Rio em guerra: operação mais letal da história do estado expõe a política de morte de Castro
A megaoperação Operação Contenção, deflagrada pelo governo do Cláudio Castro (PL) nos complexos da Penha e do Alemão, matou pelo menos 64 pessoas e revela o modelo de segurança pública pautado pela brutalidade e pelo descaso com as favelas
Foto: RS/Fotos Públicas
Na madrugada de 28 de outubro de 2025, aproximadamente 2,5 mil policiais militares e civis foram mobilizados pelo governo do Rio de Janeiro para dar início ao que, horas depois, se tornaria oficialmente a operação mais letal já registrada no estado. Conhecida como Operação Contenção – nas palavras do próprio governo estadual – a ação ocorreu nos complexos do Complexo do Alemão e da Complexo da Penha, contra a facção Comando Vermelho (CV).
Até por volta das 22h de terça-feira, foram confirmadas 64 mortes, sendo quatro policiais entre os óbitos. Organizações de direitos humanos apontam que o número pode ser ainda maior – moradores encontraram cerca de 50 corpos em área de mata que não foram incluídos na contagem oficial. Na manhã desta quarta-feira, estimavam-se mais de 118 vítimas.
Guerra declarada às favelas
O governo estadual, em vídeo divulgado após a megaoperação, justificou a lealidade da operação afirmando “não se trata mais de crime comum, é narcoterrorismo”. Curioso, e se tratando de terrorismo de Estado. A operação paralisou trechos da cidade – vias expressas, escolas, sistema de ônibus – e instaurou pânico entre moradores:
“Há corpos espalhados por toda a rua”, relatou uma liderança comunitária.
Moradores denunciaram violências graves: disparos “de forma indiscriminada” na direção de residências, invasões sem mandado judicial, e abandono de pessoas feridas ou em pânico. O cenário relatado soa como um campo de batalha, e as favelas e seus moradores, mais uma vez, foram tratados como território inimigo.
A política de transferência de culpa
O governador Cláudio Castro ainda buscou responsabilizar o governo federal e a Justiça por eventuais obstáculos à sua operação.
“Infelizmente… não temos o auxílio de blindados nem de agentes das forças federais de segurança e da defesa”, reclamou.
Já o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, afirmou que não recebeu nenhum pedido oficial para tal operação “Nem ontem, nem hoje. Absolutamente nada.”
Observadores e colunistas denunciam que a ação segue uma lógica de espetáculo político e de militarização das favelas – e que a transferência de responsabilidade faz parte de uma estratégia político-eleitoral, para por a matança na conta do governo federal.
Vozes da resistência e denúncia
Jurema Werneck, diretora da Anistia Internacional Brasil, foi categórica: “O nome disso é chacina. Governador de estado nenhum tem mandato para mandar chacinar pessoas.”
Na Assembleia Legislativa do Rio (ALERJ), o deputado estadual Professor Josemar (PSOL) lamentou a operação e a dor dos sobreviventes:
“Famílias passando a madrugada inteira na mata procurando corpos, mais de 50 deles encontrados e nem constam nas estatísticas oficiais do governo. Essa é a operação de sucesso do governador Cláudio Castro. Chacina, terror e pesadelo. A carne mais barata do mercado é a carne negra!”
Impacto nacional e internacional
A repercussão extrapolou os muros do Rio. A Organização das Nações Unidas manifestou-se alarmada com o uso de força em massa e exigiu “investigações urgentes” para que sejam respeitados os direitos humanos.
A imprensa internacional, como o The Guardian e o Associated Press, descreveu o evento como “o dia mais letal da história” para o estado do Rio, comparando-o com casos anteriores e denunciando a militarização das favelas.
Não se trata apenas de uma ação de policiamento ostensivo e de combate ao crime organizado. A Operação Contenção revela um modelo de segurança pública que criminaliza territórios inteiros, naturaliza mortes nas favelas e busca legitimar a vereação da violência como política de Estado. O governo estadual, ao tentar torcer o foco da culpa para a esfera federal, desresponsabiliza-se diante das vítimas e impõe silêncio sobre seu próprio papel.
Castro consolida o Rio como laboratório da política de morte
Sob o comando de Cláudio Castro (PL), o Rio de Janeiro se tornou o maior símbolo da falência da política de segurança baseada na letalidade policial. Das cinco operações mais letais da história do estado, quatro ocorreram sob seu governo. São números que fariam corar até os gestores mais truculentos do passado recente: 64 mortos na Penha e no Alemão (2025), 28 no Jacarezinho (2021), 23 na Vila Cruzeiro (2022) e 16 no Alemão (2022) – todas sob o mesmo método de ocupação militarizada e desrespeito aos direitos humanos.
Mesmo com relações promíscuas entre agentes públicos, milícias e facções, o governador insiste em vender a ideia de que a violência é sinônimo de eficiência. O discurso de “guerra ao crime” serve como cortina de fumaça para o fracasso estrutural de um governo incapaz de investir em inteligência policial, integrar bases de dados, bloquear o fluxo financeiro das facções e desarmar os verdadeiros financiadores do crime – que vivem nos bairros ricos, não nas favelas.
Castro acumula ainda a oitava maior chacina oficial, com 13 mortos em São Gonçalo e Salgueiro (2023), e a nona, com 12 mortos em Itaguaí (2020). Desde que assumiu o governo, em meio ao vácuo deixado pelo impeachment de Wilson Witzel, o governador tem apertado o gatilho com mais frequência do que o antecessor que mandava “mirar na cabecinha”.
A política de morte adotada por Castro oferece a uma parcela do eleitorado a ilusão de segurança, reforçada por um discurso punitivista e racista. Alimenta a cultura do medo e naturaliza o extermínio de jovens negros e pobres, transformando a exceção em regra.
A adesão cega à ideologia do justiçamento, celebrada por perfis extremistas nas redes, não apenas legitima o massacre nas favelas, mas também corrói as bases do Estado democrático de direito. A mesma lógica que autoriza a polícia a matar sem julgamento é a que tentou destruir as instituições democráticas em 8 de janeiro de 2023.
Se insistir nesse caminho, Cláudio Castro poderá encerrar seu mandato com um recorde macabro: as cinco maiores chacinas policiais da história do Rio de Janeiro sob sua assinatura. Uma marca de sangue que expõe a verdadeira herança de seu governo — um estado que troca justiça por vingança e segurança por morte.