovadas pelo poder legislativo.
Segundo o Instituto Talanoa, de março a maio, o governo federal publicou 195 atos relacionados ao meio ambiente, e nos últimos cinco meses o Ministério do Meio Ambiente publicou ao menos 22 decisões que fizeram concessões ambientais e que permitiram uma nova
interpretação de leis antigas. Destacam-se: a aberração de revogar a Lei da Mata Atlântica por despacho, a inaceitável extinção da fiscalização da exportação de madeira nativa e a tentativa de anistiar proprietários rurais que desmataram e ocuparam áreas de proteção ambiental até julho de 2008, sendo que o governo só voltou atrás de referida decisão depois que o Ministério Público recorreu à Justiça.
A política antiambiental de Jair Bolsonaro e Salles é gravíssima para o país. A revelação do objetivo de destruir regulações ambientais corrobora com a crise ecológica já instaurada no planeta, e expõe ainda mais o Brasil, cuja economia já vinha abalada antes da pandemia, eliminando de vez a credibilidade internacional do país, criando risco para investidores e ampliando a perda da nossa capacidade de fazer negócios. Além da degradação ambiental, a destruição adotada pelo atual governo nos custa empregos e vidas.
O governo Bolsonaro é o maior expoente hoje da lógica perversa do capitalismo, que se recusa a ideia de que a humanidade não é algo separado da natureza, e por isso insiste na dominação da natureza pelo homem, negando o conhecimento das leis da natureza. Por isso, para enfrentá-lo, se faz necessário reconhecer o paradigma capitalista, neoliberal e patriarcal que sustenta esse tipo de mentalidade, porque, como disse em recente entrevista o líder indígena e pensador Ailton Krenak, “se são toleráveis governos que praticam e confessam, incitam esse tipo de violência contra a vida, a questão agora não é julgar a escolha que um ou outro desses tecnocratas faz do seu vocabulário ou da sua práxis, mas seria perguntar que paradigma civilizatório produz esse tipo de mostrengos”.
Michael Löwy, no livro Ecologia e Socialismo coloca o ecossocialismo como a práxis de enfrentamento ao paradigma atual, afirmando que o grande desafio para uma renovação do pensamento marxista é a questão ecológica, que exige dos marxistas uma revisão crítica profunda da concepção tradicional de “forças produtivas” e uma ruptura radical com a ideologia do progresso linear e com o paradigma tecnológico e econômico da civilização moderna.
Falta a Marx e Engels uma perspectiva ecológica de conjunto, no entanto, não é difícil encontrar nos escritos destes autores exemplos de uma real sensibilidade à questão do ambiente natural da atividade humana. Nos Manuscritos de 1844, Marx se refere ao comunismo como “a verdadeira solução para o antagonismo entre o ser humano e a natureza”, e assim escreve: “Dizer que a vida psíquica e intelectual do homem está indissoluvelmente ligada à natureza não significa outra coisa senão que a natureza está indissoluvelmente ligada com ela mesma, pois o homem é uma parte da natureza”.
Na Crítica ao Programa de Gotha, Marx e Engels deixam explícito a relevância da natureza na formação das verdadeiras riquezas ao dizer: “ O trabalho não é a fonte de toda riqueza. A natureza é fonte dos valores de uso (que são, de qualquer forma, a riqueza real!) tanto quanto o trabalho, que não é em si nada além da expressão de uma força natural, a força de trabalho do homem.”.
Portanto, para o enfrentamento da política de destruição proposta pelo governo Bolsonaro, fundada no paradigma capitalista, nossa luta precisa necessariamente ter como objetivo um socialismo ecológico, que nos dizeres de Michael Löwy seria uma sociedade ecologicamente racional fundada no controle democrático, na igualdade social e na predominância do valor de uso, uma sociedade que supõe a propriedade coletiva dos meios de produção, um planejamento democrático que permita à sociedade definir os objetivos da produção e os investimentos, e uma nova estrutura tecnológica das forças produtivas.
É nosso dever, que consta no Manifesto Ecossocialista Internacional, “rejeitar todo tipo de eufemismos ou propagandas que suavizem a brutalidade do sistema: todo mascaramento de seus custos ecológicos, toda mistificação dos custos humanos sob os nomes de democracia e direitos humanos. Ao contrário, insistimos em enxergar o capital a partir daquilo que ele realmente te fez”.
O enfrentamento a destruição ambiental de Bolsonaro, exige uma ação cuidadosamente planejada, coordenada e urgente, que está muito além da lógica competitiva do capitalismo, que busca sempre aumentar o acúmulo de valores o mais rápido possível. A ciência é muito clara: temos que agir agora, mudar nosso nível de consumo e o uso dos recursos naturais do planeta e construir uma nova sociedade mais igualitária e sustentável.
Se o governo Bolsonaro não demonstra comprometimento socioambiental, como ficou claro na fala especista do ministro, e não tem receio de “passar a boiada”, se aproveitando da tragédia em que o país se encontra submerso, também não tememos apontar a lógica de morte que está por trás das medidas por ele adotadas. É dessa forma que retomamos à dura escolha apresentada por Rosa Luxemburgo: “Socialismo ou Barbárie”, mas sob a nova face impressa na contemporaneidade: “Ecossocialismo ou Extinção”!
Fontes:
https://elasticaoficial.com.br/especiais/ailton-krenak-entrevista-politica-natureza/
https://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2020/07/governo-acelerou-canetadas-sobre-meio-ambiente-durante-a-pandemia.shtml
LÖWY, Michel. “Ecologia e Socialismo”. São Paulo: Cortez Editora, 2005.
MARX, Karl. “Manuscritos de 1844”. Paris: Editions Sociales, 1962.
MARX, Karl e ENGELS, Friederich. “Crítica ao Programa de Gotha”. Paris: Editions Sociales, 1950.