Por que devemos apoiar a rebelião popular no Peru?
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Por que devemos apoiar a rebelião popular no Peru?

Mais de 20 anos depois, o povo peruano colocou em marcha uma luta de massas contra um governo que quer se afirmar com elementos ditatoriais

Israel Dutra 24 jan 2023, 12:22

Neste exato momento, há uma luta duríssima em andamento no Peru. Por um lado, um levante popular, que teve como ponto alto a greve geral da última quinta-feira, 19 de janeiro; por outro, um governo golpista, cada vez mais isolado, que se aferra à repressão para sustentar seu programa e iniciativas. Essa batalha em curso é decisiva para o futuro do Peru e do continente.

Estamos, na Revista Movimento, fazendo uma cobertura cotidiana, conversando com os protagonistas do processo, mobilizando a solidariedade internacional, acompanhando de “perto” a heroica luta do povo peruano. Estive durante algumas semanas em Lima, como correspondente da Movimento, levando a solidariedade do MES e do PSOL aos lutadores que se levantam.

Aqui, de forma resumida, colocamos a dinâmica dos últimos acontecimentos e a necessidade de um posicionamento da esquerda brasileira e do governo Lula quanto à crise institucional aberta pelos golpistas do governo Dina Boluarte.

A marcha dos 4 Suyos, 20 anos depois

Como sabemos, em 7 de dezembro passado, Castillo sofreu um golpe parlamentar, após tentativa desastrada de destituir a maioria direitista do Congresso Nacional. Fruto dessa ação palaciana, sua vice, Dina Boluarte, tornou-se presidente. Castillo foi detido e preso.

Para se consolidar no poder, Boluarte escolheu figuras de direita para o ministério e seu entorno – com destaque para Willians e Otarola. Desde os primeiros dias de governo golpista, o sul-peruano protagonizou diferentes protestos e manifestações, aos quais o Boluarte respondeu com mais repressão. O ano terminou com saldo de mortes de ativistas, e esperança, por parte do governo, de uma trégua nas festas de Natal que estabilizasse a situação.

Contudo, a força da intervenção dos camponeses e trabalhadores do sul do Peru (em sua ampla maioria, de origem indígena Aymará e Quechua) levou a uma verdadeira insurreição popular na província de Puno, nos primeiros dias de janeiro de 2023. Dentro desse contexto, o governo promove o massacre de Juliaca, deixando 18 mortos – um dos capítulos mais trágicos da história peruana.

A indignação cresceu, tomou conta de todo sul e se espalhou pelo país. No dia 19 de janeiro, foi convocada uma nova “Marcha dos 4 Suyos”. Esse nome remete à manifestação que teve lugar em julho de 2000 e foi o detonante da queda da ditadura de Alberto Fujimori. Os “quatro suyos” foram os quatro pontos políticos afluentes das diferentes regiões do país, durante o período incaico.

Mais de 20 anos depois, o povo peruano colocou em marcha uma luta de massas contra um governo que quer se afirmar com elementos ditatoriais. 

A greve geral foi um grande êxito. A Marcha dos 4 Suyos foi chamada pela imprensa como “A Tomada de Lima” por conta das centenas de delegações que chegaram por toda parte.  As ruas da capital peruana ficaram vazias, quase como num domingo ou feriado. Além dos manifestantes do interior, delegações dos bairros e distritos afastados, vindos dos cerros, marcharam até o centro de Lima para repudiar o governo e pedir a renúncia de Dina, além do fechamento do Congresso, novas eleições e uma Assembleia Constituinte.

A greve do dia 19 nacionalizou, definitivamente, a rebelião popular peruana. Protestos radicalizados foram realizados nas províncias do norte, com quase 100 pontos de bloqueio de estradas, com amplo apoio popular.

Governo insiste na repressão

A marcha do dia 19 terminou em grandes batalhas nas ruas do centro de Lima. Houve um incêndio num prédio histórico, utilizado pela imprensa e pelo governo para dispersar e criminalizar os atos.

Nos dias seguintes, Dina foi pra TV se defender, afirmar que se manteria no cargo e que iria seguir com a linha de “ordem”. A Universidade de San Marcos foi invadida pelas forças de repressão no dia 20 de janeiro, com tanques e bombas, terminando com a prisão de 200 ativistas. Já tivemos quase 60 mortos ao longo desse processo, 600 detidos, além da prisão de lideranças da Frente em defesa de Arequipa, acusados de terrorismo.

Em constante perda de apoio, o governo se sustenta em um giro repressivo. Além da ação policial ostensiva, combina uma marca narrativa com a perseguição e criminalização de ativistas. O discurso direitista tem dois pilares: o tradicional “terruqueo”, que significa imputar aos oponentes políticos a relação com grupos terroristas, evocando a memória das ações de grupos que atuaram nos anos 80 e 90; e o ataque à Evo Morales, afirmando que o líder do MAS boliviano estaria por trás dos protestos no Sul, com o objetivo da secessão do país. O absurdo dessa narrativa tem como objetivo impedir o avanço da rebelião.

A atual situação é de um governo cada vez mais débil, politicamente, amparado nas forças repressivas e nos setores mais reacionários do congresso odiado. As pesquisas mostram que 70% querem uma nova constituição; 88% rechaçam o governo e 75% não confiam na atual composição do Congresso.

O governo está se isolando inclusive entre as classes médias, das grandes cidades, como Lima.

A Esquerda precisa apoiar a luta democrática no Peru

Chegamos a um momento decisivo da crise nacional marcada pela rebelião peruana.

Nas ruas e estradas do Peru, se joga o futuro da luta continental. Hoje, a extrema direita se entrincheira na Bolívia contra o governo do MAS, no Brasil com os bolsonaristas, e no Peru, para sustentar o governo de Dina, abrindo caminho para a volta do clã Fujimori ao poder.

Em meio a reunião da Celac, os governos da América do Sul deveriam estar comprometidos em apoiar a rebelião peruana. O governo de Petro apontou um caminho, condenando a invasão da Universidade de San Marcos. A omissão por parte de setores da esquerda apenas ajuda na sustentação do giro repressivo de Dina. O presidente da Argentina, Alberto Fernandez, em entrevista para o jornal Folha de São Paulo, em 23 de janeiro, citou que tinha preocupações com a “instabilidade” no Peru, sem citar nomes ou apontar as claras responsabilidades do governo. Lula, por sua parte, e a diplomacia brasileira não se pronunciaram sobre as chacinas e violações de direitos fundamentais que vêm ocorrendo nas últimas semanas. É preciso alterar essa rota e tomar lado diante dessa batalha.

O PSOL, que aprovou ainda em dezembro, no seu Diretório Nacional, uma nota de apoio ao povo peruano, está jogando para cercar de solidariedade a rebelião em curso. Participamos de atos nas embaixadas, a deputada Fernanda Melchionna, junto à bancada, questionou o governo peruano pela violência e oficiou os órgão responsáveis no Brasil sobre a transação e venda de armas para as forças repressivas do governo do Peru.

A heroica luta do povo peruano merece nosso apoio.


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