Comitê celebra oferta de ajuda brasileira aos apátridas da Nicarágua
Comitê de Solidariedade com o Povo da Nicarágua manifestou-se em carta aberta ao presidente Lula, e cobrou firmeza do país frente à ditadura Ortega-Murillo
Foi com satisfação que o Comitê de Solidariedade com o Povo da Nicarágua – coletivo de apoio ao resgate da democracia naquele país – recebeu a notícia de que o Brasil está disposto a acolher ex-presos políticos expulsos e privados de sua nacionalidade pela ditadura de Daniel Ortega e Rosario Murillo. A intenção foi anunciada pelo embaixador do Brasil na ONU, Tovar da Silva Nunes, na reunião do Conselho de Direitos Humanos da ONU na última sexta-feira (3/03).
Ontem, terça-feira, o comitê divulgou Carta Aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao chanceler Mauro Vieira, no qual saúda a decisão “e a proposta de um diálogo ‘construtivo’ com o governo da Nicarágua e ‘todos os atores relevantes’ que o país estaria pronto a apoiar e estimular.
- Nota da Comissão Internacional do MES sobre as libertações/desterro de 222 presos políticos da ditadura Ortega/Murillo
- Expatriada nicaraguense: ‘Eles querem nos assassinar civilmente e nos condenar a mendicância
Porém, a missiva faz relembrar ao governo brasileiro que o “diálogo” com Ortega só seria possível com o fim da repressão, com a libertação dos 35 presos políticos que permanecem encarcerados no país, com a revogação das 317 cassações das nacionalidades e com justiça e reparação para os 351 assassinatos durante a revolta popular de abril de 2018.
Confira a íntegra da mensagem:
Carta aberta ao governo brasileiro
O Comitê de Solidariedade com o Povo da Nicarágua vem, por este meio, saudar o gesto solidário do governo brasileiro em acolher os nicaraguenses afetados pela medida do Presidente Daniel Ortega, que anula arbitrariamente a nacionalidade de 317 nicaraguenses, entre opositores, ativistas, ex-guerrilheiros da Revolução Popular Sandinista, jornalistas e estudantes.
Acreditamos que o posicionamento apresentado pelo Embaixador do Brasil na ONU, Tovar da Silva Nunes, durante a Sessão do Conselho de Direitos Humanos em Genebra, representa elementos de um governo com vocação democrática e preocupado com a estabilidade regional. O posicionamento da delegação brasileira responde, também, às expectativas de setores democráticos nicaraguenses que há semanas pediam um posicionamento brasileiro perante a crise.
Nós também reconhecemos o chamado do Brasil a um diálogo “de forma construtiva com o governo da Nicarágua e todos os atores relevantes”, pois somos convencidos de que a sociedade nicaraguense merece uma saída institucional, capaz de garantir um futuro democrático, com reparação e justiça.
Mas precisamos lembrar que as condições atuais, muitas delas causadas pelas medidas autoritárias de Ortega, não conduzem a um diálogo amplo. Não pode existir um diálogo com “todos os atores relevantes” enquanto permanecem 35 presos políticos, 317 pessoas apátridas – e as quais Ortega nem reconhece como interlocutores – perseguição aos ativistas, fechamento de mídia alternativa e sem condições para a justiça e reparação pelo assassinato de 351 pessoas, via repressão policial e execução extrajudiciais.
Devemos ainda frisar que o Brasil merece exigir justiça pelo assassinato da médica pernambucana Raynéia Gabrielle Lima, de 31 anos. Seu assassino confesso não apenas foi anistiado através de uma medida controversa, como permanece ativo na folha de pagamento do governo nicaraguense. Este caso impele diretamente ao Brasil para exigir a devida investigação e reativação do julgamento, tomando em consideração a voz da família vitimizada.
Como nicaraguenses residentes no Brasil, e brasileiros solidários com o povo da Nicarágua, somos parte interessada no curso da situação e nos colocamos a disposição para fazer uma interlocução com o seu governo e com a sociedade brasileira em geral, em contribuir com saídas democráticas e pacíficas à crise atual.
Atenciosamente,
Comitê Brasileiro de Solidariedade com o Povo da Nicarágua