Nota sobre a marcha federal argentina

Nota sobre a marcha federal argentina

Direto de Buenos Aires, uma reflexão sobre a recente marcha argentina.

Vitor Cesario 13 maio 2022, 14:37

Em meio ao vai e vem portenho, em todos os quatro cantos da cidade da fúria, é impossível pegar um ônibus, sentar-se em um bar ou ir a uma lotérica pagar as contas sem escutar conversas sobre as vacas magras que pastam nestes pampas. Além das paisagens planas, a crise econômica também assola o Norte, Nordeste, Oeste e Sul da Argentina. O país conta com praticamente 55% de sua população vivendo em situação de pobreza, a maior inflação dos últimos 20 anos, limitação dos planos de assistência social e desemprego.

E o governo progressista de Alberto Fernandes e Cristina Kirchner? Bem, o governo que foi eleito prometendo a volta dos tradicionais ‘asados’ e o fim da era de crise promovida por Macri e sua turma, hoje não consegue garantir polenta no prato dos trabalhadores e prefere fazer acordos com o Fundo Monetário Internacional para pagar uma dívida ilegítima e seguir propagando o ajuste fiscal. Além da crise econômica, a cúpula do governo nacional não se fala há dois meses, mas La Campora e outras organizações kirchneristas não têm como horizonte o rompimento com Alberto Fernandes e sua equipe econômica. Tampouco pretendem mobilizar contra o acordo com o FMI e o consequente ajuste econômico.

Esse cenário leva o povo argentino a rezar de joelhos à Nossa Senhora de Luján, ascender velas para Gauchito Gil e apostar na luta popular como meio de transformação da realidade. Nesta perspectiva, as trabalhadoras e trabalhadores argentinos se organizaram através do movimento piqueteiro para fazer uma ‘marcha federal’ e cruzaram o país inteiro em um ato de 3 dias que terminou na cidade de Buenos Aires.

Gritando por trabalho genuíno, contra a pobreza e a fome, o primeiro dia da ‘marcha federal’ foi marcado por atos em Formosa, Santa Fé, Corrientes e cidades da província de Misiones. Além das manifestações, se formaram 4 caravanas que saíram de La Quiaca, Chaco/Corrientes, San Juan/Mendoza e da Patagônia em direção à Praça de Maio. Durante o segundo dia ocorreram atos em Córdoba, Rosario, Bahía Blanca e Mar del Plata e mais ônibus saíram dessas cidades rumo à capital federal argentina. O terceiro e último dia foi caracterizado pela confluência das caravanas e a adesão de trabalhadores/as portenhos e bonaerenses à ‘marcha federal’. O resultado foi uma manifestação de aproximadamente 150 mil pessoas que, saindo desde Retiro, Onze e Constitución travaram as principais avenidas de Buenos Aires e marcharam até a Casa Rosada.

É importante destacar o protagonismo dos movimentos sociais e dos partidos políticos da esquerda argentina que constroem o movimento piqueteiro, as organizações territoriais e os diversos centros de cultura, trabalho e educação nos bairros mais pobres e villas do país. Além disso, é fundamental racializar a ‘marcha federal’, composta por uma diversidade etnico-racial que coloca em cheque o mito colonial argentino – reproduzido por Alberto Fernandes recentemente – de que todos são brancos e descendentes de europeus. O que se pôde observar nas ruas foi a presença massiva de pretos, pardos e indígenas lutando por comida no prato e levantando bandeiras plurinacionais como a Whiphala e a bandeira mapuche.

Se Alberto Fernandes e Cristina Kirchner se pintaram como messias salvadores da pátria durante a campanha em 2019, hoje a realidade da Argentina é a de um país afogado na crise, com alta inflação, baixos salários, péssimas condições de trabalho, desemprego e fome. Além disso, há uma caducidade dos planos de assistência social que já não alcançam para a cesta básica e uma dificuldade de se conseguir novos planos. O movimento piqueteiro cruzou o país para dizer que a pobreza e a fome não vão fazer parte do dia a dia das argentinas e argentinos, e que frente a falsos profetas a resposta é a luta coletiva dos trabalhadores e trabalhadoras. A ‘marcha federal’ foi um ato histórico e de coragem. Deve servir como inspiração para lutadores e lutadoras de toda América Latina e para o avanço das mobilizações na Argentina.

(Foto por Buenos Aires Times)


TV Movimento

Encruzilhadas da Esquerda: Lançamento da nova Revista Movimento em SP

Ao vivo do lançamento da nova Revista Movimento "Encruzilhadas da Esquerda: desafios e perspectivas" com Douglas Barros, professor e psicanalista, Pedro Serrano, sociólogo e da Executiva Nacional do MES-PSOL, e Camila Souza, socióloga e Editora da Revista Movimento

Balanço e perspectivas da esquerda após as eleições de 2024

A Fundação Lauro Campos e Marielle Franco debate o balanço e as perspectivas da esquerda após as eleições municipais, com a presidente da FLCMF, Luciana Genro, o professor de Filosofia da USP, Vladimir Safatle, e o professor de Relações Internacionais da UFABC, Gilberto Maringoni

O Impasse Venezuelano

Debate realizado pela Revista Movimento sobre a situação política atual da Venezuela e os desafios enfrentados para a esquerda socialista, com o Luís Bonilla-Molina, militante da IV Internacional, e Pedro Eusse, dirigente do Partido Comunista da Venezuela
Editorial
Israel Dutra | 20 fev 2025

Altas temperaturas no cenário político

A emergência climática, a crise do governo Lula e a pressão pela prisão de Bolsonaro aquecem o cenário político
Altas temperaturas no cenário político
Edição Mensal
Capa da última edição da Revista Movimento
Revista Movimento nº 55-57
Nova edição da Revista Movimento debate as "Encruzilhadas da Esquerda: Desafios e Perspectivas"
Ler mais

Podcast Em Movimento

Colunistas

Ver todos

Parlamentares do Movimento Esquerda Socialista (PSOL)

Ver todos

Podcast Em Movimento

Capa da última edição da Revista Movimento
Nova edição da Revista Movimento debate as "Encruzilhadas da Esquerda: Desafios e Perspectivas"