No Quênia, um cheirinho de revolução
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No Quênia, um cheirinho de revolução

Grandes mobilizações da juventude no Quênia, contra o governo neoliberal, acontecem no país há semanas

Paul Martial 1 ago 2024, 09:44

Foto: Olivia Dope/Twitter

Via: Au Kenya, un parfum de révolution | L’Anticapitaliste

A mobilização contra a Lei de Finanças 2024, que cria impostos injustos, não dá sinal de enfraquecer e agora está tomando um rumo claramente político, sendo exigida a renúncia do presidente William Ruto.

Nos últimos dois meses, o Quênia está sendo sacudido por fortes turbulências. Com uma dívida de mais de US$ 76 bilhões, o Quênia está sob pressão do FMI, que exigiu profundas reformas econômicas que o presidente Ruto se apressou em implementar. Essas reformas incluem a introdução de vários impostos sobre produtos de necessidade básica. Medidas consideradas pela instituição financeira internacional como tendo consequências sociais de “risco médio”. Um erro crasso!

De #RejectFinanceBill2024

A Lei de Finanças de 2024 incluiu impostos sobre produtos consumidos pelas classes média e pobre. O pão foi tributado a uma alíquota de 16%, assim como as transferências de dinheiro por telefone celular – que afetam principalmente as populações com baixa inclusão bancária -, e os carros a uma alíquota de 2,5%. Outros produtos foram visados, como óleo de cozinha, absorventes higiênicos e transações de câmbio.

Esses impostos punitivos, como chamam os quenianos, foram um duro golpe para uma situação social já precária. Em todo o país, centenas de milhares de jovens saíram às ruas e até ocuparam o Parlamento, forçando os parlamentares a fugirem por um subterrâneo.

O governo de Ruto respondeu com uma repressão feroz, deixando 41 pessoas mortas, dezenas de feridos e centenas de sequestrados pelas forças de segurança. Alguns foram encontrados mortos com sinais de tortura.

Mas a mobilização foi tamanha que o Projeto de Lei de Finanças 2024 foi retirado e o Diretor de Polícia foi forçado a renunciar. Por fim, Ruto demitiu todo o seu governo.

E não parou por aí. A mobilização contra os aumentos de impostos se transformou em uma mobilização contra o governo. Há vários motivos para essa transformação. Ruto foi eleito em uma plataforma populista contra as dinastias dos ricos e alegando satisfazer as pessoas nas ruas, como os “boda boda”, os motoboys, ou os “mama mboga”, vendedores ambulantes de comida. Para aqueles que conhecem o histórico desse político, tudo apontava para a demagogia. De fato, Ruto começou sua carreira política apoiando o ditador Daniel Arap Moi, sendo o responsável pelo “Youth for Kanu ’92” (Kanu é o partido presidencial). Foi nessa ocasião que ele ficou rico. O restante de sua carreira política foi marcado por promessas não cumpridas e retórica demagógica. Embora tenha prometido defender os pobres, suas políticas têm sido exatamente o oposto.

Sua última cartada é formar um governo de unidade nacional com o objetivo de reunir as elites do país para salvar um sistema corrupto.

Os jovens estão bem cientes de que, mesmo que o projeto de Lei de Finanças 2024 seja retirado, outras medidas igualmente antissociais serão impostas. Em outras palavras, não há nada a esperar desse governo ou de qualquer outro político para resolver os problemas do país.

Não se trata apenas de uma lacuna de geração entre esses jovens e a elite governante. Trata-se, acima de tudo, de uma divisão política.

Geração Z na luta

Essa mobilização foi estruturada por meio de redes sociais. Ela não tinha estrutura nem líderes, o que foi um de seus pontos fortes, pois impediu que as autoridades reprimissem os líderes, como costumam fazer. A força desse movimento também foi sua democracia: nos fóruns de discussão virtuais, todos podiam apresentar sua própria visão de como a mobilização deveria ser conduzida.

À medida que a luta continua e a questão do poder é levantada em termos concretos por meio da exigência da renúncia de Ruto, devem surgir propostas alternativas. As organizações de esquerda e as redes de ativistas no Quênia têm um papel importante a desempenhar na articulação com os sindicatos de trabalhadores e na proposta de medidas imediatas para atender às aspirações das pessoas. Esse é um desafio decisivo para as próximas semanas.


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Pedro Micussi