França: o confronto para fazer Macron ceder
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França: o confronto para fazer Macron ceder

Uma análise das recentes mobilizações na França contra a reforma da aposentadoria proposta pelo presidente Macron.

Léon Crémieux 10 fev 2023, 16:00

Após as grandes manifestações de 19 de janeiro, cuja dimensão já era comparável às grandes manifestações de 1995 e 2010 (durante as mobilizações contra os ataques governamentais anteriores contra o sistema de aposentadoria), nas manifestações de 31 de janeiro os ponteiros ficaram frenéticos : mais de 2 milhões de mulheres e homens nas ruas de acordo com a Intersindical, a CGT anunciando o número de 2,8 milhões, sendo 500.000 em Paris. Na capital, mesmo ficando nas avenidas principais, o desfile teve que ser dividido para que a manifestação não fosse bloqueada em seu ponto de partida, a Place d’Italie. Em quase todas as cidades – 270 comícios aconteceram em grandes, pequenas e médias cidades – as desfiles foram maiores do que os de 19 de janeiro.

Até mesmo os números do Ministério do Interior – 1,27 milhões – são os mais altos para um dia de manifestações nos últimos 30 anos. É um verdadeiro levante em massa das classes trabalhadoras com, como ficou patente nos desfiles, um maior número de funcionários do setor privado, na maioria das vezes grevistas. A massividade deste dia refletida em todas as pesquisas de opinião apontam um crescente repúdio ao projeto de contrarreforma do governo – mais de 80% dos funcionários -, um apoio majoritário ao movimento grevista, e o sentimento de que será necessário ir além das manifestações e bloquear a atividade econômica do país para forçar Macron e Borne a retirarem seu projeto.

Os estudantes, do ensino médio e universitário, estavam bem presentes: 300 escolas secundárias mobilizadas, sendo 200 bloqueadas por piquetes com a polícia querendo quebrar violentamente os bloqueios, dezenas de universidades. Ao todo 150.000 jovens se mobilizaram de acordo com a contagem das organizações da juventude, três vezes mais do que no dia 19 de janeiro.

Estamos unidos e determinados para que este projeto de reforma previdenciária seja retirado“, assim se encerra a declaração das 8 confederações que acabam de anunciar dois novos dias de mobilizações, nos dias 7 e 11 de fevereiro. Esta declaração intersindical é importante em dois níveis. Primeiramente, a frente sindical está sendo mantida por sindicatos que frequentemente se dividiram nos últimos anos em face de projetos governamentais. Em segundo lugar, e este é um precedente há mais de 10 anos, as lideranças sindicais estão de acordo em impor uma retirada pura e simples do projeto do governo, que se baseia em dois pilares: o adiamento da idade da aposentadoria de 62 para 64 anos e a rápida transição para um mínimo de 43 anos de trabalho para obter uma aposentadoria integral.

É evidente que estamos caminhando para um confronto político e social de grandes dimensões nas próximas semanas.

Apesar dos batalhões de “especialistas” e comentaristas que, em toda a mídia, procuram apoiar e explicar os méritos desta reforma, apesar da romaria dos ministros e deputados macronistas e republicanos nos estúdios de rádio e televisão, a rejeição da reforma, longe de se enfraquecer, não parou de crescer nas últimas semanas. No entanto, Macron não hesitou em convidar 10 editorialistas de 10 meios de comunicação (Le Monde, Les Echos, Le Figaro, BFM, RTL, entre outros) para “inculcar” os elementos da linguagem a serem usados para destilar uma propaganda eficaz em favor a reforma previdenciária. Mas cada explicação adicional só fez aumentar a hostilidade.

Notadamente entre as mulheres, que logo entenderam que sofreriam mais ainda com esta reforma. Enquanto as mulheres assalariadas na França têm, em média, um salário 22% inferior ao dos homens, elas têm uma aposentadoria 40% mais baixa, devido principalmente ás carreiras truncadas e incompletas, uma vez que, na maioria dos casais, elas têm que se submeter ao trabalho em tempo parcial e demissões para cuidar dos filhos e das tarefas domésticas da família, e que representam a maioria das famílias monoparentais.

O efeito mecânico da mudança para 64 anos de idade e 43 anos de serviço para se aposentar seria tornar ainda mais difícil a obtenção de uma aposentadoria completa e destruiria o bônus de dois anos de tempo de serviço para efeito de aposentadoria (apenas um ano no setor público) para cada filho que permitia antecipar a idade da aposentadoria. Os trabalhadores precários e pouco qualificados ou aqueles que estão muito desgastados por trabalhos penosos também sabem que iriam formar a maior parcela dos que não terão condições de permanecer no emprego entre os 62 e 64 anos de idade

Ao contrário do que a primeira-ministra Elizabeth Borne explica, a rejeição maciça e crescente não vem de uma falta de pedagogia [do governo], mas sim da compreensão da população do conteúdo da reforma. As mulheres, as longas carreiras e as mais precárias sofrerão mais com esta reforma. Tudo isso torna ainda mais insuportável a arrogância de ministros como Darmanin [a cargo da polícia] e Attal [planejamento], entre outros políticos profissionais desde que saíram da universidade e que tem a ousadia de hostilizar aqueles que não querem trabalhar por mais tempo e ousando se reclamar, diante dos grevistas, da “França que quer trabalhar”.

Além disso, como havia sido o caso durante os grandes movimentos anteriores em defesa das aposentadorias, os argumentos falaciosos do governo foram amplamente desmantelados e combatidos pelos militantes do movimento sindical e do movimento social com um amplo uso de argumentos vindos de economistas antiliberais. Assim, Macron e Borne ainda afirmam querer “salvar o sistema ameaçado pela demografia”.

De acordo com eles, o aumento do número de aposentados e a diminuição do número de trabalhadores colocarão em perigo o sistema. Ironicamente, são os números oficiais detalhados pelo Conseil d’Orientation des Retraites (COR) e as intervenções de seu presidente Pierre-Louis Bras – ex-diretor da Previdência Social e Inspetor Geral de Assuntos Sociais – que colocam abaixo o argumento oficial: “Os gastos com aposentadorias estão globalmente estabilizados e, mesmo a muito longo prazo, diminuem em três hipóteses entre quatro…. Assim, os gastos com pensões não fogem do controle… e na única hipótese retida pelo governo, diminuem muito pouco, um pouco mesmo a longo prazo. As despesas com pensões não estão saindo do controle, mas não são compatíveis com a política econômica do governo e os objetivos das finanças públicas“, declarou ele na quinta-feira 19 de janeiro perante a Comissão de Finanças da Assembleia Nacional.

Estes objetivos são bem conhecidos: devem respeitar os critérios de convergência da União Europeia e alcançar um déficit público de 2,9% do PIB em 2027. Bruno Le Maire se comprometeu com isso na “trajetória orçamentária” apresentada no verão passado à Comissão Europeia, que se compromete a aplicar a reforma do sistema previdenciário a fim de reduzir sua participação nos gastos públicos. Deve-se notar também que o verdadeiro problema que aparece no relatório do COR sobre a evolução financeira do sistema de aposentadorias não vem das despesas, mas sim das receitas e, em particular das contribuições dos funcionários e empregadores dos 2,2 milhões de funcionários públicos dos setores local e hospitalar, que representaram 22 bilhões de euros de receitas em 2021. Nos dados sobre a conta salarial pública, comunicados à COR pelo Ministério do Planejamento, é surpreendente notar que o total de funcionários desses dois serviços públicos permanecerá praticamente o mesmo até 2027, com um congelamento virtual dos salários.

Portanto, não há projeção de contratações (exceto para 15.000 trabalhadores hospitalares) ou de aumentos salariais para 2,2 milhões de funcionários públicos. Isto significaria, se estes números fossem reais, uma queda de 11% no salário real dos funcionários públicos até 2027. O déficit para o sistema de aposentadoria a partir desses números seria de aproximadamente 3 bilhões por ano, o que estaria disponível para o sistema se os salários do serviço público seguissem as projeções usadas para todos os salários. Então trata-se de uma subestimação deliberada dos recursos da Caisse des Retraites [o fundo previdenciário] através dos números comunicados ao COR pelo governo para dar credibilidade a desequilíbrios financeiros no horizonte 2027.

O Estado está dramatizando as contas do sistema de aposentadoria para, mais uma vez, fazer os funcionários pagarem pelo retorno aos critérios de Maastricht para os gastos públicos, apresentando como irresponsáveis aqueles que estão dispostos a permitir que os alegados déficits cresçam. O relatório dos pesquisadores do IRES baseados em Lille é, portanto, interessante. Em 2019, eles estimaram o montante total das ajudas às empresas em 157 bilhões, entre baixa das contribuições sociais, isenções fiscais e outros “mimos”. 157 bilhões são 6,4% do PIB, mais de 30% do orçamento do Estado. Todos os auxílios às empresas representavam apenas 2,4% do PIB em 1979. Assim, se estamos preocupados com o equilíbrio do sistema de previdência social, que supostamente se baseia nas contribuições do empregador e dos empregados, deve-se observar que em 1995 as empresas representavam 65,2% do financiamento da previdência social. A participação caiu para 46,9% em 2020 “graças” aos cortes nas contribuições destinadas a “reduzir o custo da mão-de-obra”. No orçamento de 2023 o montante dos dispositivos de isenção fiscal é de 85 bilhões.

O governo visivelmente assumiu estar enfrentando a dupla hostilidade de todo o movimento sindical, de 80% dos empregados e da população em geral, e que não tem com convencer mais ninguém. Então quer ir rápido com dois objetivos: tentar desencorajar os trabalhadores e esgotar o movimento, proclamando que qualquer mobilização é e será inútil (“o adiamento para 64 anos não é mais negociável“, declarou Elizabeth Borne (na segunda-feira passada, 30 de Janeiro), que a reforma será votada rapidamente, sem nenhuma mudança, e que não haverá nenhum ajuste nos pontos fundamentais. No entanto, ele não quer aparecer isolado na Assembleia Nacional e no Senado.

Tendo incluído sua reforma no projeto de lei retificador de financiamento da Previdência Social (PLFSS) o uso do artigo 47-1 da Constituição, através de uma manipulação institucional, permitirá de ir rapido limitando os debates na Assembleia a 20 dias e o conjunto dos debates a 50 dias. Assim, o governo se dá o direito, caso a votação não ocorra dentro do prazo estabelecido, de legislar por medidas e decreto, contornando o Parlamento. Tem também, se necessário, o artigo 49-3 que lhe permite impor ‘na marra’, sem votação, colocando aem jogo a confiança do governo. Trata-se, então, de ir rápido procurando costurar um acordo com a liderança dos Republicanos [direita] cujos deputados e senadores podem dar-lhe uma maioria em ambas as câmaras.

Mas mesmo neste campo da direita de Macron e dos Republicanos, as coisas ainda não estão resolvidas. Até hoje, 16 deputados dos Republicanos e afins sobre 62 se recusam a votar o projeto Macron na Assembleia (Edouard Philippe’s Horizon -29 votos e François Bayrou’s MODEM -51 votos) afirmam várias discordâncias não querendo deixar o papel de fazedor de maioria somente para os Republicanos. Renascimento, o partido de Macron e Borne, tem apenas 169 assentos num total de 577 e precisa reunir 289 votos para obter maiorias.

As negociações serão ainda mais tensas porque uma grande parte da base eleitoral destes parlamentares também é hostil à reforma. O que está em jogo para todos estes partidos e seus representantes eleitos é seu posicionamento no contexto das próximas eleições (presidenciais e legislativas) em 2027. O governo, Bruno Lemaire, Ministro de Economia e Finanças, está jogando sua credibilidade contra Gérard Darmanin, Ministro do Interior, como candidato a sucessor de Macron no partido presidencial. Tem jacarés demais no pântano capitalista neoliberal! O risco é grande de cada corrente da maioria tocar sua própria partitura neste projeto de lei, enfraquecendo a postura de falsa serenidade do governo, já desestabilizada pela mobilização popular.

Além disso, o campo Macron está jogando um jogo perigoso, ao gabar-se constantemente nas últimas semanas que sua reforma é democraticamente legítima porque já a anunciara durante a campanha presidencial de 2022. Esta fanfarronada provoca revolta no movimento sindical e entre os eleitores de esquerda, pois Macron só ganhou, apesar de seu programa, graças aos partidos NUPES e ao movimento sindical, que assim decidiram para bloquear Marine Le Pen. Macron teve apenas 20% dos eleitores inscritos em seu programa político no primeiro turno. Este desprezo por seus eleitores do segundo turno teria, sem dúvida, como consequência que a “barragem republicana” em prol de um candidato da direita macronista contra a Marine Le Pen não teria mais eficácia se uma configuração desastrosa idêntica ocorresse em 2027.

Em outro nível os líderes macronistas e seus turiferários da mídia vêm blefando ao afirmar, há semanas, que o movimento sindical está tão enfraquecido e dividido que será incapaz de se unir ou agir efetivamente a longo prazo, pensando que o corpo social voltará rapidamente a cair em resignação e apatia. Na pior das hipóteses, eles preveem uma repetição do cenário de 2010. Na época, diante do projeto de reforma previdenciária de Sarkozy que elevou a idade da aposentadoria de 60 para 62 anos, o protesto unitário se esgotou com sete meses de manifestações e greves que nunca paralisaram a vida econômica do país nem impediram que a reforma passasse.

E para tentar evitar outro cenário mais perigoso para eles, levantam o espectro de possíveis “bloqueios” no transporte ou no abastecimento de combustível, alegando que isso rapidamente desacreditará e paralisará as greves. Esta é uma tentativa de apagar o fato de que em 1995, os milhões de trabalhadores bloqueados por três semanas de greve deram um apoio notável aos grevistas da SNCF e da RATP. Também é importante lembrar que nos últimos dias a maioria dos trabalhadores se convenceu de que é necessário bloquear a vida econômica a fim de obter a retirada do projeto.

Talvez seja mesmo a convicção de que podemos ser fortes e determinados o bastante para vencer que pode ser o melhor elemento para favorecer um grande apoio popular a greves paralisando o transporte ou distribuição de combustível. Além disso em 1995, ao contrário de hoje, a greve dos transportes foi acima de tudo uma greve “por procuração”, sendo os ferroviários e metroviários a ponte bastante solitária do confronto, e a liderança confederal do CFDT se opondo à greve e apoiando o plano do então Primeiro Ministro Alain Juppé. No entanto, apesar de sua soberba, Juppé teve que recuar e retirar seu plano. Portanto, existem hoje dois fatores mais favoráveis: uma ampla unidade sindical, um aumento do poder de luta de vários setores profissionais… e também um terceiro que é precisamente a experiência de 2010 compartilhada por muitas equipes sindicais.

Logo, é possível fazer tão bem quanto em 1995, e ainda melhor, evitando ao mesmo tempo os erros de 2010. Na queda de braço que está começando pode muito bem haver um desmoronamento marginal da direita no parlamento, mas na pior das hipóteses o governo mantém o recurso do 49-3 e a aprovação de decretos e portarias se, no final de março, o prazo para o debate terminar antes da votação final. Assim, além de uma possível crise política devido à pressão sofrida dentro da direita, o elemento decisivo para vencer e forçar Macron a retirar seu projeto será o bloqueio econômico e a convicção na classe dominante de que esta reforma não vale a paralisia industrial e comercial. O próprio MEDEF não pensava no outono que esta reforma fosse indispensável, estando mais focado na reforma do Seguro-desemprego que se traduz, a partir de fevereiro, em uma redução de 25% da duração da indenização.

O tempo imposto por Macron e Borne impõe tanto organizar um movimento maciço de manifestações como criar, rapidamente, uma correlação de força grevista. O processo parlamentar será encerrado até o final de março.

Portanto, o debate sobre o melhor caminho a seguir para chegar a uma ou mais greves reconduzidas, mantendo a massividade e a unidade do movimento, está no centro de muitas discussões e o compromisso das decisões da intersindical na noite do dia 31 reflete estas contradições.

A liderança da CFDT está determinada a manter a frente sindical, mas concebe a ação como uma batalha de opinião para conquistar a maioria da população para recusar a reforma e obter sua retirada com mobilização popular, manifestações maciças… e persuadindo os deputados a não votarem o texto. Consequentemente, ter um ritmo de mobilizações sucessivas, um trabalho de convicção para pressionar os representantes eleitos… sem se lançar em greves reconduzíveis, notadamente em setores que bloqueariam a vida econômica por vários dias ou várias semanas. Entretanto, ter apenas esta estratégia como diretriz levaria ao fracasso experimentado em 2010.

É por isso que um grande número de militantes e grupos combativos enfatizam a necessidade de se organizar, de se preparar para uma greve reconduzível. É isto que orienta o ritmo dado pela federação do setor da Química CGT com vários dias de greves de duração crescente na primeira quinzena de fevereiro, notadamente no setor petrolífero. É uma tática idêntica que encontramos na CGT Energia, na CGT Portos e Docas, na CGT e na Sud Rail na SNCF [ferroviários]. Todos esses sindicatos planejaram pelo menos dois dias de greve entre 6 e 8 de fevereiro.

A decisão da intersindical de ter um dia de greve em 7 de fevereiro e um dia de manifestações no sábado 11 de fevereiro é um compromisso entre estas duas posições. Além disso, apesar da massividade dos últimos dois dias de greve, há uma dificuldade em acelerar o aumento das greves no serviço público, energia e transporte, uma dificuldade que se reflete em uma pequena queda no número de grevistas nestes setores. Da mesma forma, inclusive na SNCF, as assembleias gerais não são tão maciças, não refletindo um impulso dinâmico da greve.

Mas precisamente, muitos militantes combativos pensam que um aumento real do poder nestes setores exigiria não o desgaste da mobilização através de repetidos dias de mobilização, mas a exibição clara de um calendário construindo um confronto interprofissional pelo qual vale a pena fazer vários dias de greve. Todos estes parâmetros são ainda mais difíceis de administrar de forma coerente, pois diferentes táticas também traduzem divisões no movimento sindical, inclusive dentro da CGT na véspera de seu congresso confederal. Estes riscos centrífugos reforçam a necessidade de construir assembleias gerais de grevistas, estruturas de coordenação interprofissionais e intersindicais nas cidades e zonas industriais para criar uma dinâmica local unitária e combativa. Isto está começando a acontecer e às vezes se estende a outras estruturas do movimento social, como a Confédération paysanne [movimento camponês].

Em vários setores, haverá a tentativa de continuar a greve depois de 7 de fevereiro. As manifestações de 11 de fevereiro, em um sábado, em todas as cidades do país, certamente serão massivas e populares, em particular com a participação daqueles que não puderam entrar em greve e/ou se manifestar nos dias 19 e 31 de janeiro. Em todo caso, os dias que virão devem servir para nos convencer de que a vitória é possível e que devemos nos dar todos os meios para alcançá-la.

Os desafios políticos deste movimento são importantes por várias razões. Aqueles que estão manifestando e fazem greve são motivados pelo ataque às aposentadorias, mas também pelos ataques do governo ao seguro-desemprego, à formação profissional e, é claro, à perda de salários que, após os anos Covid, a inflação e os aumentos salariais baixos provocaram. Portanto, é toda a política capitalista de Macron e seu governo que é posta em questão. Isso e mais uma motivação para vencer nas aposentadorias e todos os motivos de raiva aparecem claramente nos cartazes, nas palavras de ordem e nas discussões durante as manifestações.

Por mais importante que seja manter uma frente unida centrada na retirada do projeto Macron-Borne, aqueles que estão no movimento entendem que o resultado deste confronto será uma melhor relação de força no caso de vitória, ou pior no caso de fracasso, frente aos empregadores e ao governo. É ainda mais importante que surja esta questão de classe, esta relação de força a ser estabelecida para uma distribuição diferente da riqueza, pois há uma grande importância em tornar credíveis as exigências anticapitalistas para o financiamento dos bens comuns, previdência social, saúde, habitação e salários. Isto está acontecendo em um momento em que em fevereiro se verá, dia após dia, a publicação dos resultados anuais das principais empresas francesas que prometem, no conjunto, ultrapassar os de 2021.

Portanto, há várias questões em jogo dentro desta mobilização para a esquerda anticapitalista.

Outra batalha está sendo travada neste movimento entre os anticapitalistas e a extrema-direita. O RN [Reagrupamento Nacional da Marine Le Pen] está mais uma vez tentando surfar no descontentamento popular na mídia, com sua ajuda e complacência, como a verdadeira oposição a Macron e proclamar sua oposição à reforma previdenciária. Mas a extrema-direita sabe que é persona non grata nas marchas sindicais (e, além disso, denuncia os sindicatos que pediram o voto Macron contra ela). Na Assembleia, o RN permanece sem voz na batalha de emendas para contrariar o projeto, deixando este espaço para o NUPES. Deve-se dizer que o RN, no fundo, compartilha a “necessidade de os funcionários fazerem esforços para financiar as aposentadorias“.

O RN, após críticas dos economistas liberais ao seu redor, arquivou seu programa de 2017: o retorno à aposentadoria aos 60 anos com 40 anos de contribuições. Com exceção das carreiras que começaram antes dos 20 anos de idade, onde seu programa mantém o retorno aos 60 anos de idade, o RN defende discretamente uma aposentadoria completa entre 62 e 67 anos, com 42 ou 43 anos de contribuições. Basicamente concorda com Macron, mesmo que critique fortemente o projeto de adiamento para 64 anos. Não adianta procurar a menor demanda por justiça social em seu programa, pela distribuição da riqueza atacando os capitalistas, por uma política fiscal e orçamentária que ponha um fim às bondades para as grandes empresas. As soluções propostas pela RN, além de um adiamento da idade de aposentadoria dos funcionários, defendem uma política pró-natalista e o fim dos ‘presentes para os…imigrantes’! Contestar o lugar do RN nesta mobilização não se faz, portanto, apenas nas ruas, mas também denunciando a duplicidade de sua postura.


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Pedro Micussi