Com apoio de Lira, PL modifica ação contra deputadas de esquerda
Ações para cassação das parlamentares foram individualizadas para respeitar regimento. Melchionna aponta misoginia na representação de bolsonaristas
Foto: Lula Marques/Agência Brasil
Para tentar diminuir a resistência contra a representação que pedia a cassação coletiva de seis deputadas federais de esquerda, o Partido Liberal (PL) abriu seis representações individuais no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, na última sexta-feira (9). Os alvos dos bolsonaristas são duas parlamentares do Partido dos Trabalhadores (PT) e quatro do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL): Érica Kokay, Juliana Cardoso, Célia Xakriabá, Fernanda Melchionna, Sâmia Bomfim e Talíria Petrone.
As novas ações foram encaminhadas ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), que despachou em tempo recorde e encaminhou os pedidos ao Conselho de Ética em menos de 24h. Os pedidos – que devem entrar em pauta na sessão desta quarta-feira (14) – têm a mesma motivação da inédita e estapafúrdia representação coletiva (vedada pelo regimento da Câmara e, por isso, arquivada) de quebra de decoro parlamentar e injúria. A ideia é individualizar as condutas das deputadas durante a votação da urgência do Projeto de Lei do Marco Temporal, em 24 de maio. Na ocasião, bolsonaristas como Zé Trovão (PL-SC) e outros provocaram um bate-boca e se sentiram ofendidos ao ouvir que a mudança na legislação de demarcação de terras era assassina.
Na segunda-feira (12), em participação da live Espaço Plural, da Rede Estação Democracia, a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) comentou o comportamento seletivo de Lira a serviço dos parlamentares da extrema direita.
“Claro que o presidente poderia, de ofício, arquivar, mas pela celeridade com que isso tramitou, acho que não é o que vai acontecer. Tanto é que as representações que pediam a cassação de deputados golpistas que estimularam, insuflaram, fizeram apologia ao ato golpista do 8 de janeiro estão parados ainda hoje na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, e o nosso tramitou com uma rapidez “the flash”. Mesmo sendo errada a forma com que o PL fez, tramitou. Agora, eles arquivaram para refazer individualmente, mas nós vamos seguir a defesa conjunta”, disse.
E os homens?
Dentre as más intenções políticas dos protofascistas, a deputada identifica nas ações a vontade de criminalizar e perseguir quem ousou enfrentar e resistir à aprovação do PL 490. Mas nesse contexto, há também um recorte de gênero, uma vez que também houve parlamentares homens contrários ao Marco Temporal, mas eles não foram incluídos nas representações.
“Dá para ver bem a misoginia do PL. O que incomoda, claro, é a defesa dos indígenas, mas também a capacidade de enfrentamento, de serem mulheres que encabeçam esse enfrentamento”, analisa Fernanda.
A deputada reforçou que o comportamento misógino dos deputados federais e senadores está cada vez mais corriqueiro na Câmara. Na CPI do MST, por exemplo, as deputadas Sâmia Bomfim e Talíria Petrone tiveram os microfones cortados durante suas falas por, pelo menos, quatro vezes. O cerceamento da liberdade de manifestação das parlamentares fez com que o Ministério Público Federal (MPF) solicitasse à Procuradoria-Geral da República (PGR) investigação sobre violência de gênero.
Em 2021, a bancada feminina entrou com representação junto ao Conselho de Ética contra o deputado Éder Mauro (PSD-PA). Em reunião da Comissão de Constituição e Justiça, o integrante da bancada da bala distribuiu ofensas a parlamentares mulheres, em especial a Fernanda Melchionna e Maria do Rosário (PT-RS). Por fim, admitindo ter matado “muita gente”, desejou a morte das colegas.
“Pode se fazer de vítima, espernear, fazer o cacete nessa porra dessa sessão (…) E vou dizer mais, senhoras deputadas de esquerda: eu, infelizmente, já matei sim, não foi pouco, não, foi muita gente. Tudo bandido. Queria que estivessem aqui para discutir olho no olho. Vão dormir e esqueçam de acordar!”, disparou o bolsonarista.
Não houve nenhuma punição a evidente quebra de decoro de Éder Mauro. Porém, Fernanda acredita que mesmo com a fragilidade da acusação do PL, sem mobilização, é bastante possível que as deputadas tenham o mandato cassado.
“A forma como tramitou acelerado mostra a disposição de nos respnsabilizar. Fora que eles tem uma lógica de defea do marco temporal mentirosa, demagogica. E nos silenciar é uma forma de apagar as críticas ao projeto que foi para o Senado (…). Se a gente deixar passar batido, infelizmente, tem grandes chances [de ser aprovado], até porque há uma lógica. O mesmo Conselho de Ética que absolveu o Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por defender o AI-5 no Brasil e que tem uma composição que reflete a composi da própria Câmara, é melhor ter cuidado”, diz.
Participe do abaixo assinado e diga não ao retrocesso misógino proposto pelo bolsonarismo clicando aqui.