Ruralistas articulam para derrubar vetos de Lula e liberar geral o desmatamento
Parlamentares se movem para revogar os vetos presidenciais ao PL do Licenciamento Ambiental – o “PL da Devastação” – e abrir caminho para retrocessos irreversíveis nas políticas ambientais do país
Foto: Adriano Gambarini/WWF Brasil/Divulgação
O Congresso Nacional prepara um dos movimentos mais perigosos dos últimos anos contra a política ambiental brasileira. Sob pressão da bancada ruralista e de setores empresariais interessados em flexibilizar regras de fiscalização, senadores e deputados – inclusive alguns da base governista – articulam a derrubada dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à lei que ficou conhecida como PL da Devastação, marcada para votação nesta quinta-feira (16).
A proposta, que enfraquece de forma drástica os mecanismos de licenciamento ambiental, foi parcialmente barrada por Lula com 63 vetos, preservando dispositivos fundamentais para evitar desastres como rompimentos de barragens e o avanço descontrolado do desmatamento. Agora, contudo, o Congresso ameaça reabrir a porteira da destruição, sob o comando do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que manteve a sessão para análise dos vetos, mesmo após adiar a votação da LDO.
Entre os que já anunciaram voto pela derrubada dos vetos estão Omar Aziz (PSD-AM) e senadores das três maiores bancadas – PL, PSD e MDB -, que representam diretamente os interesses do agronegócio e de empreendimentos de médio e grande porte. A pressão vem especialmente dos setores ligados à mineração, ao agronegócio e à especulação fundiária, que veem no autolicenciamento – ou “licença por autodeclaração” – uma via livre para expandir atividades sem controle público.
A ofensiva preocupa ambientalistas e especialistas. Em entrevista ao jornal O Globo, a coordenadora do Observatório do Clima, Suely Araújo, disse que o cenário é alarmante e representa um retrocesso de décadas na regulação ambiental.
“A bancada ruralista e outros apoiadores do PL da Devastação estão avaliando qual das três frentes é mais vantajosa e onde têm mais chance política de alcançar seus objetivos. Se eu estivesse no lugar deles, também apostaria na derrubada dos vetos, porque essa decisão não passa pelo presidente da República – a decisão final é do Parlamento”, explicou.
Suely alertou que a derrubada dos vetos poderá reintroduzir dispositivos inconstitucionais, como a licença autodeclaratória, a isenção de licenciamento para o setor agropecuário mesmo sem validação do Cadastro Ambiental Rural (CAR) e a redução da participação de órgãos que defendem direitos indígenas, quilombolas e o patrimônio histórico.
“Caso a votação aconteça, será a consagração do retrocesso total. O ideal seria corrigir o problema ainda no Parlamento. Se os vetos forem derrubados, restará apenas recorrer ao Supremo Tribunal Federal”, disse.
Enquanto o governo tenta costurar um adiamento, movimentos sociais e entidades ambientais intensificam a mobilização nas redes, com campanhas que denunciam o “Congresso inimigo do povo e devastador do meio ambiente”.
A deputada Mônica Seixas (PSOL-SP) também se manifestou de forma contundente contra o que chamou de “Congresso da Devastação”:
“O Congresso da Devastação quer derrubar os vetos presidenciais no PL do Licenciamento Ambiental e reabrir a porteira do passa boiada. Chamam de ‘licenciamento’, mas o que estão fazendo é liberar geral para desmatar, poluir e lucrar, e tudo às custas do meio ambiente e dos povos que resistem.”
Para os defensores do meio ambiente, o momento exige pressão popular e ação política firme do governo e de sua base.
“Não basta vetar e ficar em silêncio”, advertiu Suely Araújo. “Os vetos são do presidente da República e precisam de uma defesa clara e pública. A sociedade civil está mobilizada, mas não pode lutar sozinha.”
Com a votação marcada, o Brasil se encontra novamente diante de uma encruzilhada: seguir o caminho da sustentabilidade ou sucumbir ao lobby da destruição.