Em Israel, Bibi acabou?
Notas sobre o governo israelense.
Notas sobre o novo governo israelense
O governo anunciado, se receber o voto de confiança do parlamento, não é surreal a ponto de arriscar implodir no primeiro obstáculo sério, dando novamente chance a Netanyahu? Por que essa coalizão com duas lideranças sucessivas (primeiro Naftali Bennet, depois Yair Lapid) vai dos islamistas de Raam (Mansour Abbas) aos ultra-nacionalistas de À direita (Bennet), do partido sionista de esquerda Meretz (Nitzan Horowitz) ao Nova Esperança do ex-likudnik Gideon Saar, dos trabalhistas (Merav Michaelo) ao partido russo Israel Nossa Casa (Avigdor Liberman), sem esquecer o “centrista” Há Um Futuro (Lapid) e os restos do partido Azul e Branco.
Um governo muito à direita
[Outra questão]: supondo que essa coalizão realmente tome corpo, sua política se diferenciará de fato daquela de Netanyahu? Certamente, o quarteto que deverá conduzir esse governo – Bennet, Lapid, Sa’ar e Liberman – terá no seu interior necessariamente a presença da “esquerda sionista”, sem a qual ele não obteria a maioria. Ele até teve que prometer alguma coisa ao partido de Raam. Mas será mais do que surpreendente se os islamistas, os trabalhistas e mesmo Meretz se opuserem frontalmente às “cabeças” do gabinete, supondo que eles assim o desejam, sob o risco de destruir a coalizão e permitir, assim, o retorno de… Netanyahu.
Dito isso, nós temos que lidar com um governo que se inclina claramente à direita, mesmo que ele tenha o mérito – esperamos, ao menos – de “limpar” Netanyahu, condição necessária para qualquer evolução. Bennet, Liberman e Sa’ar são ideologicamente e politicamente homens de direita, e até mesmo, para o primeiro, de extrema-direita – e o que dizer de Ayelet Shaked, que um dia posou ao lado de um frasco de perfume intitulado “Fascismo”? Sua política palestina não se difere do governo de saída – À Direita é um partido anexionista e Israel Nossa Casa uma formação transferista, e ambos prometem aos colonos que eles não interromperão… a colonização. Eles possuem também em comum com Likud uma visão neoliberal da economia e da sociedade. Eles poderão perseguir essas políticas “exterior” e doméstica se aproveitando de certa virgindade reencontrada. Há quem se reivindique voluntariamente do movimento que, desde o último verão, mobilizou multidões, massivas, mas heteróclitas, unidas por uma só vontade: acabar com Netanyahu?
Razões para a esperança?
Única mudança provável: essa equipe será menos sensível às chantagens dos partidos ultraortodoxos que, ao menos por algum momento, não participarão dele. De repente, os “laicos” – que não são somente Horowitz e Michaeli, mas também Lapid e Liberman – poderão impulsionar a coalizão para novas considerações das aspirações majoritárias a respeito do casamento e do divórcio civil, do funcionamento dos transportes públicos aos sábados, e de certo controle dos setores de ensino religioso – quer dizer, um distanciamento do Estado em relação à Sinagoga.
Outra (tímida) esperança para a esquerda em Israel: que a mudança de equipe permita acabar com a evolução autoritária dos últimos governos. E a lei “Estado-nação do povo judeu?” e do apartheid que ele oficializa? E o arsenal liberticida votado por Knesset? E as ameaças contra o estatuto e as competências da Suprema Corte? Visto pela correlação de forças global e no próprio interior da coalização, uma verdadeira reversão dessa tendência, contudo, suporia uma mobilização popular para a preservação do que resta de democracia após um reinado de quinze anos de Netanyahu.
Como, aliás, considerar uma ruptura franca e clara de conjunto com as direções escolhidas pelos governos anteriores? Quatro eleições consecutivas confirmaram que, se uma (apertada) maioria de israelenses não queriam mais Netanyahu, uma (larga) maioria permanece à direita, à extrema-direita e no campo ultra-hortodoxo: 72 deputados num total de 120. Além do que, sobre a questão palestina, nem a “esquerda” sionista – salvo Meretz, nem os centristas demonstram uma perspectiva clara, rejeitando, de fato, a anexação, mas sem advogar, por outro lado, a criação de um verdadeiro Estado palestino.