Hugo Motta acelera um projeto que pode fortalecer o crime organizado
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Hugo Motta acelera um projeto que pode fortalecer o crime organizado

A pressa na votação do PL 5582/2025, prevista para hoje, esconde retrocessos graves – e um relator alinhado a uma política de segurança violenta

Tatiana Py Dutra 18 nov 2025, 10:15

Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou para esta terça-feira (18) a votação do polêmico PL 5582/2025, tachado por ele como “a resposta mais dura da história do Parlamento no enfrentamento do crime organizado”. No entanto, por trás da retórica de endurecimento, espreitam armadilhas profundas que podem, na prática, enfraquecer o combate às facções criminosas – e beneficiar quem deveria ser punido.

O relator da proposta é o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), recentemente exonerado da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo para assumir a função na Câmara. Ex-policial militar, Derrite tem uma trajetória marcada por controvérsias. Reportagens apontam que ele foi investigado por até 16 homicídios durante ações policiais em São Paulo. Além disso, sua gestão à frente da secretaria, sob o governador Tarcísio de Freitas, é criticada por torturas, letalidade e uma retórica punitivista que parece institucionalizar a violência como política pública.

Para além da pessoa, a aliança entre Motta e Derrite revela um projeto político mais amplo: usar o discurso de segurança para consolidar poder, com mínimas garantias institucionais.

As armadilhas escondidas no PL antifacção

Embora o texto endureça penas e prometa novas ferramentas para perseguir facções, especialistas já destacaram pontos que vão na contramão do combate efetivo ao crime organizado:

  1. Enfraquecimento da Receita Federal, PF e Banco Central

Segundo análises, o relatório de Derrite enfraquece instituições-chaves no combate financeiro ao crime.  Em vez de dar poder para rastrear fontes ilícitas, dificulta a apreensão de bens, especialmente quanto às complicadas operações de lavagem de dinheiro.

  1. Proteção de bens até trânsito em julgado

Um ponto especialmente escandaloso: impor que veículos de luxo ou cargas pertencentes a criminosos só possam ser leiloados ou destruídos após decisão judicial final (“trânsito em julgado”). Isso significa que facções podem manter ativos valiosos por anos, mesmo reconhecidos como ilícitos. 

  1. Consulta a governadores para operações da Polícia Federal

O texto de Derrite incluiria a exigência de que a Polícia Federal consulte governadores para realizar operações estaduais. Para alguns analistas, isso poderia paralisar investigações como a Operação Carbono Oculto, que investigou lavagem de dinheiro de facções por meio de fintechs. É uma medida que favoreceria a impunidade, não o controle.

  1. Jabutis para blindagem de capitais

Colunistas como Marcelo Godoy, no Estadão, já alertaram para dispositivos no texto que podem proteger as redes financeiras das facções – sejam em bancos tradicionais, seja em criptomoedas. Há uma clara manobra para impedir controles efetivos sobre o capital criminoso. Outros, como Élio Gaspari, falam em “barafunda” legislativa: uma confusão proposital para maquiar o que de fato está sendo votado. 

Por que a pressa de Hugo Motta é problemática

Motta defende que o tema exige “urgência” e diz que a Câmara precisa dar uma resposta forte ao crime. Mas o problema não é só a demora ou a falta dela – é qual texto está sendo levado a voto. Derrite já apresentou quatro versões diferentes do relatório, todas com trechos criticados por especialistas e atores do sistema de justiça. Isso torna difícil para a população, para a imprensa e para até mesmo parlamentares entenderem o que de fato será aprovado.

Além disso, o fato de nomear um relator tão diretamente ligado a uma política autoritária de segurança – e com histórico grave – evidencia uma operação de poder: não tanto para controlar as facções, mas para consolidar uma narrativa punitivista que, na prática, pode favorecer setores conservadores e blindar estruturas criminosas através de brechas legais.

A política de violência de Derrite e Tarcísio

Durante sua gestão, Derrite foi acusado de manter práticas violentas e de permitir ou até comandar grupos com atuação letal.  Um relatório da Revista Fórum descreve como a pasta da Segurança Pública em São Paulo sob Tarcísio e Derrite teria dificultado o trabalho de fiscalização de homicídios, especialmente os de autoria desconhecida, em regiões vulneráveis. Há ainda denúncias de ações policiais que resultaram em execuções sumárias, e relatos de torturas ignoradas ou relativizadas pela gestão.

Em 2024, a Agência Brasil noticiou a exoneração de Derrite da secretaria para que ele pudesse voltar à Câmara e atuar como relator do PL.  Isso pode ser interpretado como uma manobra política para que sua visão sobre segurança – dura, militarizada, punitiva – seja plasmada em lei, sem os freios institucionais que uma secretaria de Estado poderia impor.

Se aprovado sem revisão, este PL pode consolidar um regime legislativo que protege, em vez de punir, facções poderosas. A “resposta mais dura” de Motta pode acabar sendo uma resposta mais perversa – uma lei feita para dar aparência de combate enquanto abre portas para a impunidade.


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